quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Celso Ming - Nem tudo é crise

- O Estado de S. Paulo

As análises vêm apresentando uma profusão de projeções negativas para a economia. Não se trata puramente de onda pessimista. Essas projeções são justificadas e de grande relevância.

Mas não é só de coisa ruim que vive a economia brasileira. Será parcial a avaliação que não leve em conta a reconhecida resiliência da economia – que é a qualidade que tem um corpo de recuperar-se prontamente depois de submetido a pancada. Mas, antes, resumidamente, convém pinçar os fatores negativos que puxam para o mau desempenho em 2015.

O primeiro é a dinâmica do ajuste. Mais austeridade, inflação alta, aperto redobrado dos juros e os tarifaços implicam redução do consumo e, portanto, também um ritmo mais lento de produção. O déficit de confiança do consumidor do empresário está muito alto e isso envenena tudo.

Em segundo lugar há a inércia. Os resultados da atividade (evolução do PIB) de 2014 foram ruins, como se comprovará no dia 27 de março, quando forem divulgadas as Contas Nacionais. É ponto de partida comprometido para 2015, que tende a retardar qualquer recuperação.

E há a escalada das incertezas. A fragilidade política da presidente Dilma pode prejudicar a qualidade e a duração do ajuste. A Operação Lava Jato aumenta as tensões na área política. A crise e, mais do que isso, as indefinições na Petrobrás não ajudam. A crescente ameaça de racionamento de energia elétrica e de fornecimento de água tratada tende a adiar os investimentos. E há o risco de rebaixamento da qualidade da dívida do Brasil e de perda do grau de investimento. Também não podem ser desprezadas as atuais restrições do mercado de trabalho que hoje vive uma situação inédita de pleno-emprego. Mais crescimento econômico enfrentaria falta crônica de mão de obra, especialmente da qualificada.

Mas isso não é toda a paisagem. O Brasil já passou por situações piores e delas se saiu bem. Apesar da multiplicação de relatórios ruins, o capital estrangeiro continua desembarcando por aqui. No ano passado, o Investimento Estrangeiro Direto (IED) alcançou US$ 62,5 bilhões. A desvalorização cambial de quase 20% em 12 meses dá ao investidor externo mais reais por dólar. Apenas por conta disso – e apesar da queda de preços das commodities –, as exportações podem ganhar espaço e atrair capitais. A perspectiva é de que neste ano outros US$ 60 bilhões chegarão, como aponta a Pesquisa Focus feita semanalmente pelo Banco Central. Não é pouca coisa, mesmo levando-se em consideração de que, no total, podem incluir-se empréstimos disfarçados das matrizes estrangeiras para suas filiais no Brasil.

A despeito de tanta coisa, lá fora o País continua sendo visto como oportunidade. Com boa dose de condescendência, o investidor tende a achar que, no momento, o Brasil está apenas de porre e que, mais adiante, a ressaca passará. Aqui dentro, embora o desânimo prevaleça, quem toca seus negócios sabe que não pode pegar no sono, porque a concorrência está esperta. Antes que se complete, o plano de ajuste pode começar a produzir resultados e a confiança pode retornar.

Para o início de uma virada falta muita coisa. Mas falta principalmente a presidente Dilma assumir a defesa intransigente de sua nova política. Se continuar como está, pouco à vontade e com o breque de mão puxado, a pronta recuperação vai sendo adiada.

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