Guilherme Serodio e Alessandra Saraiva – Valor Econômico
RIO - O pessimismo com a economia terá peso expressivo na escolha do presidente da República em outubro. É o que concluem cientistas políticos ouvidos pelo Valor. Esse mal estar com o quadro econômico já se reflete nos índices inéditos de votos em branco e nulos apurados pelas pesquisas eleitorais, mas a direção que a insatisfação deve tomar ainda é uma incógnita.
Em maio, todos os indicadores de confiança do consumidor, indústria, serviços e varejo encerraram em queda, atingindo patamares equivalentes aos do auge da crise global de 2009. No mês seguinte, quase todos os índices repetiram a trajetória pessimista.
O fenômeno não parece ser passageiro. Para o superintendente-adjunto de ciclos econômicos da Fundação Getulio Vargas (FGV), Aloisio Campelo Junior, responsável pelo Índice de Confiança da Indústria (ICI), o patamar menos otimista do brasileiro deve permanecer até o fim do ano eleitoral. "Somente em 2015 devemos ter algum tipo de reação na confiança, com patamares semelhantes ao de antes da crise global em 2009", diz.
A continuidade do fenômeno pode reforçar a possibilidade de termos parcelas recordes de votos nulos e em branco nas eleições presidenciais desse ano, segundo o cientista político da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Paulo Baía. "Se observamos as pesquisas de intenção de voto mais recentes, podemos notar que os percentuais de votos em branco e nulos já estão acima de 15%, e até próximos a 20%, 25%. Nas décadas de 1980 e 1990, essa parcela não chegava a 10%, 15%", avalia. "De todas as campanhas que acompanhei, essa será a que encontrará o eleitor mais pessimista; e com o maior grau de insatisfação", afirma Baía.
À frente de pesquisas que relacionam indicadores econômicos ao voto, os cientistas políticos da FGV Cesar Zucco e Daniela Campello afirmam que a avaliação negativa da economia está tendo um peso exacerbado nas pesquisas no começo da campanha. Segundo eles, a economia tem pior avaliação do que os programas sociais do governo e o desempenho da presidente.
"A economia está puxando a popularidade da presidente mais para baixo do que deveria, considerando-se a avaliação do governo em outras áreas", diz Zucco. Para Daniela, "há um excesso de pessimismo que ainda pode se reverter. Os programas governamentais são o espaço que o governo tem para atuar [na campanha]".
Por sua vez, a economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), Viviane Seda, responsável pelo Índice de Confiança do Consumidor (ICC), não acredita em reversão rápida do cenário pessimista atual. No âmbito do consumidor, nem mesmo a alta de 1% do ICC em junho - o único índice de confiança a apresentar melhora no mês -, pode ser comemorada, pois foi motivada por aumento de empregos temporários por conta da Copa, na análise dela.
Para Ricardo Ismael, cientista político da Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio), o cenário atual da economia é bem mais adverso para o governo do que em 2010, primeira eleição de Dilma. Naquele ano, o país cresceu 7,5% e vivia uma fase de expansão do consumo das famílias. Na sua visão, é a oposição que deve ser favorecida com os dados negativos da economia. "A primeira constatação, bastante óbvia, é que aumentam as chances da oposição", afirma. "Mas há uma variável a favor da Dilma que é o desemprego baixo", ressalta.
O superintendente-adjunto de inflação do Ibre/FGV, Salomão Quadros, também alerta para o avanço da inflação nos primeiros meses de 2014. Isso, na prática, acabou fortalecendo ainda mais o pessimismo do eleitor com a economia. Ele considera que a inflação é um dos indicadores macroeconômicos mais próximos à percepção do brasileiro. "Quando os preços sobem, o brasileiro nota rapidamente", comenta.
Um dos aspectos que também contribuem para a piora do humor com a economia é a ausência de perspectiva de melhora. O consultor do Ibre/FGV, responsável pelo Índice de Confiança do setor de Serviços (ICS), Silvio Sales, comenta que, diferentemente de 2009, "fundo do poço" nas avaliações sobre a economia brasileira, não há, em 2014, percepção de que o quadro poderia melhorar em poucos meses. Isso porque a crise global daquele ano era o grande fator de influência - o que não é o caso esse ano, com cenário influenciado por fracos indicadores macroecônomicos.
Mas, na análise do especialista, o "efeito líquido" do pessimismo com a economia em outras frentes, como a da política, por exemplo, ainda não está muito claro. "O que podemos dizer é que o nível de desconfiança [do brasileiro] com o futuro aumenta", afirma.
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