Votação sobre embargos empata em 5 a 5, e decisão será do decano Celso de Mello
Após sessão, ministro lembrou que, em agosto de 2012, já defendeu a validade dos recursos capazes de reabrir o julgamento e rever condenações, mas não deixou claro se na quarta-feira manterá o mesmo entendimento
Caberá ao mais antigo ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, decidir se os mensaleiros terão direito aos embargos infringentes, recursos capazes de reabrir o processo. Ontem, terminou empatada em 5 a 5 a votação no STF. Depois da sessão, Celso de Mello lembrou que já se pronunciara sobre o tema em 2 de agosto de 2012, quando defendeu a validade desse tipo de recurso. Disse que já tem convicção formada e está com o voto pronto, mas não deixou claro se manterá o mesmo entendimento do ano passado. Os ministros Joaquim Barbosa, Marco Aurélio, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes votaram contra a aceitação do recurso que reabriria o caso. Já Roberto Barroso, Rosa Weber, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Teori Zavascki aceitaram os argumentos da defesa dos réus. O Planalto torce por uma solução rápida, para evitar o desgaste em ano eleitoral.
O fiel da balança
Carolina Brígido, André de Souza e Carouna Benevides
BRASÍLIA e RIO - Mais de um ano após o início do julgamento do escândalo do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), com exatas 63 sessões realizadas em plenário desde agosto de 2012, o desfecho da Ação Penal 470 está, agora, na mãos de um único ministro, o decano Celso de Mello. Nomeado há 24 anos para o tribunal, pelo então presidente José Sarney, Celso de Mello, de 67 anos, terá a incumbência de decidir, na próxima quarta-feira, se a Corte aceita ou não os embargos infringentes — recursos que darão a 12 réus o direito a um novo julgamento e a chance de reduzir suas penas." Ontem, terminou empatada em 5 a 5 a votação em plenário sobre a aceitação dos embargos infringentes. O voto de desempate será de Celso de Mello. Ao final da sessão, o ministro lembrou que já se pronunciou sobre o tema em 2 de agosto do ano passado, quando defendeu a validade desse tipo de recurso. Mas não deixou claro se manterá exatamente a mesma posição.
— Eu não posso antecipar voto algum. Este não é o momento. Mas eu estou em condições (de votar). Já preparei meu voto. Ouvi todos os lados. Li os memoriais redigidos pelos advogados, que, como sempre, desenvolveram um excelente trabalho profissional. Li o memorial da senhora procuradora-geral da República e todos os votos bem fundamentos que foram pronunciados já na sessão anterior e na sessão de hoje (ontem). Atento a isso, e ao que escrevi em 2 de agosto, estou considerando todos esses aspectos. Na verdade, já formei minha convicção. Tenho a convicção formada e vou expô-la de modo muito claro, muito aberto na quarta-feira — afirmou o ministro.
Perguntado se seu pensamento mudou em relação ao ano passado, ele respondeu:
Será? Acho que não evoluí. Será que evoluí?
Em agosto de 2012, a favor dos infringentes
Em agosto do ano passado, Celso de Mello não deixou dúvidas de que considera haver direito a embargos infringentes no STF. Na época, a frase dele sobre o tema foi esta:
— O STF, em normas que não foram derrogadas e que ainda vigem, reconhece a possibilidade de impugnação de decisões de mandados do plenário dessa Corte em sede penal, não apenas os embargos de declaração, como aqui se falou, mas também os embargos infringentes do julgado, que se qualificam como recurso ordinário dentro do STF, na medida que permitem a rediscussão de matéria de fato e a reavaliação da própria prova penal.
No acórdão do julgamento do mensalão, publicado em abril deste ano, há trechos do voto do ministro que vão no mesmo sentido.
Apesar de já ter se pronunciado sobre o assunto, ontem Celso de Mello reconheceu que o tema agora tem suas peculiaridades.
