domingo, 21 de abril de 2013

Tutores de Maduro - Míriam Leitão

A pequena diferença de votos, os mortos nos protestos, as reações autoritárias deixarão cicatrizes no governo de Nicolás Maduro, na Venezuela. A recontagem dos votos é um alívio, mas não deve mudar o resultado. A trinca no chavismo foi vista na declaração do presidente da Assembleia, Diosdado Cabello, de que é preciso fazer autocrítica diante da vitória por margem mínima.

O maior risco que o governo de Maduro corre, caso não consolide sua liderança política na Venezuela, vem dos militares, e não da oposição. Os militares governam mais de 20 estados. Numa forma de se garantir, Chávez colocou companheiros de farda como candidatos aos governos estaduais. Estão nas mãos de civis os poucos estados governados pela oposição.

Outra fatia do poder está nas mãos dos cubanos, que têm predominância sobre os setores de segurança e inteligência e controlam toda a área de saúde.

- A situação na Venezuela tem todas essas complexidades. Chávez entregou às Forças Armadas, especialmente ao Exército, grandes fatias do poder. Por outro lado, os militares venezuelanos não veem com bons olhos o controle de oficiais cubanos na área de segurança e inteligência. Além disso, quase 50 mil médicos dominam a área da saúde. Maduro também terá que consolidar o próprio chavismo, que tem várias facções - disse o embaixador Rubens Ricupero.

Maduro nunca será Chávez, por mais que tente encarnar o fantasma do líder, mas a oposição também não é mais aquela. Os métodos administrativos de Hugo Chávez eram discutíveis, mas ele alimentou demandas de participação dos mais pobres na vida do país, da qual eles não vão mais abrir mão. Por isso, a oposição liderada por Henrique Capriles não pode ser o rosto jovem da velha oligarquia bipartidária - Copei e AD - que governou a Venezuela antes de Chávez.

Também não pode ser a mesma oposição que tentou o golpe em 2002. Neste ponto, o curioso é que o governo acusa a oposição de golpista - e houve de fato o triste episódio de 2002 - mas a tentativa de golpe militar que Hugo Chávez liderou, em 1992, é tratado como um ato heroico e uma data cívica nacional. Não se fala que ele foi anistiado depois.

A novidade da eleição permanece intrigando os analistas. Maduro despencou 10 pontos em poucas semanas, desde as primeiras pesquisas de intenção de votos. O chavismo perdeu apoio. A aceitação da recontagem pelo Conselho Nacional Eleitoral dará mais legitimidade ao eleito. Por um tempo, o CNE não disfarçou sua parcialidade. A composição do órgão que comanda as eleições foi alterada nos últimos anos para ser favorável ao chavismo.

As reações autoritárias de maduro de impedir manifestações, censurar as televisões e ameaçar não repassar recursos da federação para Miranda, o estado governador por Henrique Capriles, só aprofundam a divisão da sociedade venezuelana.

Hugo Chávez governou pela divisão da sociedade. Ele extraia poder e seguidores demonizando uma parte dela. Esse é seu pior legado. O conflito do país não é fácil de sanar, principalmente por um líder sem carisma como Nicolás Maduro.

A crise econômica com inflação, desabastecimento, déficit público, dívida alta e baixo crescimento pode tornar mais difícil ainda a governabilidade do país. O excesso de militarização da política e da administração é outro complicador. A presença excessiva dos cubanos, outro. Não há bom tempo à frente.

O melhor seria se Maduro tentasse trabalhar pela conciliação da sociedade venezuelana, o que significa fazer o oposto da radicalização que está propondo neste primeiro momento.

Se a oposição quiser se preparar para governar a Venezuela - seja no meio do mandato, no caso de referendo revocatório -, ou se ganhar a próxima eleição daqui a seis anos, tem que começar a trabalhar para vencer os focos de resistência. O referendo é previsto na Constituição para o meio do mandato.

Mas, nos próximos meses e anos, o grande fiador de qualquer solução serão as Forças Armadas.

- Na hipótese de o governo Maduro não controlar as reações contrárias, ou não reverter a crise econômica, as Forças Armadas é que entrarão em ação. Ao contrário de outros países, em que os militares governaram e saíram desmoralizados, na Venezuela, o último governo militar acabou em 1957 - lembrou Ricupero.

Fonte: O Globo

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