quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Fernando Exman - Duas ondas que o governo precisa furar

• Planalto teme desdobramentos da Operação Lava-Jato

- Valor Econômico

A presidente Dilma Rousseff passou as últimas semanas em reuniões fechadas para definir as prioridades a serem assumidas por seus ministros, enquanto aguarda a arrebentação de duas ondas relacionadas à Operação Lava-Jato - uma econômica e outra política. Os potenciais danos provocados por esses dois fenômenos, ainda considerados imprevisíveis no Palácio do Planalto, estão relacionados ao silêncio que Dilma rompeu ontem na abertura da reunião ministerial, ao discurso feito na Granja do Torto e a algumas das principais preocupações da presidente.

Dilma e seus auxiliares diretos ainda buscam estimar o impacto sobre o Produto Interno Bruto (PIB) das investigações de irregularidades nas relações entre a Petrobras e seus fornecedores. Ainda não sabem, por exemplo, com quais empresas poderão contar para executar grandes obras, aumentar os investimentos do país e até mesmo evitar o aumento da taxa de desemprego.

Além da própria Petrobras, as maiores construtoras brasileiras foram citadas na operação da Polícia Federal e a crise enfrentada pela estatal já coloca em xeque outros segmentos da indústria. Não à toa, é tratada com imensa cautela dentro do governo a discussão sobre a possibilidade de as empresas denunciadas serem consideradas inidôneas e, assim, passarem a enfrentar obstáculos para manter e assinar contratos com o Estado. Dilma ontem foi clara. Quer pessoas punidas, não empresas. Não a economia nacional.

A outra onda, política, explica em parte o motivo de Dilma ter iniciado o seu segundo mandato recolhida e limitando o alcance da discussão sobre a estratégia do governo a um núcleo reduzido de ministros. A presidente nunca foi afeita à articulação política. Evitou envolver-se diretamente nas negociações com o Congresso nos últimos quatro anos, e a falta de diálogo com o Executivo sempre foi uma queixa dos parlamentares governistas.

Dilma até chegou a sinalizar que mudaria de comportamento. Agora, no entanto, há uma nova conjuntura. O governo não sabe se os seus principais interlocutores no Congresso Nacional e nos partidos aliados serão arrastados pelo chamado petrolão, depois de a Procuradoria-Geral da República apresentar ao Supremo Tribunal Federal (STF) sua denúncia contra os políticos que possuem foro privilegiado e estão citados no caso.

As autoridades do Palácio do Planalto limitam-se a acompanhar pela imprensa os movimentos do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Mas já têm uma certeza: obviamente não haverá vácuo de poder, novas lideranças buscarão se consolidar com rapidez e o governo pode não ter muito tempo para agir em meio a uma agenda legislativa complexa.

Se de fato Janot apresentar sua denúncia em fevereiro, por exemplo, as discussões sobre a punição dos parlamentares envolvidos nos desvios de recursos da Petrobras e a criação de uma nova Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) coincidirão com o início da tramitação da medida provisória que define novas regras para a concessão de benefícios trabalhistas e previdenciários. O governo já está ciente de que não conseguirá aprová-la sem ajustes, pois a MP é alvo de críticas das centrais sindicais e até mesmo de integrantes da base.

Outra dura batalha a ser enfrentada pelo Executivo no Congresso envolverá uma nova prorrogação da Desvinculação de Receitas da União (DRU), mecanismo que permite ao governo desvincular até 20% das receitas das contribuições sociais - exceto as previdenciárias - para o orçamento fiscal. Tais verbas têm sido essenciais para o governo atingir a meta de superávit primário e dão mais liberdade ao Executivo no manejo dos seus recursos.

Em 2011, Dilma encontrou grandes dificuldades para aprovar a prorrogação da DRU. Só enviou ao Congresso em maio daquele ano a proposta de emenda constitucional (PEC) que manteria o dispositivo até 31 de dezembro de 2015. Tarde, se considerado o lento rito de tramitação de PECs no Parlamento e o grande número de votos necessários para a sua aprovação.

Àquela época, a então ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, sugeriu à presidente que projetos idênticos tramitassem de forma simultânea na Câmara e no Senado para evitar o pior. Dilma chegou a questionar a eficácia da ideia, mas não tinha alternativa. A base aliada conseguiu aprovar a proposta no fim daquele ano, praticamente às vésperas do início do recesso parlamentar e do prazo para a DRU expirar.

O governo poderia ter aprendido com o episódio, mas, pelo menos até agora, não há sinal de como o Palácio do Planalto pretende conduzir as negociações para prorrogar novamente o mecanismo. Tudo isso diante do olhar atento dos mercados em relação à determinação do governo Dilma Rousseff em entregar o ajuste fiscal prometido, num período em que o Executivo deve colecionar insatisfações entre deputados e senadores. Parlamentares já demonstram indisposição para aprovar medidas impopulares propostas pelo governo, principalmente diante de um quadro econômico recessivo, querem celeridade na ocupação dos escalões inferiores da máquina federal e enfrentarão restrições à liberação de suas emendas ao Orçamento.

Enquanto não vê "precificados" esses dois fatores que prejudicam o início de seu segundo mandato, Dilma busca tomar providências administrativas que só dependem do Executivo ou podem ser destravadas com gestões relativamente simples junto a outros Poderes. A mais importante delas é o início do processo de recuperação da confiança de empresários e investidores com o anúncio do ajuste fiscal. Dilma também quer acelerar concessões na área de infraestrutura e prometeu facilitar o ambiente de negócios do país.

O Palácio do Planalto tenta medir se o que se avizinha são apenas duas ondulações ou maremotos de maior magnitude. A resposta será capaz de determinar o destino da segunda administração da presidente Dilma Rousseff.

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