• Queda da confiança foi por falta de crescimento
- Valor Econômico
O governo não vê nada de errado com a política econômica que adotou nos últimos três anos. Ao rejeitar a existência de equívocos que teriam levado o país ao baixo crescimento e alta inflação ele não está recorrendo a um discurso eleitoreiro que, encerrada a disputa, será revisto caso a presidente Dilma Rousseff conquiste o segundo mandato. A negação é fruto da genuína convicção da presidente e do ministro da Fazenda, Guido Mantega.
Ambos estão seguros de que o que derrubou a atividade econômica no país foi a crise internacional que começou em 2008/2009, aprofundou-se em 2011 na zona do euro e esgotou todas as fontes de dinamismo das economias maduras. A recuperação nos países ricos, portanto, trará de volta a expansão da atividade doméstica. A confiança dos empresários, segundo o ministro, também foi minada pela desaceleração econômica e não pelas ações do governo.
Ontem, de Feira de Santana, na Bahia, Dilma assegurou que "não é necessário um ajuste fiscal profundo" tal como seus adversários apregoam.
Na quarta-feira, o ministro da Fazenda explicou, em entrevista ao Valor, que "2015 será um ano de ajuste fiscal nos moldes de 2011", quando o governo teve que fazer um contingenciamento de R$ 50 bilhões do gasto público para cumprir a meta de superávit primário de 3,1% do PIB. Dessa vez, segundo ele, o esforço fiscal será de menor magnitude, pois a meta fiscal é de 2% e 2,5% do PIB. "Mas vamos segurar a despesa."
Há uma enorme distância entre 2015 e 2011 quando a economia vinha de um crescimento de 7,5% em 2010. O corte na despesa em 2015, ano em que o crescimento continuará baixo, tende a ser mais doloroso do que em 2011. Fica, porém, a dúvida sobre o que Dilma considera "profundo".
Ela e Mantega atribuem grande parte da fragilidade da economia brasileira ao baixo crescimento nos Estados Unidos e na zona do euro. Ele cita estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI) que considera a economia mundial responsável por 60% do crescimento no Brasil. Os 40% restantes o ministro explica pela expansão do mercado interno, mas a falta de crédito para o consumo compromete essa performance.
Assim que os bancos privados liberarem mais o crédito para consumo, a economia americana firmar uma trajetória de recuperação e a Europa reagir aos estímulos fiscais esperados, que o ministro espera que sejam fortes, o Brasil voltará a crescer. "Lá [na Europa] eles têm que adotar uma política keynesiana", advoga.
O marco da mudança na macroeconomia, que já vinha sobre bases mais frouxas desde 2009, foi o segundo semestre de 2011. A taxa Selic, que subia desde o início daquele ano, foi revertida em agosto e passou a cair. Para tanto, o governo reforçou a meta fiscal com o excesso de receita de R$ 10,9 bilhões, A taxa de câmbio passou de R$ 1,67 para R$ 1,88 com a imposição de IOF sobre capital externo. No fim de 2012, os juros já eram de 7,25% ao ano, o superávit havia caído e o câmbio se desvalorizado.
Chega-se a setembro de 2014 em situação diversa: os juros de 11% ao ano, a meta fiscal derreteu para 1,9% do PIB e não será cumprida, o dólar subiu para a casa de R$ 2,40. Economistas da oposição calculam que superávit recorrente das contas públicas (que independe de receitas extraordinárias) é, hoje, próximo a zero. Sair de zero para 2% do PIB é um desafio de bom tamanho.
No último ano do governo Dilma, a expectativa é que a política econômica produza um crescimento de 0,5% e a inflação fique na casa dos 6,2%. Se isso se confirmar, o crescimento médio nos quatro anos de mandato terá sido de cerca de 1,6% a 1,7% e a inflação média ao redor de 6%. Uma performance que desaponta.
Enquanto os economistas críticos do governo identificam problemas graves na condução da economia, que levaram o país à recessão no primeiro trimestre deste ano, Mantega avalia que a retração da atividade foi pontual, fruto de uma conjunção de eventos transitórios, e que no segundo semestre os dados virão melhores.
"Não há recessão nem estagnação", sentencia Mantega. "A economia está sólida", garante. Seus argumentos: o mercado interno está intacto, a massa salarial cresce menos, mas cresce, o investimento estrangeiro direto chegou a US$ 67 bilhões, a bolsa de valores andou subindo e há oferta de emprego.
Os riscos apontados para a frente - com estagnação, recessão e desemprego - se não houver uma mudança no mix da política econômica, retomada das reformas e correção dos preços defasados, dentre outras ações defendidas por vários economistas, não são referendados pelo governo.
Mantega admite a necessidade de uma recuperação gradual do superávit primário para permitir redução dos juros, mas não concorda com a redução do papel dos bancos públicos nem com mudanças na concepção da política industrial. "Sem o conteúdo nacional", uma das críticas entre tantas outras à política industrial, "não teríamos a indústria naval", diz ele.
Em meio ao debate com os contornos da campanha eleitoral, o fato é que nada do que foi feito nos últimos anos, nem mesmo os quase R$ 500 bilhões colocados nos bancos públicos para financiar a economia, foi capaz de sustentar a expansão do investimento. Encerrou-se um ciclo de forte expansão da demanda que não foi substituído pelo crescimento da oferta. A produtividade da economia não cresce desde 2011 e a taxa de investimento retrocedeu.
Nos três primeiros anos da gestão Dilma houve uma acentuada queda da produtividade do capital, de menos 1,6% ao ano; e a produtividade do trabalho cresceu menos, de 2,1% para 1,4% ao ano, descrevem os economistas Fernando de Hollanda Barbosa e Samuel Pessôa no texto "Desaceleração Recente da Economia". O trabalho é parte da agenda "Sob a Luz do Sol", uma coletânea de diagnósticos e propostas para o país elaborada por profissionais reunidos no Centro de Debate de Políticas Públicas (CDPP).
Os autores arriscam um palpite: "Uma possível conjectura é que o enorme intervencionismo do setor público que se iniciou de forma mais pesada em 2009 tenha reduzido muito a produtividade incremental do capital em função, provavelmente, de má alocação do recurso".
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