Delações em série
Cleide Carvalho, Germano Oliveira e Tiago Dantas
• Um dos seis novos colaboradores da Lava-Jato, Mário Goes diz que propinas iam para PT
SÃO PAULO - A Operação Lava-Jato ganhou seis novos delatores nos últimos dias, aumentando para 22 o número de investigados que colaboram com a Justiça em troca de redução de pena. O primeiro do grupo a falar foi o operador Mário Goes, que prestou depoimento anteontem à Polícia Federal e começou a revelar detalhes de sua atuação como intermediário do pagamento de propinas no esquema de corrupção investigado na Petrobras. Ele afirmou que repassava dinheiro de empreiteiras para funcionários da estatal por meio de contas na Suíça e que o PT era beneficiário da divisão da propina na diretoria de Serviços da estatal. Segundo Goes, o ex-gerente executivo de Engenharia e Serviços Pedro Barusco pediu para que ele destruísse documentos que citariam a existência de contas no exterior usadas no esquema.
Os nomes dos outros cinco delatores são mantidos em sigilo pelo Ministério Público Federal (MPF), mas a expectativa é que eles forneçam informações sobre o envolvimento de outros agentes públicos no esquema e a relação de mais contratos em que ocorria o pagamento de propina.
Em seu primeiro depoimento, Goes, dono da Riomarine, disse que fez repasses a Barusco por meio de suas contas Maranelle e Phad, no Banco Safra da Suíça. O dinheiro era desviado de contratos da Petrobras com empreiteiras como a Andrade Gutierrez. As comissões pagas a Barusco por Mário Goes eram divididas com o ex-diretor de Serviços da estatal Renato Duque e com o PT, segundo revelou Goes à força-tarefa da Lava-Jato.
- Barusco me disse que Duque gostava mais de jantares, cabendo a ele resolver as coisas (divisão de propinas). Ele disse isso na presença do (empresário) Ricardo Pessoa, da UTC. E me tranquilizou dizendo que haveria outras pessoas envolvidas no esquema e que o Partido dos Trabalhadores estaria dando algum tipo de suporte a essa atividade - disse Mário Goes.
O dinheiro que entrava na conta Maranelle, segundo Goes, era dividido em seis ou sete partes. Quando eram seis, duas iam para Duque, duas para Barusco e uma parte para ele próprio. A sexta parte era repartida no percentual de 60% para Barusco e 40% para Goes. Quando havia uma sétima parte, disse que não sabia a quem se destinava. Quanto ao dinheiro para o PT, responsável pela indicação de Duque para a diretoria da Petrobras, Goes disse que "Barusco dizia que era outra parte" e que "preferia nem saber do assunto".
A relação de Barusco e Goes começou no início dos anos 2000, quando o ex-gerente trabalhava na área de Produção da Petrobras. Ele procurou o operador para propor a divisão de propinas, mas o primeiro negócio não deu certo. A pareceria se efetivou nos anos de 2003 e 2004, quando Barusco passou a atuar como gerente executivo da diretoria de Serviços, dirigida por Duque.
Detalhes da operação na Suíça
A primeira operação feita por Goes com Barusco foi ligada ao Consórcio PRA-1, integrado pela Odebrecht e UTC, de acordo com o depoimento. Esse consórcio repassou, em 2004, R$ 1,53 milhão para a Jamp Engenheiros Associados, de Milton Pascowitch. Da parte da Jamp, R$ 1,4 milhão foi transferida para a empresa de consultoria do ex-ministro José Dirceu. O mesmo valor foi repassado para a Riomarine, de Mário Goes, que transferiu o dinheiro para a conta Maranelle na Suíça. Dessa conta, os valores iriam para Barusco e Duque.
A conta Maranelle foi aberta no Banco Safra da Suíça por Denise Kos, uma brasileira que morava naquele país europeu. Denise controlava os depósitos na conta e destruía os extratos. A conta, de acordo com Goes, recebeu recursos da construtora Andrade Gutierrez, por meio da Zagope, uma das empresas mantidas pelo grupo em Portugal.
A Zagope enviou US$ 6,4 milhões para outra off-shore controlada por Goes, a Phad Corporation. O operador confirmou ao MPF que "os serviços no contrato com a Zagope eram simulados". Esse montante também foi repassado para Barusco, na versão dada pelo operador e reproduzida em despacho do juiz Sérgio Moro, na decisão de ontem em que aceitou denúncia contra executivos da Andrade Gutierrez. A investigação da Lava-Jato mostrou que o ex-gerente da Petrobras recebeu da Andrade, ao todo, US$ 9,9 milhões de dólares, 2,6 milhões de francos suíços, 2,1 milhões de euros. Os repasses envolviam outros operadores, como Fernando Soares, o Baiano, e Alberto Youssef.
Também em depoimento, Mário Goes disse que o ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco possuía um controle das obras que gerenciava, dos pagamentos que deveria receber e das contas utilizadas para pagar propina. Os documentos foram destruídos ano passado, quando começaram as investigações de contratos da SBM com a Petrobras. Segundo o delator, Barusco "estava preocupado com o fato da investigação sobre a SBM ampliar-se para o Brasil e vir a atingir outras operações realizadas por ele."
Goes afirmou aos investigadores que teve seu primeiro contato com executivos da Andrade Gutierrez em 2006, quando Barusco pediu para cobrar uma propina que estava atrasada. Ele chegou a receber dinheiro vivo em casa de executivos da empreiteira. O novo delator diz que a decisão de pagar propina "se tratava de uma decisão empresarial". A parceria terminou em 2010 porque Goes, em suas palavras "estava cansado dessa atividade de ficar cobrando dívidas de Pedro Barusco".
No depoimento, Goes diz que era amigo de Barusco. A dupla comprou dois aviões em sociedade, e o operador chegou a apresentar a atual mulher de Barusco em um jantar na sua casa.
Preso no Paraná, Goes vinha dando sinais de que estava disposto a colaborar com as investigações. Além de reclamar de problemas na coluna e no intestino, chorou duas vezes ao prestar depoimentos ao juiz Sérgio Moro.
Ontem à noite, a revista Época publicou em seu site o nome que seria de um novo delator da Lava-Jato. Apontado pela publicação como o "maior lobista da Petrobras", Hamylon Padilha disse que fez depósitos em contas secretas no exterior para Nestor Cerveró e Jorge Zelada, ex-diretores da área internacional, Renato Duque e operadores políticos do PMDB. Ele cita o nome do empresário Raul Schmidt, sócio de Zelada e responsável por recolher as propinas em contratos para contratação de sondas.
Schmidt teve R$ 7 milhões bloqueados em 2 de julho, durante a 15ª fase da Operação Lava-Jato, que levou Zelada à prisão. A Justiça tem informação de que uma conta, a Atlas Asset S/A, está em nome de Zelada, mas tem Schmidt como beneficiário controlador. Schmidt seria responsável, ainda, por depósito, de US$ 2 milhões na conta da off-shore Milzart, controlada por Duque.
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