• Dilma precisa recuperar confiança para o país crescer
- Valor Econômico
Começou o aperto na economia. Ao retomar o ciclo de aumento da taxa de juros (Selic), interrompido há seis meses, o Comitê de Política Monetária (Copom) deu início, na quarta feira, ao programa de ajuste para 2015. A decisão, porém, não foi fruto de uma ampla articulação do novo governo. Ao contrário, ela surpreendeu a todos inclusive no Palácio do Planalto. O próximo passo para a correção de rumos deve contemplar um rearranjo fiscal "violentíssimo", segundo indicou uma qualificada fonte oficial ao Valor, ontem.
Reeleita por mais quatro anos, Dilma Rousseff sai em busca de credibilidade. Além de ter que cortar os gastos públicos que, na avaliação técnica, dificilmente poupará os investimentos, o governo vai elevar impostos. Uma das primeiras medidas deve ser o aumento da alíquota da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), zerada há dois anos, e que requer noventena.
Arrumar a casa e impor austeridade fiscal e monetária, atitude descartada pela presidente durante toda a campanha eleitoral, volta à agenda do segundo mandato de Dilma Rousseff como pré-requisito para tirar a atividade econômica da paralisia em que se encontra. Sem credibilidade seu governo não conseguirá a retomada do crescimento.
O aperto monetário pretende controlar a inflação depois que a taxa de câmbio teve desvalorização de 10% depois de 3 de setembro. Em 12 meses, o novo patamar do câmbio representa 0,5 ponto percentual a mais na inflação. "O mundo mudou de setembro para cá", disse uma fonte oficial, ao explicar a inesperada elevação da taxa Selic de 11% ao ano para 11,25% ao ano. O Federal Reserve encerrou o programa de compra de ativos e a normalização da política monetária nos EUA vai valorizar o dólar frente às demais moedas. Há, portanto, um ajuste de preços relativos em curso que se traduzirá, também, em aumentos de preços defasados internamente, como o dos combustíveis.
Mesmo que não haja mais uma defasagem de preços internos em relação aos internacionais do petróleo, agora, a ideia de quem advoga o reajuste da gasolina e do diesel é dar uma folga de caixa para a estatal.
O aumento dos juros era esperado pelo mercado para a próxima reunião do Copom, nos dias 2 e 3 de dezembro, e não para anteontem, a apenas 72 horas da eleição que reelegeu Dilma Rousseff. Na visão do BC, contudo, não era possível esperar.
As mensagens que foram dadas pelo presidente do BC, Alexandre Tombini, em entrevista em Washington no dia 11, e as declarações do diretor Carlos Hamilton quando da divulgação do Relatório de Inflação, no dia 30 de setembro, teriam sido reveladoras do senso de urgência, argumentam fontes.
Além do aperto monetário a decisão do Copom traz outras implicações menos evidentes, mas relevantes. Uma delas diz respeito à blindagem da atual diretoria do Banco Central. Não é segredo que o Palácio do Planalto gostaria de ver trocado pelo menos um diretor do BC. Agora, em meio a um processo de elevação dos juros, ficou muito mais difícil, embora nem todos da diretoria atual do BC queiram permanecer no cargo. Há quem pense em se aposentar e quem queira tomar outro destino.
Pelas decisões e sinais emitidos nos últimos dois dias, há uma aparente virada ortodoxa a conferir. O Copom subiu os juros e o governo acena com um forte ajuste fiscal para 2015. Não é possível estabelecer uma meta de superávit primário para o ano que vem, no entanto, sem saber qual vai ser o resultado deste ano.
Na avaliação técnica, sem qualquer "pedalada" (adiamento do gasto), o governo consegue superávit primário zero. Com eventuais adiamentos pode-se chegar a um saldo de 0,5% do PIB ou um pouquinho mais.
Sobre a execução deste ano o governo poderá adicionar mais 1% do PIB a título de meta primária para o próximo exercício. Por esse raciocínio, se 2014 fechar em equilíbrio a meta para 2015 será de 1% do PIB de saldo primário.
Mais importante do que fazer um esforço "violento" de ajuste em 2015 é traçar um programa com metas plurianuais crescentes e, com medidas estruturais, recuperar a capacidade do setor público produzir superávits. Isso implicaria não postergar mais a reforma da previdência, redefinir as regras de acesso ao abono salarial, ao seguro-desemprego e às pensões por morte, ampliar substancialmente o programa de concessões e renegociar os reajustes do funcionalismo público, dentre outras medidas.
Para limitar o crescimento anual da despesa total há quem defenda a aprovação de uma lei nos moldes da que o governo enviou ao Congresso em 2007, que fixava um teto para o aumento da folha de salários da União.
De pouco adianta fazer um superávit primário vigoroso em um ano, tal como ocorreu em 2011, e, como em 2012, afrouxar todos os instrumentos de política econômica em nome de uma "nova matriz" que deu com os burros n'água. Para obter ganho de confiança, é importante o novo governo anunciar metas de superávit que pretende perseguir até o fim do mandato em 2018.
Há uma grande preocupação no área econômica com o risco de o país perder o grau de investimento concedido pelas agências de rating em 2008, durante o governo Lula. O foco do titular da pasta da Fazenda deverá ser o de evitar que isso ocorra. Nesse sentido, mesmo que o próximo ministro da Fazenda tenha a missão desgastante de segurar o gasto público nos dois primeiros anos de governo e, depois, seja substituído, ele terá cumprido uma tarefa crucial.
Eleitores menos atentos podem considerar que essas medidas se configuram um estelionato eleitoral. São providências que a candidata à reeleição, presidente Dilma Rousseff, disse que quem as tomaria seria o seu adversário, Aécio Neves.
Foi com um discurso aterrorizante sobre o destino dos juros e dos gastos públicos e seus efeitos perversos sobre o emprego que Dilma atacou o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga indicado para o Ministério da Fazenda caso Aécio vencesse as eleições. Mas, como dizem no governo, aquilo era para ganhar a eleição. Agora a história é outra.
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