• Manter-se fechada seria a pior opção para Cuba: corria o risco de o próprio povo por abaixo o governo
- Folha de S. Paulo / Ilustrada
A notícia do reatamento das relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Cuba surpreendeu o mundo inteiro. Só não surpreendeu, claro, o papa Francisco e os envolvidos nas negociações que duraram 18 meses.
A notícia surpreendeu, mas foi bem recebida pela maioria das pessoas que viram nisso, com razão, um passo adiante na superação dos ressentimentos nascidos na Guerra Fria e alimentados pelos antagonismos ideológicos. De fato, se os Estados Unidos mantêm relações diplomáticas e comerciais com a China, governada pelo Partido Comunista que reprime implacavelmente qualquer cidadão que se atreva a discordar do regime, por que se manterem irredutíveis com Cuba?
Há razões para isso --ou havia. Não apenas Cuba está a 144 quilômetros do território norte-americano, como o regime comunista foi ali implantado no auge do conflito ideológico entre os Estados Unidos e a União Soviética.
Em função disso, Cuba fomentou a guerra de guerrilha em quase todos os países latino-americanos, visando implantar neles o regime comunista. E houve, ainda, o grave episódio da implantação, em Cuba, de mísseis soviéticos que quase provocou uma hecatombe nuclear. Acrescente-se a isso a fuga de milhares de cubanos para Miami, o que serviu para alimentar o antagonismo entre os dois países.
Mas não só. A tentativa de invasão de Cuba pelos americanos e a manutenção de Guantánamo como campo de prisioneiros em território cubano só serviram para manter acesas as hostilidades. É certo que, nos últimos anos, com o fim da URSS, que sustentava o regime cubano, a situação do país se agravou e, se não entrou em colapso, foi devido à ajuda da Venezuela chavista, que até hoje lhe fornece petróleo quase de graça, e à abertura ao turismo, que tinha sido estigmatizado pela revolução castrista, como mera prostituição.
A verdade é que o comunismo instaurado em Cuba não deu certo, como não deu certo em parte alguma. Naqueles países, como em Cuba, as condições de vida das pessoas melhoraram em função do investimento feito em educação e saúde, basicamente, mas essa melhoria tendia estacionar-se ou se deteriorar porque a economia ali não tem crescido na proporção necessária.
Esse foi o mal do comunismo, decorrente do equívoco teórico de Marx ao satanizar a iniciativa privada que é, na verdade, o motor da economia. Costumo dizer que, enquanto nos países capitalistas milhões de pessoas, diariamente, criam empresas, nos países socialistas, a economia era dirigida por alguns burocratas do partido, que decidiam o que tinha que ser feito e de que modo. O resultado inevitável foi o fracasso econômico que levou ao fim do regime.
Cuba não constitui uma exceção. Pelo contrário, como dependia da venda do tabaco e do açúcar, que lhe eram comprados pela União Soviética, o fim desta --e de todo o sistema socialista-- a deixou sem comprador. A consequência disso foi a debilitação da economia e a deterioração dos setores em que o regime mais progredira: a saúde e a educação.
A atual queda do preço do petróleo veio agravar ainda mais a situação econômica da Venezuela que, mal se aguentando nas pernas, não vai dar-lhe a ajuda que vem dando.
Se, à exceção da Coreia do Norte, governada por um pirado, todos os demais países socialistas mudaram de rumo, Cuba, cedo ou tarde, teria de fazê-lo. Manter-se fechada num regime sem futuro seria a pior opção: corria o risco de o próprio povo rebelar-se e por abaixo o governo.
É por essas razões --e outras que certamente desconheço-- que os irmãos Castro decidiram restabelecer o diálogo com o inimigo, uma vez que não há outro modo de tentar superar a crise e, pelo menos, adiar o fim do regime.
Aliás, se estou certo em minha análise, os norte-americanos não mais têm Cuba como ameaça, uma vez que o socialismo, como utopia, cumpriu sua missão e extinguiu-se.
Tanto sabem disso Obama como os irmãos Castro, e esse é o motivo por que o fim ou a manutenção do regime em Cuba não entrou na discussão. O que importa, para os norte-americanos, é eliminar a tensão e reconquistar o mercado cubano --que tanto necessita de seu apoio -- e, para Fidel e Raúl Castro, a manutenção do poder que detêm há 55 anos.
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