A diretoria do Banco Central subiu os juros básicos de 9,5% para 10% ao ano, na sexta alta seguida. Com isso, a taxa volta a dois dígitos, o que não ocorria há dois anos. Segundo analistas, o objetivo é segurar a inflação em 2014
Quase dois anos depois... A volta dos dois dígitos
BC eleva juro pela sexta vez este ano, para 10%, de olho no efeito sobre a inflação em 2014
Gabriela Valente e Clarice Spitz
Quase dois anos depois, a taxa básica de juros, a Selic, voltou ao patamar de dois dígitos, o que não acontecia desde janeiro do ano passado. Atento aos efeitos sobre a inflação em 2014, ano eleitoral, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) elevou, por unanimidade, a Selic em 0,5 ponto percentual, de 9,5% para 10% ao ano. Foi a sexta alta seguida da taxa este ano e consolida a posição do Brasil no topo do ranking de maior juro real, com um percentual de 4,1%, seguido por China (3,1%) e Chile (2,8%), segundo o site de informações financeiras Moneyou. A decisão já era esperada por praticamente todos os analistas do mercado financeiro, mas o comunicado do BC surpreendeu. O texto divulgado após a reunião sugere que as altas de juros podem ter um ritmo menor daqui para frente.
Na nota, o BC suprimiu do texto que publicava desde maio, a parte que dizia que "a decisão contribuirá para colocar a inflação em declínio e assegurar que essa tendência persista no próximo ano" O comunicado resumiu-se à seguinte frase: "Dando prosseguimento ao processo de ajuste da taxa básica de juros, iniciado na reunião de abril de 2013, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic para 10% ao ano, sem viés"
— O Brasil deve continuar na contramão do panorama de juros mundial. A inflação tem elementos que não devem se alterar, com a perspectiva de o desemprego permanecer baixo e a continuidade da pressão de serviços, que têm elasticidade reduzida. É um cenário de renda mais estável, mas com potencial inflacionário — avalia Jason Vieira, diretor da Moneyou.
Para Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC, o fator eleitoral está por trás da decisão do Banco Central de elevar juros. Ele prevê que a Selic terá novo aumento de 0,25 ponto percentual e chegará a 10,25% ao ano em 2014.0 economista estima que os juros deveriam ser elevados acima de 12% para que a inflação voltasse a ficar mais perto do centro da meta, de 4,5% ao ano.
Na avaliação do economista-chefe do Santander, Maurício Molan, o comunicado deixa claro que o BC poderá frear a alta de juros em janeiro, uma decisão que dependerá de dados econômicos. Para ele, não há influência do calendário eleitoral, já que o arrocho promovido desde abril é muito maior do que o esperado.
Já o economista-chefe da corretora Gradual, André Perfeito, mantém a aposta de que o Copom continuará aumentando a Selic gradualmente. Ele lembrou que a decisão foi unânime e que houve mudanças, mas a estrutura do texto foi a mesma. Ao contrário da maioria dos especialistas, Perfeito aposta que o Copom subirá a Selic mais três vezes, sempre em doses de 0,5 ponto percentual. Assim, a taxa básica chegaria a 11% em fevereiro.
— O Copom continuou a usar a expressão "dando prosseguimento" que significa que ainda está preocupado com a inflação.
A decisão de subir 0,5 ponto percentual era esperada por praticamente todos economistas do mercado financeiro. De acordo com a pesquisa semanal que o próprio BC faz com os profissionais das maiores instituições financeiras do país, a aposta é que o Copom continuará a elevar os juros no ano que vem. A expectativa é que a Selic subirá mais duas vezes e chegará a 10,5% ao ano em 2014.
De olho na resistência do índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) — que acumula uma alta de 5,84% neste ano - e nas eleições, os analistas projetam um aumento de 0,25 ponto percentual em janeiro e um outro, na mesma proporção, somente em dezembro de 2014. A avaliação é que o Copom interromperia a escalada dos juros no auge da campanha eleitoral.
Segundo o levantamento do BC, a expectativa para a inflação no ano que vem está em 5,92%. A meta para tanto para este ano quanto para 2014 é de 4,5% com uma tolerância de 2 pontos percentuais.
Segundo Sérgio Vale, economista da MB Associados, a lógica que permeia as apostas do mercado é que o governo deverá voltar a aumentar a Selic apenas depois das eleições. Ele garante que o BC construiu o calendário de datas do Copom para o ano que vem de forma que a presidente seja favorecida, pois haverá duas reuniões após a votação.
— Com isso abre espaço para manter a Selic estável durante o período eleitoral para voltar a subir apenas no final do ano depois da provável vitória da Dilma — afirmou Vale. — Todo o governo em ação para ajudar a presidente a ser reeleita afinal.
Ele faz referencia ao quadro das contas públicas brasileiras que estão deterioradas. O país apresentou déficit fiscal nos últimos dois meses e já abandonou a meta de economia para pagar juros da dívida. Tudo isso favorece a inflação porque significa que o governo federal gasta mais do que prometeu. E sobra para o Banco Central controlar os preços sozinho.
Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o controle das despesas seria a saída para combater a inflação. A entidade diz que o retorno à taxa de dois dígitos inibirá a expansão dos investimentos privados.
"A Confederação Nacional da Indústria propõe que uma eventual retomada da inflação deva ser combatida, sobretudo, com a utilização da política fiscal, a partir da contenção dos gastos públicos correntes"
"O retorno da taxa Selic aos dois dígitos é uma péssima notícia para o Brasil", disse a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) em nota. Segundo a FIESP, o aumento é "equivocado" e deve fazer com que o desempenho econômico do país fique em cerca de 2,5% neste ano, abaixo da média dos países emergentes (4,5%).
"O Brasil precisa de um novo foco na política econômica: maior controle dos gastos, mais investimento público, mais concessões e menores taxas de juros. Só assim voltaremos a ter o crescimento que a sociedade demanda e merece" afirma o presidente da Fiesp, Paulo Skaf.
Além da pressão dos gastos da União, o BC conta com as incertezas externas. O Federal Reserve (Banco Central americano, Fed) já indicou que começará a retirar os estímulos monetários no ano que vem. O dólar deve ficar mais caro por isso. E isso pressiona a inflação.
A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) também considera que a nova alta dos juros dificultam a retomada do crescimento, que conta com perspectivas de redução da liquidez internacional.
Fonte: O Globo
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