Projeto malfeito obriga funcionários de escola a carregar tabela de basquete
André de Souza Durante a campanha presidencial de 2010, a então candidata Dilma Rousseff prometeu entregar 10 mil quadras esportivas cobertas, se fosse eleita. Passados dois dos quatro anos de mandato da presidente, o número de quadras sendo construídas ainda está muito abaixo da meta. E, nas que estão em obras, há problemas. Segundo dados do próprio Ministério da Educação (MEC), até agora, saíram do papel menos de 8% das quadras prometidas.
Em 2011, foram aprovadas 1.564 quadras, das quais 96 estão concluídas e 693 em obras. Em relação às unidades aprovadas em 2012, o MEC informou que as obras só devem começar no primeiro semestre deste ano - embora os primeiros pagamentos tenham sido feitos no segundo semestre do ano passado.
Além da promessa eleitoral, as obras nas escolas também entraram no lançamento do PAC 2, em março de 2010. Na época, a previsão era investir R$ 4,1 bilhões para "universalizar quadras esportivas em escolas com mais de 500 alunos". Pelo PAC, foram previstas 6.116 novas quadras, além de obras de cobertura em outras 4.000 já existentes, totalizando 10.116 unidades.
Mas nem o PAC 2 garantiu os investimentos. Levantamento feito pela liderança do DEM no Senado mostra que, entre 2011 e 2012, dos R$ 3,939 bilhões previstos para estruturas esportivas (o que inclui as quadras em escolas), foram pagos R$ 412,35 milhões, no primeiro ano; e R$ 224,29 milhões, no ano seguinte. Ou seja, foram gastos 16,16% do orçamento, somando os dois anos.
O número baixo de quadras em construção não é o único problema. O GLOBO visitou algumas delas na cidade de Águas Lindas de Goiás, no Entorno de Brasília, e constatou problemas que vão de projetos malfeitos a atrasos nas obras.
Quatro homens para erguer tabela
Águas Lindas, que, segundo estimativas do IBGE, tinha 167.477 habitantes em 2012, conta com 43 escolas na rede municipal, onde estudam 22 mil alunos. As escolas têm entre 200 e 1.300 alunos. Enquanto o governo federal faz os repasses de verba, o município tem a obrigação de fornecer a área e fazer a terraplanagem do terreno.
Na cidade, a prefeitura recebeu recursos para construir dez quadras poliesportivas, das quais oito estão quase prontas. Uma delas, na Escola Municipal Jardim Pérola, que tem 730 alunos do 1º ao 5º ano, chegou a ser inaugurada em setembro do ano passado, mas ainda passa por retoques. Na prática, serve apenas para partidas de futsal.
A quadra foi projetada de tal forma que as tabelas de basquete, quando postas no lugar, impedem a atuação do goleiro. Ou seja, quem quiser jogar basquete, tem que instalar as pesadas tabelas. Se quiser jogar futebol, é preciso retirá-las. O GLOBO presenciou quatro adultos enfrentando dificuldades para pôr a tabela no lugar.
- A tabela nunca vai ser usada porque os meninos preferem jogar futebol a basquete - disse um dos homens.
A diretora da escola, Maristela Regina Neves, teme que as crianças se machuquem se tentarem carregar as tabelas. Ela também reclama de outro problema: o uso de drogas na escola e a falta de vigilância. A quadra não é usada só pelas crianças, mas pela comunidade.
- De noite, (algumas pessoas) jogam e fumam. Não há como impedir. Fazem buraco no muro, derrubam o portão. Se for reclamar, recebe ameaça de morte. Tem que ter policiamento - reclama ela.
Na mesma quadra, os buracos para a rede de vôlei existem, mas não há sequer as hastes de metal que a sustentam. O chão é sujo e as linhas que demarcam a área de jogo estão quase apagadas. A placa do lado de fora indica que a quadra foi feita após repasse de R$ 437,8 mil do governo federal. A previsão era terminá-la em junho de 2012, mas, até hoje, ela sofre reparos.
Instado a explicar a diferença entre promessa e realidade, o MEC enviou nota em que prefere enfatizar o número de obras aprovadas nos últimos dois anos. Foram 4.681, referentes à construção de 3.012 quadras cobertas e à cobertura de 1.669 quadras já existentes. "A meta do governo é apoiar a construção ou cobertura de 10.116 unidades escolares - logo, o cronograma segue dentro do planejado", diz o texto do ministério.
O MEC também destacou que a execução das obras não começa no momento em que são aprovadas. "Após o recebimento da primeira parcela dos recursos federais, os entes federados devem realizar um processo licitatório, que, no Brasil, leva no mínimo 6 meses. Após a licitação, ocorre um período de contratação, e só depois de todos esses processos a empresa contratada faz a instalação do canteiro para dar início às obras propriamente ditas", diz trecho da nota.
O MEC também ressaltou que não há atraso no repasse dos recursos, e que a responsabilidade pela execução das obras é de estados e municípios.
Em dezembro, o GLOBO mostrou que, de 46 promessas assumidas pela então candidata Dilma, em 2010, pelo menos metade ainda estava longe de sair do papel. Na época, o MEC destacou o elevado número de quadras aprovadas, mas não detalhou quantas tinham sido concluídas ou estavam em construção.
Fonte: O Globo
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