quarta-feira, 15 de julho de 2015

Senado ataca Lava-Jato após busca em casas de senadores

Senado reage à Lava-Jato

André de Souza, Cristiane Jungblut, Eduardo Bresciani, Evandro Éboli, Simone Iglesias e Vinicius Sassine - O Globo

• PF vasculha imóveis de Collor e outros senadores, e Renan diz que métodos "beiram a intimidação"

Escândalos na Petrobras

BRASÍLIA - Uma operação de busca e apreensão realizada pela Polícia Federal nas casas de três senadores da República, entre eles o ex-presidente Fernando Collor (PTB-AL), trouxe tensão ao Senado, na fase da Operação Lava-Jato que mais avançou sobre autoridades com foro privilegiado e que são investigadas no Supremo Tribunal Federal (STF). A ação levou o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), a fazer um protesto formal contra suposta intromissão no Legislativo. Collor atacou o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em discurso.

Com autorização de três ministros do STF - Teori Zavascki, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski -, policiais recolheram documentos em imóveis de Collor (PTB-AL); Ciro Nogueira (PI), presidente nacional do PP; e Fernando Bezerra (PSB-PE), ex-ministro da Integração Nacional. Alguns apartamentos visitados pertencem ao Senado.

Ao ser avisado das buscas, Renan se disse "perplexo", além de preocupado. A avaliação na cúpula do Senado foi de que a operação, realizada pela PF, um órgão do governo, conflagrou ainda mais a relação com a presidente Dilma. No momento da ação, Renan estava com Dilma discutindo votações no Senado.

Em nota lida no plenário, aprovada pela Mesa Diretora, Renan chamou de "invasão" a operação da PF, que para ele representou "uma violência contra as garantias constitucionais". Renan disse que os métodos utilizados pela PF "beiram a intimidação".

- Todos são obrigados a prestar esclarecimentos à Justiça, notadamente os homens públicos, já que nenhum cidadão está acima da lei. Entretanto, causa perplexidade alguns métodos que beiram a intimidação. Busca e apreensão nas dependências do Senado deverá ser acompanhada da Polícia Legislativa. São invasão - disse.

O líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), admitiu que a ação traz tensão ao Congresso Nacional. Guimarães disse que o assunto será tema da sessão da CPI da Petrobras, hoje, que ouvirá o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.

- Há grande expectativa (no depoimento de Cardozo) por conta da operação. Não deixa de trazer tensão política.

Solidariedade de Lula
No início da tarde, segundo aliados, Renan recebeu telefonema do ex-presidente Lula, que prestou solidariedade ao Senado. Para Renan, a Polícia Legislativa do Senado tem que acompanhar qualquer operação de busca e apreensão feita em instalações do Senado. A assessoria jurídica diz que há uma Resolução de 2014 que estabelece essa prerrogativa. Mas a Procuradoria da República e a PF sustentaram que não houve irregularidade na ação e que cumpriram mandados do STF.

A operação foi batizada de Politeia, em referência ao livro "A República", de Platão, que descreve uma cidade perfeita, de virtudes, onde a ética prevalece sobre a corrupção. Além de Teori Zavascki, relator dos inquéritos no STF, Lewandowski e Celso de Mello tomaram decisões já no plantão da Corte. Foram cumpridos 53 mandados em seis estados e no Distrito Federal. Foram apreendidos cerca de R$ 4 milhões em espécie, oito carros (cinco de luxo), obras de arte, joias, relógios, HDs, mídias e documentos.

"As medidas são necessárias ao esclarecimento dos fatos investigados no âmbito do STF, sendo que algumas se destinaram a garantir a apreensão de bens adquiridos com possível prática criminosa e outras a resguardar provas relevantes que poderiam ser destruídas", afirmou o procurador-geral, Rodrigo Janot, em nota sobre a operação.

Collor é investigado em inquérito no STF pelo suposto recebimento de recursos do doleiro Alberto Youssef e foi citado na delação premiada do empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC, como beneficiário de propina para que a empresa celebrasse contrato na BR Distribuidora. A PF cumpriu mandados de prisão na sua residência pessoal, a Casa da Dinda, no apartamento funcional e na sede da TV Gazeta, afiliada da TV Globo em Alagoas, que pertence à família.

Carros de luxo e milhões em espécie
Na Casa da Dinda, foram apreendidos três carros de luxo: Ferrari, Lamborghini e Porsche. Outros alvos da operação tinham ligação com o senador.

O cumprimento do mandado na residência de Collor provocou um bate-boca entre a PF e o Senado. A ação foi contestada pelo diretor da Polícia Legislativa do Senado, Pedro Ricardo Carvalho, e pelo advogado-geral da Casa, Alberto Cascais. Ambos foram até o prédio para requisitar que a diligência fosse cumprida pela Polícia Legislativa e não pela PF.

No caso de Bezerra, as investigações envolvem repasses para a campanha do ex-governador Eduardo Campos em 2010. A PF foi à residência do senador e, em Pernambuco, um aliado de seu grupo político também teve a resistência vasculhada. Ainda em Pernambuco, a PF foi às instalações do consórcio Ipojuca, na Refinaria de Abreu e Lima.

O presidente do PP, senador Ciro Nogueira, que teve a casa vasculhada, é investigado sob suspeita de ter recebido recursos desviados da Petrobras. O líder do PP na Câmara, Eduardo da Fonte (PE), também foi alvo. A PF vasculhou ainda as casas dos ex-deputados do PP Mário Negromonte e João Pizzolatti. A casa e o escritório do advogado Tiago Cedraz, filho do presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Aroldo Cedraz, também foram vasculhadas.

Collor fez um discurso inflamado na tribuna repleto de ataques a Rodrigo Janot, acusado de "orquestrar sordidamente o arrombamento" em suas casas.

- Hoje, eu fui submetido a um atroz constrangimento junto com minha família. (...) Podem me humilhar! Mas podem ter certeza: intimidado, jamais - discursou Collor para um plenário absolutamente silencioso. Não houve apartes.

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