O placar com que foi aprovada em primeiro turno a emenda do orçamento impositivo - 378 votos a favor, 48 contra e 13 abstenções – não deixa dúvidas sobre a determinação dos deputados para impor a mudança. Ela pode atenuar o toma-lá-dá-cá, como tantos disseram, mas outras moedas continuarão sendo usadas nas barganhas entre Executivo e Legislativo, num sistema político que dificulta a formação de maiorias a partir das urnas. Mas a motivação fundamental foi outra, de ordem eleitoral: garantir uma certa equidade, entre os deputados, na distribuição de favores com verbas federais, num pleito em que não será fácil a reeleição de representantes contestados pelas ruas. Com a liberação impositiva, governistas e oposicionistas serão igualmente beneficiados. E entre os governistas, os petistas não levarão a melhor sobre seus aliados.
Falta ainda o segundo turno na Câmara e a votação no Senado mas a mudança é irreversível. O máximo que o governo pode conseguir, no Senado, será a destinação de 50% do valor global das emendas individuais (mais de R$ 6 bilhões) a projetos na área da Saúde. Efetivamente, o Congresso tomou da presidente Dilma Rousseff o controle sobre 1% das receitas liquidas correntes da União. Mesmo beneficiando a população, esta fração do orçamento está destinada a beneficiar o velho modo de fazer política, o de domesticar clientelas eleitorais com a distribuição de favores.
Quando a emenda chegar ao Senado, o governo tentará garantir a destinação dos 50% à Saúde, o serviço público mais criticado pela população. Mas, num segundo momento, acabará recorrendo ao Supremo. "Não tenho dúvidas de que esta medida será considerada inconstitucional mas aqui, no Senado, vamos tentar apenas racionalizar o assunto, garantindo a metade para a saúde", diz o líder do PT no Senado, Wellington Dias. Na terça-feira, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, falará às bancadas do PT, PSB, PC do B, PDT e PSol sobre o programa Mais Médicos e outras ações de sua pasta, tentando demonstrar o quanto poderia ser feito com 50% das emendas. Destes partidos de esquerda, terá apoio. Mas os outros, aceitarão abdicar da ponte, da quadra de esportes e outras obras mais visíveis, ainda que menos relevantes? A ver.
Fato é que, mesmo tendo um aspecto positivo, ao acabar com o uso das emendas como arma de premiar ou punir, pelo Executivo, a mudança mitiga o poder presidencialista. A nova regra para apreciação dos vetos - que passam a travar a pauta de votações 30 dias depois de publicados - também reduzirá o conforto do presidente, exigindo negociações mais cuidadosas com o Congresso, antes mesmo do envio de projetos. Pois aqueles que, de antemão, enfrentam grandes resistências, acabarão sendo mudados, levando ao veto e à conseqüente derrubada. No caso de Dilma, o desconforto aumenta porque a base, embora venha se recompondo aos poucos, dificilmente voltará a ter o tamanho que já teve.
Mensalão: faltava dizer
A partir do 2005, e passando pelo julgamento do ano passado, seria chamado de "defensor de mensaleiros" todo aquele que ousasse apontar a relação entre o chamado mensalão e o sistema político nefasto que temos. Tudo não passara, afinal, de malfeitoria do PT. Finalmente ontem, em sua estreia no caso, o ministro Roberto Barroso, disse o que a corte também evitou dizer. Possivelmente não tenha sido aquele o maior escândalo, mas com certeza foi o mais investigado da história. Não se trata de um caso único e isolado, mas inserido na tradição que vem de longe. "Se não houver reforma política, tudo vai acontecer de novo. A distinção se dará apenas entre os que foram pegos e os que não foram." O PT, neófito no poder, se deixou pegar. A "catarse" com o julgamento, disse ele ainda, foi sinal da fadiga nacional com o sistema, que este ano estourou nas ruas. Catarse que o tribunal estimulou, ele não disse, com o julgamento-espetáculo.
Um dos grandes arrependimentos do PT é o de não ter se empenhado pela reforma política em seus 10 anos no poder. "Foi um erro, aceitamos as regras do jogo que condenávamos, mas agora vamos enfrentar a reforma", diz o líder Wellington Dias. PT e aliados voltarão a insistir no plebiscito. Mas, para 2014, agora é tarde.
O outro mundo
Em evento sobre mídias digitais, promovido ontem pela Oficina da Palavra, o pesquisador Fabio Malini, do Labic/UFES, impressionou a plateia de jornalistas, gestores e assessores políticos com suas demonstrações sobre a dinâmica das redes sociais, a força e a rapidez com que se formam alinhamentos em torno de uma mensagem ou idéia. Se os partidos não entrarem para valer neste mundo, vão perder o bonde e os votos.
O ocaso das CPIs
Já não se fazem CPIs como antigamente, quando era certo que alguém morreria no final. A primeira em que houve um acordo de mútua-proteção foi a do Banestado. A dos Correios massacrou o PT mas na do Cachoeira tucanos e peemedebistas fizeram o acordo que salvou os governadores Cabral e Perillo. Agora vem a CPI mista do Cartel da Siemens. Se for para terminar em acordo, poderiam nos poupar.
Fonte: Correio Braziliense
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