• Chefes de Estado concordam que é preciso maior desenvolvimento econômico e social no continente
Flávia Barbosa – O Globo
-CIDADE DO PANAMÁ -O início de uma "nova era" das relações interamericanas, detonada pela primeira participação de Cuba em um fórum hemisférico em 53 anos, dominou a VII Cúpula das Américas, encerrada sábado, no Panamá. Paralelamente à política, porém, os 35 chefes de Estado e governo concordaram que o continente precisa também de um divisor de águas no processo de desenvolvimento econômico e social. O consenso dos líderes, costurado nos fóruns paralelos e na plenária final, é que a agenda estratégica passa por uma ofensiva de formação científica e tecnológica, em nível técnico e superior; pela expansão em massa do acesso à internet; e pela integração física e comercial, para promover um crescimento inclusivo e ambientalmente sustentável.
Só assim a região estará preparada para a chamada economia do conhecimento, que está ancorada na inovação, amplia a competitividade e gera mais riquezas internamente. É ainda o caminho para continuar o processo de redução da pobreza e da desigualdade e a expansão da classe média.
— Precisamos dar o salto da economia do conhecimento. Agricultura, indústria, serviços, tudo tem de ser baseado em inovação, tecnologia, inovação, inovação — afirmou a presidente Dilma Rousseff, que defendeu a ampliação do ensino técnico.
Esse é um investimento para alterar estruturalmente a dinâmica de crescimento da América Latina, que não pode mais contar com o motor das commodities, que financiou a expansão na primeira década dos anos 2000. A palavra de ordem é competitividade.
O presidente americano, Barack Obama, lembrou que a tecnologia está provocando mudanças significativas nas indústrias tradicionais e nas pequenas empresas.
— Precisamos das pessoas mais bem treinadas do mundo, e não apenas nas universidades de elite. Os sistemas de faculdades comunitárias são incríveis nos EUA, precisamos apoiar mais iniciativas assim, perguntar aos empresários para que e como devemos treinar aquelas pessoas — afirmou Obama.
Modelo de ensino unificado
Os países acordaram a criação do Sistema Interamericano de Educação, com foco na qualidade do ensino e na transferência de experiências e excelência. Um dos modelos a serem explorados seriam os programas brasileiro Ciências Sem Fronteiras e o americano 100 Mil Fortes nas Américas, de bolsas e intercâmbio de universitários, mencionados no encontro dos empresários.
—(O objetivo) é que todos os jovens das Américas se sobressaiam como os mais cultos, os mais educados e os mais competitivos — afirmou o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, autor da proposta abraçada pelo continente.
Neste contexto, a palavra conectividade entrou com força no léxico dos líderes das Américas. A expansão da banda larga é vista como essencial para levar educação e treinamento a jovens e adultos mais pobres e fora dos centros urbanos. Não foi à toa que o mais celebrado empresário presente ao Fórum de CEOs foi Mark Zuckerberg, do Facebook, que fechou parcerias com Panamá e Brasil.
— A inclusão digital e a conectividade são a alfabetização da nossa época — afirmou o presidente do México, Enrique Pena Nieto.
Houve amplo reconhecimento pelos líderes de que o Estado é importante para garantir os objetivos de inclusão social no plano econômico, mas incapaz, pelas limitações fiscais e de expertise, de implementar sozinho as mudanças necessárias nas Américas. Por isso, foi grande o apoio das maiores e mais dinâmicas economias da região, como EUA, Brasil e México, às Parcerias Público-Privadas (PPP) e a reformas que liberem o empreendedorismo.
Ênfase na integração
Também foi significativa — e, de certa forma, uma mudança na agenda regional — a ênfase que países como o Brasil deram à integração comercial. Os líderes entendem que são necessárias medidas para desburocratizar procedimentos aduaneiros. Ainda que não tenha sido reavivada a iniciativa da Aliança de Livre Comércio das Américas (Alca), é clara a percepção de que é preciso mais parcerias para acelerar exportações e importações entre os 35 países.
— Os países das Américas têm um peso importante nas relações econômicas de Cuba com o exterior. Particularmente, esses laços se estreitaram com a América Latina e o Caribe, a partir do reconhecimento da importância da complementação econômica — afirmou Rodrigo Malmierca, ministro de Comércio Exterior e Investimento Estrangeiro de Cuba.
— Vamos continuar promovendo avanços em matéria de integração regional e explorando oportunidades oferecidas pela Celac e pela Alba.
Para alcançarem o objetivo de expansão do comércio exterior, um salto fundamental nas relações entre as nações é a coordenação de projetos comuns de infraestrutura. São áreas de interesse especialmente a geração e a transmissão de energia e a infraestrutura de logística e transportes.
— Essa integração deve buscar maior comércio regional e a ampliação de investimentos — afirmou a presidente Dilma.
— Quanto mais pudermos coordenar na região, mais benefícios teremos. Hoje, por exemplo, na América Central, o custo de energia chega a ser três vezes maior do que nos EUA. Se conseguirmos construir um único mercado de energia, ficará para todos mais barato — exemplificou Obama.
De acordo com o presidente Juan Carlos Varela, do Panamá, infraestrutura foi um dos temas dominantes nos bastidores da sessão plenária da Cúpula. Os países pediram que as organizações multilaterais de crédito, como Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ajudem os Estados na identificação de projetos e estudos técnicos.
— Neste sentido, celebramos a proposta surgida no retiro privado dos mandatários, de se criar um Centro de Desenvolvimento de Infraestrutura para apoiar os países da região em seus esforços — disse Varela.
Parte do roteiro desta nova estratégia aparece no documento sobre os consensos da Cúpula das Américas, preparado pelo anfitrião, o governo do Panamá. O encontro terminou, pela terceira vez consecutiva, sem declaração final, que é um mandado formal de ação para todos os organismos multilaterais hemisféricos. O parágrafo crítico às sanções dos EUA à Venezuela, exigido por Caracas e seus aliados bolivarianos, inviabilizou a declaração. No encerramento, Juan Carlos Varela informou que o Peru vai sediar a VIII Cúpula das Américas, em 2018.
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