As vésperas de dirigir-se ao Fórum Econômico de Davos, para “vender” aos governantes e grandes empresários lá reunidos a viabilidade de um amplo ajuste das contas públicas no segundo mandato da presidente Dilma, o ministro da Fazenda Joaquim Levy confrontou-se com mais problemas deixados pela equipe econômica anterior.
À bilionária descapitalização das empresas da área energética (pelo represamento eleitoreiro de suas tarifas a partir de janeiro de 2013) e aos atrasos do repasse de verbas federais aos estados e municípios para a quitação de obras e serviços executados, transferida para as contas deste ano, entre várias distorções semelhantes, somaram-se outras estripulias financeiras descobertas por auditoria do TCU que se tornaram públicas nos últimos dias. E que foram bem avaliadas em editorial do Valor, na edição de domingo, intitulado “As ‘pedaladas’, o TCU e a Lei de Responsabilidade Fiscal”.
Trata-se do uso irregular pelo Palácio do Planalto (vedado expressamente por essa lei) de recursos da Caixa Econômica Federal para, sobretudo na campanha reeleitoral da presidente, aumento dos benefícios do Bolsa Família e para o programa Minha Casa, Minha Vida, neste
caso com o desvio de verbas do FGTS. Ações que, segundo a referida auditoria envolviam no final de agosto um montante de R$ 1,74 bilhão. Cabendo assinalar, quanto ao programa habitacional, que, após a campanha, as construtoras responsáveis pelas obras passaram a receber apenas parte de suas faturas, irregularidade ligada ao objetivo de redução “criativa” do déficit fiscal de 2014, e
que se manteve no novo governo em face das restrições de gastos do ajuste que está sendo tentado. O que também afetou e continua afetando muitas outras obras da
União.
Conclusão do editorial do Valor sobre as novas “pedaladas”: “ Desde que o conteúdo do relatório do TCU foi revelado, o governo iniciou uma estratégia para se proteger da tempestade que certamente virá. O advogado geral da União já prepara um novo périplo pelos gabinetes do Tribunal de Contas. Na última oportunidade em que isso se deu, ele conseguiu evitar o bloqueio dos bens da presidente da Petrobras, Graça Foster, na esteira da escandalosa aquisição da refinaria de Pasadena. No episódio das (novas) pedaladas, a missão de Adams é, basicamente, a mesma: evitar que o problema troque as páginas econômicas pelas policiais”.
O apagão de anteontem em dez estados das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste – combinado com a previsão de respeitados analistas sobre o risco de episódios semelhantes à frente – agravou o pessimismo dos diversos segmentos da iniciativa privada quanto ao comportamento da economia este ano e a incerteza quanto a uma retomada do crescimento em 2016. Cabendo, por outro lado, assinalar que a emergência do apagão reforça o outro tipo de restrições ambientais objeto de crescentes preocupações do mercado: as de escassez do abastecimento de água em São Paulo e no Rio. Respaldando tal pessimismo, simultaneamente ao apagão o FMI anunciou ter reduzido sua projeção para o PIB do Brasil este ano – de 1,46%, da anterior, para 0,3% agora. E a CNI, divulgou ontem o Índice (mensal) de Confiança do Empresário Industrial (Icei). Que começou 2015 com 44 pontos, o nível mais baixo desde 1999.
Dilma e o encontro de Davos – A inesperada desistência da presidente de comparecer ao Fórum de Davos (do qual participaria acompanhada de Joaquim Levy, do ministério da Fazenda, e de Alexandre Tombini, do Banco Central), com a troca da viagem à Suíça pela presença na posse de Evo Morales para um terceiro mandato no governo da Bolívia, não teve até agora uma justificativa minimamente razoável. Na verdade, a mudança deve ter resultado de avaliação da Casa Civil e do marqueteiro João Santana sobre o risco que Dilma correria de ser cobrada, por jornalistas daqui e de fora, a respeito do verdadeiro paradoxo entre os indicadores de aguda crise fiscal e da estagnação da economia que o Brasil apresenta hoje, e o veemente discurso que pronunciou no Fórum do ano passado enfatizando que o país tinha as contas públicas e a inflação sob completo controle e cresceria perto da taxa de 3% em 2014. Paradoxo constrangedor para ela tendo ao lado o ministro Levy. Cuja missão (cujo desafio) é corrigir as enormes distorções e os péssimos resultados macro e microeconômicos do seu primeiro governo.
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Jarbas de Holanda é jornalista
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