domingo, 27 de janeiro de 2013

Após "pibinho", governo aposta em investimentos

Ao encerrar a primeira metade do mandato com um pibinho (expressão já usada pelo ministro Guido Mantega para definir o crescimento da União Europeia), inflação acima do centro da meta, obras estagnadas e reformas na gaveta, Dilma Rousseff terá o desafio de abrir o leque de prioridades neste terceiro ano. Com um desempenho econômico inferior a países como Chile, Colômbia e Peru, onde a inflação não chega a metade da brasileira, o país ficou bem distante das metas estabelecidas na época da posse.

O saldo dos 24 meses iniciais de gestão reforça a convicção de que não é mais possível crescer apenas em cima do consumo das famílias. A política econômica baseada no aumento do poder de compra não consegue mais sustentar sozinha o desenvolvimento. Até mesmo entre especialistas de correntes diferentes, é consenso de que somente com um ambiente favorável para a retomada de investimentos privados e públicos será possível aumentar as taxas de crescimento e voltar a ostentar estatísticas dignas das maiores economias mundiais.

Emprego e renda

Mesmo com o baixo crescimento da economia, o go¬verno conseguiu reduzir ainda mais o desemprego. Em dezembro, o percentual de trabalhadores sem emprego formal nas seis principais regiões metropolitanas do pa¬ís era de apenas 4,4%. A renda dos brasileiros também manteve a expansão na gestão Dilma.

- Vivemos um momento positivo. O setor de comércio e serviços continua criando muitos empregos, puxado pelo maior poder de compra da população - afirma Ma¬nuel Enriquez Garcia, professor da Universidade de São Paulo (USP).

No entanto, em 2012, o ritmo de criação de vagas foi 33% inferior ao do ano anterior, conforme dados divulgados na sexta-feira pelo Ministério do Trabalho. O desempenho, reflexo do baixo crescimento da economia, é o pior desde 2009.

Crescimento e investimentos

Com 2,7% de crescimento em 2011 e cerca de 1% em 2012, Dilma teve o pior desempenho nos dois primeiros anos de um governo desde Fernando Collor.

O resultado abaixo do esperado é atri¬buído à insistência em manter a política baseada no incentivo ao consumo, sem criar ambiente favorável para aumento dos investimentos - público e privado.

- O governo vem insistindo em medidas de expansão do consumo e do crédito, desonerações tributárias e ; aumento do salário mínimo. Nosso problema não é de demanda, mas de oferta, por isso é preciso fazer com que o país torne-se mais eficiente e a indústria retome a competitividade - aponta Maílson da Nobrega, ex- ministro da Fazenda e sócio da Tendências Consultoria.

Contas públicas

No final de 2012, o governo Dilma recorreu a uma série de manobras contábeis para permitir o cumprimento da meta fiscal, ou seja, mostrar um superávit primário que não foi alcançado. A "maquiagem fiscal" foi alvo de críticas até no Exterior, com citações irônicas na revista The Economist e no jornal Financial Times. A mudança na meta do superávit primário, conforme o economista do Instituto Millenium Vítor Wilher, teve impacto negativo:

- A política econômica tem de ser previsível, para não gerar desconfiança entre os investidores.

Na sua "contabilidade criativa", o governo omitiu despesas em infraestrutura, antecipou dividendos de estatais e mexeu no fundo soberano.

Infraestrutura e logística

Dilma anunciou a concessão de rodo¬vias, ferrovias, portos e aeroportos à iniciativa privada para modernizar a deteriorada infraestrutura do país - considerada uma das responsáveis pelo baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Essa é a aposta para fazer o Brasil voltar a crescer e aumentar a taxa de investimentos, que teve queda em cinco trimestres consecutivos.

- Nos países onde a logística funciona, esse foi o sistema adotado. A questão é que ainda há um embate ideológico dentro do governo sobre "privatizar"", modelo sempre criticado pelos partidos socialistas - avalia Carlos Honorato, professor da Fundação Instituto de Administração (FIA).

Inflação

A inflação está acima do centro da meta, mas ainda dentro dos limites. A alta foi influenciada por dois protagonistas: pressão dos alimentos e dos serviços. Mesmo com a inflação de 6,5% em 2011 e 5,84% em 2012, o Banco Central baixou as taxas de juros aos menores níveis da história no ano passado. O aumento da renda do trabalhador fez com que a variação de preço dos serviços se aproximasse de dois dígitos - dificultando o controle inflacionário.
- O Brasil tem o dobro da inflação de países da América do Sul, como Chile, Colômbia e Peru, e menos da metade do percentual de crescimento - compara o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nobrega.

Energia

Apesar de o risco de racionamento ter voltado a assombrar em 2012, quando os níveis dos reservató¬rios das principais hidrelétricas baixaram pela escassez de chuva, a situação nem de longe é comparável ao período do apagão, em 2001. 0 temor é afastado no médio prazo pela geração das usinas térmicas e pelo reforço das linhas de transmissão do sistema interligado.

- Houve esforço para aumentar a confiança do sistema, mas ainda dependemos de uma matriz energética. Não podemos ficar nas mãos de São Pedro - avalia Carlos Honorato, da Fundação Instituto de Administração (FIA),

Com grandes obras de hidrelétricas, como Belo Monte, o governo investiu também em fontes renováveis.

Reforma tributária

Aguardada há anos, a reforma tribu¬tária começou a ser ensaiada pelo governo, mas as medidas ainda são consideradas tímidas.

- Houve alguns ensaios, mas a peça teatral não começou ainda - destaca João Eloi Olenike, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT).

Em 2012, o valor total pago pelos brasileiros em impos¬tos chegou a R$ 1,55 trilhão - quase 35% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. Fala-se em "reforma fatia¬da", mas as medidas estruturais não saíram do papel.

- É preciso diminuir a tributação sobre o consumo, que impacta mais justamente naqueles que ganham menos - aponta Olenike.

Fonte: Zero Hora (RS)

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