• Manifestação que parou a Ponte foi sinal concreto dos problemas da Petrobras. Não foi caos no trânsito, mas drama trabalhista
- O Globo
Uma artéria de mobilidade urbana da Região Metropolitana entupiu e interrompeu a circulação entre Rio e Niterói uma semana semana atrás. Foi uma passeata contra violações trabalhistas de uma fornecedora da Petrobras o motivo da obstrução da ponte, por mais de duas horas, debaixo do sol quente de um início de tarde de verão. Análises apressadas viram no movimento um fenômeno de desordem urbana, incompetência da concessionária CCR Ponte e da Polícia Rodoviária Federal, supressão do direito de ir e vir da coletividade, caos no trânsito. Nada disso. "Foi a crise social, estúpido!", numa adaptação da frase que deu fama a James Carville, então estrategista da primeira campanha de Bill Clinton à presidência dos EUA, em 1992.
A manifestação dos trabalhadores da Alumini Engenharia foi o primeiro sinal visível de um cenário que vai se agravar, se a Petrobras não sair do breu em que está metida desde a eclosão do escândalo de corrupção. Sem emprego, salário ou indenização, eles marcharam até a sede da estatal para chamar atenção para o drama familiar que, até então, viviam silenciosamente. Por parecer uma coisa e se tratar de outra, o episódio remete à fila dos candidatos para um concurso de garis, também no Rio, em 2003. No primeiro dia de inscrições, apenas para nomes iniciados com a letra "A", apareceram 15 mil candidatos. O Centro da cidade deu um nó. Só depois de reclamar do trânsito, os cariocas enxergaram a crise do desemprego, àquela altura em 12% na média (em 2014, fechou em 4,8%).
A Petrobras é locomotiva de uma cadeia de 20 mil fornecedores, entre fabricantes de máquinas e equipamentos, estaleiros, prestadores de serviços. Sem falar nos bancos, que têm mais de R$ 100 bilhões pendurados com a estatal e sua rede, e nos patrocinados, das escolas de samba da Sapucaí ao cinema nacional e a projetos sociais Brasil afora. Diretamente, a Petrobras emprega 86 mil trabalhadores. Mas seu peso no mercado de trabalho é muito maior, levando-se em conta a cadeia produtiva. A empresa está relacionada a 13% do PIB. Qualquer pane nessa estrutura tem reflexo na atividade econômica do país. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) já se deu conta do tamanho do problema. Dia 24, participa do lançamento de um manifesto de trabalhadores em defesa da estatal.
E organiza para 13 de março uma série de manifestações em capitais brasileiras. Um senso de urgência e compaixão deve permear as reações da sociedade aos atos de trabalhadores em vias públicas, não só no Rio, mas no país inteiro. Em resposta ao protesto da semana passada, o Ministério Público Federal anunciou abertura de inquérito para investigar a legalidade do protesto. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) conseguiu na Justiça liminar proibindo o bloqueio da Ponte Rio-Niterói por qualquer tipo de manifestação. A punição é multa de R$ 500 mil por hora de interrupção. Não há notícias de políticas públicas para lidar com essa crise aguda — e ainda em andamento.
Prefeitos, governadores, União e entidades patronais cobram providências da estatal. Mas não ativaram o arsenal de recursos próprios que têm para defender trabalhadores com meses de salários atrasados ou demitidos sem indenização. As redes de proteção social, via transferência de renda, aluguel social ou distribuição de itens básicos, ajudariam durante a intempérie. O papel nesse drama é grande demais para ter só o protagonista. Falta elenco de apoio.
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