— Esse é um tema efetivamente novo na agenda do Supremo Tribunal Federal, como os próprios juizes aqui revelaram, e agora o eminente ministro Marco Aurélio, destacando que nós não apreciamos especificamente essa questão. Houve manifestações, minhas inclusive, em outros momentos. Mas, de qualquer maneira, essa é a questão com que se depara hoje o Supremo Tribunal Federal — disse Celso.
A polêmica existe porque os embargos infringentes foram previstos no artigo 33 do Regimento Interno do STF, mas não na Lei 8.038 de 1990, que regula as ações no Supremo. Ontem, Celso de Mello lembrou de um segundo caso em que tratou dos embargos infringentes. Na ocasião, ele recusou a aceitação desses recursos porque o réu não tinha obtido quatro votos de ministros favoráveis a ele. Não é esse o caso do mensalão, em que 12 réus têm quatro votos a seu favor em um dos crimes pelos quais foram condenados.
Celso de Mello está no STF desde 1989 e presidiu o tribunal em 1997. Em novembro de 2015, completará 70 anos e terá que se aposentar. Portanto, tem pouco mais de dois anos ainda na Corte. Ontem, ao ser perguntado sobre a pressão de ter que decidir se os embargos serão ou não aceitos, o ministro disse:
É uma pressão inerente ao cargo e às funções. E é preciso decidir com absoluta independência do que pensa a opinião pública. Esta é uma Corte de Justiça, e dessa convicção o STF vai fazer atuar o ordenamento constitucional que rege a matéria tão sensível e delicado como o é um processo penal de índole condenatória.
Em outubro do ano passado, quando o julgamento do mensalão já tinha quase dois meses, Celso de Mello proferiu um voto histórico. À época, ele disse:
O Estado brasileiro não tolera o poder que corrompe nem admite o poder que se deixa corromper.
E foi além:
Quem tem o poder e a força do Estado em suas mãos não tem o direto de exercer em seu próprio proveito.
Natural da pequena Tatuí, no interior de São Paulo, Celso de Mello se mudou para a capital aos 18 anos porque desejava cursar Direito na USP. Em 1969, estava formado. No ano seguinte, foi aprovado no concurso para o Ministério Público paulista em primeiro lugar. O trabalho feito por lá chamou atenção e, durante o governo Sarney, foi convidado para atuar na Consultoria Geral da República. Em seguida, acabou sendo lembrado para uma vaga de assistente no STE
Já como ministro do Supremo, Celso de Mello participou de seu primeiro julgamento histórico em 1994, quando a Corte absolveu o ex-presidente Fernando Collor da acusação de corrupção passiva. À época, ele afirmou que não havia prova suficiente e que condenar o ex-presidente sem observar os julgamentos legais seria volta à ditadura.
Companheiro de pensão de Dirceu
Em 2007, estava na sessão que abriu a Ação Penal 470, contra os acusados do mensalão. Meses depois, contou que José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil e um dos investigados, havia morado na mesma pensão que ele.Eu estudava na faculdade de Direito e morava numa pensão com o Zé Dirceu. Éramos visitados com frequência pelo Dops — lembrou em 2008.Ele e Dirceu, hoje acusado de ser chefe da quadrilha do mensalão, conheceram-se, em 1964, no cursinho pré-vestibular Toloza.
Naquele mesmo dia, nos encontramos na pensão e conversamos — recordou Mello.
Nos cinco anos em que morou na pensão, Celso de Mello e Dirceu viveram em alas diferentes. Em 1969, enquanto Mello se formava, Dirceu embarcava para o exílio no México, em troca da libertação do embaixador norte-americano ; Charles Elbrick.
Mesmo sem ter participado de movimentos contra a ditadura militar, o ministro diz ter aprendido com ela o real valor da democracia. ""Enfrentamos uma época realmente dura, em que pessoas eram arbitrariamente privadas de seus direitos", relatou a Zuenir Ventura no livro "O que fizemos de nós", que complementa a obra "1968: o ano que não terminou".Caseiro, Celso de Mello trabalha pelo menos 14 horas por dia e vira noites elaborando seus votos, famosos como detalhados e longos
Fonte: O Globo
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