• O discurso de Dilma 2 foi animador, se a gente esquecer o elogio do fracasso de Dilma 1
- Folha de S. Paulo
Vamos supor que a presidente Dilma Rousseff tenha acordado de sonhos intranquilos, os quais acabou por anotar quando acordou em uma madrugada de sono ruim e, enfim, transformou em parte do discurso que leu ontem na primeira reunião ministerial. Assim, a gente fica desobrigada de discutir essa versão revisionista mal-ajambrada da sucessão de equívocos econômicos que foi o seu primeiro governo, para dizer tudo de modo caridoso.
Como demonstração de desejo de paz na terra e de boa vontade, a gente então pode se concentrar nas notícias animadoras do discurso, ou pelo menos prestar atenção aos atos de contrição subliminares, que a presidente traduziu em boas novas.
A presidente disse que seu governo vai lançar um "Programa de Desburocratização e Simplificação das Ações de Governo". O colunista, a caminho dos 50 anos, era adolescente quando o Brasil teve um Ministério da Desburocratização. Era chefiado por Hélio Beltrão, que aparecia muito no "Fantástico", da Globo, antes ou depois de reportagens sobre a cura do câncer. O ministro então declarou extintos o espantoso "atestado de vida" e o reconhecimento de firmas, que, no entanto, resiste. Logo, a gente tende a ficar desconfiada da cura do câncer, quer dizer, da burocracia crônica, um dos desastres silenciosos da produtividade brasileira. Mas é um plano de reforma, entre outros lançados ontem pela presidente. Sob Dilma 1, não houve nem promessa disso, ao contrário.
A presidente prometeu também um plano ampliado de privatizações, ou melhor, concessões de infraestrutura: rodovias, portos, aeroportos, hidrovias, dragagem de portos. Sem ironia, trata-se um dos raros meios à disposição do governo de dar algum impulso ao crescimento econômico a partir de 2016.
O programa estará a cargo do ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, que os céus o alumiem, pelo menos, caso a gente enfrente a desgraça de um outro racionamento de eletricidade.
Se o programa de concessões der certo, vamos esquecer enfim que a presidente não gostava nada dessa ideia até o início de seu governo, mas cedeu, dadas as premências da realidade, e privatizou algumas estradas e aeroportos.
Ainda não gostava muito dessa ideia quando procurou restringir de modo equivocado preços de negócios de rodovias ou geração de energia, por exemplo, o que atrasou a melhoria de estradas e a produção de eletricidade, além de derrubar ainda mais o investimento quando a economia brasileira já rastejava.
"Restringir de modo equivocado", ressalte-se a expressão, pois fazendo bons leilões e leis de concessão o preço acaba sendo bom, não havendo cartéis bandidos e amigos deles no governo.
A presidente prometeu ainda um "Plano Nacional de Exportações", com o objetivo de aumentar a variedade e o volume das exportações brasileiras. Muito bem, embora a gente não saiba o que virá dentro desse pacote.
No entanto, a gente sabe que, para exportar mais e melhor, muita vez é preciso importar também --considere-se o caso de sucesso da Embraer. Logo, a gente espera que a política comercial de Dilma 2 seja menos protecionista: que proteja a economia nacional de modo inteligente.
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