• Déficit do governo central em setembro, de R$ 20,4 bilhões, foi o quinto seguido e o pior resultado fiscal da série histórica
Martha Beck – O Globo
BRASÍLIA - As contas públicas voltaram a ficar no vermelho em setembro. Pelo quinto mês consecutivo, o governo central (composto por Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central) registrou déficit primário. O valor, de R$ 20,4 bilhões, representa o pior resultado mensal da série histórica iniciada em 1997.
Ele significa que o governo não conseguiu poupar nenhum centavo para o pagamento de juros da dívida pública. Essa é a primeira vez na história que o resultado das contas públicas fica negativo por cinco meses seguidos.
Alem disso, considerando o setor público consolidado (União, estados, municípios e estatais) gastaram R$ 25,5 bilhões a mais do que arrecadaram em setembro, de acordo com os dados divulgados nesta sexta-feira pelo Banco Central. É o pior resultado mensal já registrado em toda a contabilidade pública, que começou a ser feita em 2001.
Diante do péssimo resultado fiscal de setembro, o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, admitiu hoje que o governo vai encaminhar ao Congresso uma proposta de mudança na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014. Para evitar o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, será preciso reduzir a meta de superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida pública) do ano. Ele não informou para quanto.
No ano, o governo central acumula um déficit primário de R$ 15,7 bilhões. O resultado também é o pior da história para o período. Com isso, é impossível que a equipe econômica consiga atingir a meta fiscal fixada para o ano, de superávit de R$ 80,8 bilhões, ou 1,55% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país).
Pela série histórica do Tesouro Nacional, até setembro deste ano, o pior resultado mensal registrado pelo governo central havia sido em dezembro de 2008, no auge da crise mundial: um déficit de R$ 19,9 bilhões.
Resultado ruim divulgado após eleições
O governo deixou para o último dia do mês a divulgação do dado mais desfavorável para a presidente Dilma Rousseff. O anúncio do resultado das contas públicas vem cinco dias depois do fim da disputa eleitoral.
Questionado sobre o fato, Augustin negou que a decisão de só fazer isso agora tenha sido política:
— Temos um modelo de trabalho que faz com que de dois em dois meses nós façamos uma programação. As datas dessa sistemática nunca atendem ao calendário eleitoral. O número de setembro era um número crucial para essa decisão. Temos já a convicção dessa necessidade.
Segundo relatório divulgado nesta sexta-feira, o déficit primário de setembro se deve principalmente a um aumento nas despesas. Houve, por exemplo, um crescimento de R$ 7,4 bilhões nos gastos da Previdência Social devido ao pagamento da segunda parcela do décimo terceiro salário aos segurados.
Por outro lado, as receitas continuam fracas. Houve uma queda de R$ 3,1 bilhões no recolhimento do Imposto de Renda da pessoa jurídica e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL).
No acumulado do ano, as despesas subiram num ritmo muito mais forte que as receitas. Enquanto a arrecadação líquida somou R$ 739,5 bilhões (alta de 7,2%), os gastos chegaram a R$ 755,2 bilhões, com um crescimento de 13,2%. Somente os desembolsos com custeio cresceram 15,9%. Já os investimentos subiram 34,1%.
Os gastos do governo com a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) até setembro chegam a R$ 8 bilhões, o que equivale ao dobro do registrado no mesmo período do ano passado.
Metas de 2015 serão mantidas
O secretário do Tesouro afirmou que o governo não estuda mexer nas metas fiscais de 2015. Apesar da forte deterioração do quadro fiscal em 2014, Augustin disse que o governo vai trabalhar para melhorar o desempenho e chegar ao superávit primário entre 2,5% e 2% que foi fixado na LDO do ano que vem.
Segundo Augustin, entre as medidas que o governo vai adotar estão reduções de gastos, como os de seguro-desemprego e abono salarial:
— É possível fazer reduções de despesas que não sejam negativas para o crescimento da economia de modo a assegurar o cumprimento da meta de 2015.
Outro elemento que vai ajudar na política fiscal, de acordo com ele, é o crescimento da atividade econômica:
— A meta de 2015 é factível dentro de uma economia que já deu sinais de melhora.
Augustin reafirmou que a política fiscal brasileira é sólida e que isso não vai mudar em função de resultados pontuais. Ele justificou o pior desempenho das contas públicas na história com o baixo crescimento da economia em 2014, que prejudicou a arrecadação, e com as medidas de desoneração que foram adotadas pelo governo para tentar reativar a atividade. Ele também citou o aumento das despesas com investimento e educação.
— A opção do Brasil é a de um país que tem solidez fiscal. Não vai deixar de ter isso por causa de um resultado específico — disse ele, acrescentando: — Tivemos um crescimento econômico bem abaixo do que nós estávamos trabalhando devido a um crescimento internacional mais baixo e também a choques de oferta que resultaram numa política monetária contracionista. Assim, o crescimento da receita foi bem abaixo do que nós estimávamos — disse ele, destacando ainda que as receitas no ano ficaram R$ 40 bilhões abaixo das estimativas do primeiro decreto do ano.
Mesmo assim, o secretário disse não acreditar que o Brasil será rebaixado pelas agências de classificação de risco em função da deterioração fiscal:
— Não acredito nisso (rebaixamento). Acho que estamos fazendo uma política econômica para retomar o crescimento. Sobre as mudanças na LDO de 2014, Augustin afirmou que o governo vai aumentar o abatimento previsto em lei com investimentos e desonerações, que está hoje em R$ 67 bilhões.
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