Condenação de Kátia Rabello, dona do banco Rural, levará a mudanças no
mercado e mais rigor com clientes
Instituições terão de vasculhar origem e destino dos recursos para evitar
culpa em casos de crimes
Julio Wiziack
SÃO PAULO - A pena aplicada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a Kátia
Rabello, dona do banco Rural, já está levando a uma reviravolta no setor
financeiro e entre as empresas que usam o mercado de capitais para tomar
empréstimos.
A Folha consultou advogados, empresas e banqueiros, que só aceitaram falar
sob condição de anonimato.
Na sexta passada, um grupo de bancos se reuniu para discutir o que fazer com
o novo tratamento proposto pelo STF para crimes financeiros.
Kátia Rabello foi condenada a 16 anos e 8 meses de prisão. O Rural ajudou a
financiar o mensalão, concedendo empréstimos e permitindo que o dinheiro do
esquema fosse distribuído em suas agências sem que os verdadeiros destinatários
dos recursos fossem identificados.
O advogado José Carlos Dias, que defende Kátia Rabello, acha a pena
exagerada. "Não foi ela quem concedeu os empréstimos", disse em nota.
"Foi responsável apenas pela renovação de um deles, sem que houvesse
desembolso de dinheiro novo."
Dias recorrerá da decisão tão logo seja possível.
A dosagem da pena foi o que deixou apreensivos o empresariado e boa parte
dos banqueiros. Para eles, está claro que o STF vai instituir a teoria usada na
decisão como "regra" a partir de agora.
"Não sabia"
Conhecida como "teoria da cegueira deliberada", ela abre
precedente para que sejam considerados crimes dolosos não somente aqueles
praticados intencionalmente como os cometidos por displicência e eventualmente.
De acordo com essa interpretação, quem transporta uma mala sem conhecer seu
conteúdo corre o risco de condenação caso esteja transportando drogas, por
exemplo, e seja descoberto. A regra também valeria para quem mata no trânsito
ao dirigir embriagado.
A teoria, aplicada nos EUA e na Espanha, permitiu enquadrar Kátia Rabello
nos crimes de gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro.
Por ela, o dirigente de um banco não pode liberar recursos que serão usados
em crimes e dizer que "não sabia" (a cegueira deliberada) ou que
"não era seu papel" conceder o empréstimo.
Para o mercado, isso levará a estruturas jurídicas maiores e mais rigorosas
porque, de antemão, será preciso vasculhar a vida do cliente e do destinatário.
E isso, segundo eles, elevará os custos das operações, que ficarão mais
demoradas.
Fonte: Folha de S. Paulo
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