• Em vez de só evitar ruína no setor de energia, governo poderia fazer reforma profunda
- Folha de S. Paulo
Sem milagres, a economia deve crescer no máximo nada. Nada, como reiterou ontem o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, em conversa com donos do dinheiro grosso do mundo, em Davos. Desde pelo menos setembro, as expectativas de inflação nos 12 meses adiante apenas não têm sido piores que as do triste ano de 2003.
O biênio 2014-15 será, pois, como se sabia, de estagflação moderada, ainda que exótica, com baixo desemprego.
Isto posto, o que se pode fazer, além dos consertos rudimentares no que foi estragado por Dilma 1? Quer dizer, não se trata de fazer algo para arranjar alguns décimos de crescimento do PIB, mas para deixar a economia ao menos mais arrumada para acelerar um pouco em 2016.
Dilma 2 terá de dar um jeito na Petrobras e no setor elétrico, como se sabe, se quiser evitar desastres no curto prazo. Como, em tese, tem de colocar a mão na massa, por que não aproveitar para fazer reformas?
Parece ingenuidade perguntar, pois em seus discursos de transição de Dilma 1 para 2 a presidente fez questão de dizer que não vai mexer no modelo que acredita ser nacionalista, mas é apenas equivocado, quando não ruinoso, e que, aliás, começa a se desmanchar por si só, dado o desastre no setor.
A presidente não quer mexer na lei que obriga a Petrobras a superinvestir no pré-sal, sem ter dinheiro para tanto (o que deve complicar o avanço da exploração no Brasil, caso o preço do barril volte a subir).
A presidente não quer revisar o programa de exigência de conteúdo nacional e reservas de mercado, que asfixia a Petrobras, encarece investimentos e reduz a eficiência média da economia.
Mas o programa se esboroa, as empresas não têm como forne- cer equipamentos no prazo adequado, entre outros tantos desastres. A Petrobras vai cortar investimentos neste ano. Vai poder retomá-los no ano que vem?
O setor elétrico afunda em passivos derivados da política energética de Dilma 1, passivo que passará para a conta de luz do consumidor comum. Dilma 1, de resto, quis reprimir e represar preços de energia, como o quis fazer em tantos serviços concedidos. Se não mudar o modelo que funciona apenas em sua cabeça, a presidente vai reprimir ainda mais os investimentos. Também em 2016.
No entanto, para dar um choque de vitamina na economia no ano que vem, a presidente tem de apresentar um plano de concessões grande e competente. Sem desistir das ideias de Dilma 1, isso não vai acontecer.
Ainda no escuro
O "apaguinho gigante" continua sem explicação. Pior ainda, como de costume, os responsáveis pelo assunto dão explicações desencontradas e parciais sobre o que teria acontecido. O responsável maior, o governo federal, enrola. Por enquanto, não se sabe se o governo ignora o que se passou ou dá tratos à bola para inventar outra desconversa.
O que está difícil, porém. O vexame piora. Ontem, descobriu-se que o Brasil importou eletricidade da Argentina. Era esse o sistema "robusto", que não tinha problemas de geração, sistema que, na expectativa do governo, vai aguentar o tranco simultâneo de seca, calor, falta de energia e incompetência autoritária, pois, afinal, o país é abençoado por Deus.
Blasfêmia. É o que a gente pode dizer, de modo educado.
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