Há um erro básico em considerar o cidadão independente como um indeciso, alguém débil, pronto a ser fisgado. Nada mais falso. Sem as máscaras de um partido ou candidato para curtir nas redes sociais, ele evita as manadas e se transforma no maior desafio do marqueteiro
A edição deste mês da revista norte-americana Esquire apresenta uma ampla pesquisa sobre a importância dos eleitores independentes nos Estados Unidos. Nem republicanos nem democratas, eles funcionam tal qual um pêndulo entre dois pólos, ora em direção à esquerda ora à direita. A atenção com esse público pode ser explicada por vários motivos. O mais forte: homens e mulheres de “centro” representam a maioria da população votante dos EUA, capaz de definir plebiscitos sobre assuntos específicos, como financiamento de determinado programa, ou uma disputa presidencial.
Com o distanciamento do discurso político de Washington, tais eleitores buscam meios próprios para entender e digerir temas como o casamento gay, gastos públicos e — o assunto da vez por lá — o financiamento público da saúde. Além da barreira do discurso oficial, os cidadãos do “centro” não se consideram como do “centro”, o que dificulta por si só o próprio enquadramento para os marqueteiros. Depois, eles formam uma massa disforme demais para facilitar qualquer tipo de discurso de um candidato. Ganhar corações e mentes nessa trincheira não é uma tarefa das mais fáceis.
Antes de um paralelo com o Brasil, vale destacar outros dados da pesquisa. A maioria dos eleitores “independentes” nos Estados Unidos não concorda como “as coisas estão caminhando”, apesar da maior parte desses terem optado por Barack Obama nas últimas eleições e se dizerem mais próximos dos democratas. É importante saber que temas como armas e Deus são pouco atraentes para esse pessoal, mas eles parecem dispostos e sensíveis positivamente a assuntos como legalização da maconha e aborto nos primeiros três meses de gravidez. O “centro” apoia impostos para ricos e poluidores.
Cor brasileira
No Brasil, tal cidadão é mal visto, como se fosse um débil por não tomar partido. E é tratado como um eleitor indeciso por marqueteiros e políticos. Tudo fica ainda mais confuso quando grupos políticos ligados à oposição e ao governo invadem as redes sociais tentando enfiar goela abaixo a legenda A, B ou C. Há uma guerra partidária que pouco ou nada interessa a esse cidadão. O mundo real ainda está distante das eleições, então não adianta bordoadas entre candidatos. Nessa disputa, apenas as torcidas partidárias reagem. Os independentes permanecem independentes, por mais que escolham um candidato no momento adequado ou até mesmo decidam votar nulo ou branco.
Para os marqueteiros, a dificuldade é se atrapalhar na hora de identificar esse eleitor, tratando-o como indeciso. Nada mais falso. Ele não está na maré, pronto a ser fisgado. Tem posições firmes sobre vários temas e até pode defender um candidato em determinado dia e criticá-lo no outro. E só a partir de uma sequência de variáveis escolhe, ao longo da campanha, um político. Sem as amarras das legendas, o “independente” é um eleitor mais difícil de convencer, por trabalhar com mais informações e não simplesmente concordar com a manada, curtindo postagens partidárias nas redes sociais.
Esses eleitores no Brasil, em proporções pouco menores do que nos Estados Unidos — estimados em 51% —, têm uma interferência direta na corrida eleitoral. Qualquer movimento errado pode afastá-los de determinado partido ou candidato. Uma diferença, entretanto, torna o brasileiro ainda mais importante: a obrigatoriedade do voto. Não existe uma forma de se abster no Brasil.
Por fim, o recado: nunca desdenhe de um “independente”. Ele vai fazer diferença nas urnas.
Prêmio Esso
O Correio está na final do Esso, um dos mais prestigiados da imprensa brasileira, com cinco reportagens das editorias de Economia, Cidades e Política. É um orgulho trabalhar com equipes tão especiais.
Fonte: Correio Braziliense
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