Valor Econômico
• É possível, com 9%, arrastar-se no poder por três anos e meio
Um momento político grave no Brasil, este de hoje, sem perspectiva de solução a curto prazo devido ao agravamento da crise econômica mundial, suscita três perguntas que vêm sendo tratadas ora como já respondidas pela realidade dos fatos, ora como dúvidas cruéis: 1- Um presidente da República com um dígito de popularidade pode se recuperar ainda, inalteradas as condições que levaram a esse patamar? 2- Um presidente da República mantém-se no cargo por três anos e meio do seu mandato em banho-maria, até que chegue ao fim e as novas eleições criem a expectativa e a esperança de renovação? 3- Se afastada a presidente Dilma Rousseff agora, o maior beneficiado será mesmo o candidato preferencial do PT a presidente em 2018, Luiz Inácio Lula da Silva?
A começar pela terceira questão, isso é o que está sendo martelado nas mentes que lideram o Parlamento nos últimos 20 dias. O raciocínio é que, se afastada Dilma, ficando livre da responsabilidade pelo desastre do governo, o ex-presidente Lula teria mais de três anos para vitimizar-se país afora, em campanha eleitoral e oposição renhida ao governo que viesse a assumir, com uma chance imensa de recuperar sua imagem, biografia e eleitorado para 2018.
O cientista político e sociólogo Antonio Lavareda não crê nessa hipótese que está agora no topo das especulações. "Quando é que aconteceu algo assim? Um partido tão massacrado em episódios complicados, governo com crise econômica potencializada por indignação popular, moralidade pública, judiciário severo e tão contundente com os quadros do partido da Presidência?"
Pelo governo que vem sendo feito, considera o professor que "Lula é inelegível em 2018".
Mas a oposição o teme e é isso que alimenta a história. É que o ex-presidente já "sapateou" tanto sobre os adversários que "ele é o personagem central do pesadelo oposicionista brasileiro", afirma Lavareda. Continuam todos a temer Lula, seu jeito de fazer política, sua campanha de vale-tudo. Isso, avalia o sociólogo, já virou uma questão psicanalítica: "Não é real, é uma coisa mais para os políticos de oposição resolverem com seus psicólogos".
Porém, ele não afasta a tese de que uma saída precoce de Dilma possa ser benéfica para qualquer candidato do PT, principalmente os que disputarão prefeituras em 2016. "Se me disserem que o afastamento da Dilma seria bom para o Fernando Haddad em 2016, óbvio que seria. Uma coisa é ser candidato com as pessoas lembrando o que aconteceu com o governo Dilma há dois, três anos atrás, outra é ser candidato com a Dilma no poder e ainda por cima tendo que se valer de sua ajuda". Ainda nesse caso dos prefeitos, Lavareda enfatiza, a ausência ajuda mas " não resolve a vida". Ou seja, não é decisivo para a vitória ou derrota. O PT, na sua opinião, vai ser dizimado nas grandes cidades ano que vem com ou sem a Dilma no poder.
A atitude negativa da grande maioria da sociedade brasileira com relação ao PT, argumenta o sociólogo, é algo consolidado que para ser desfeito vai levar anos. "Não é assim, em dois anos, que os partidos se reerguem. Não é um truque".
Segundo Lavareda, do ponto de vista de opinião pública, prever o futuro, ou fazer prognósticos, exige um olhar para o passado. Como um mandatário se mantem no poder assim, tão mal?
Uma comparação - a única que lhe ocorre por coincidências de alguns poucos aspectos e muitas diferenças - é com o governo José Sarney, depois do Plano Cruzado 2. "O PMDB já sofreu, àquela época, o que o PT está sofrendo hoje", diz o cientista político. E se manteve no poder. É o mais próximo exemplo a servi à comparação.
"Hoje, o que a sociedade sentiu como estelionato eleitoral, também houve naquela época. Foram eleitos 25 governadores pemedebistas, duas semanas depois veio o Cruzado 2, que acabou com congelamento de preços, o PMDB começou numa trajetória de queda regular, permanente, intensa. A opinião publica removeu o partido das prefeituras das grandes cidades. Chegou a eleição de 89, o presidente com 9% e os candidatos dos partidos do governo aniquilados nas urnas". Com tudo isso - divórcio da sociedade, sentimento de logro - o governo se manteve até o fim. Portanto, é possível.
O que faz essa situação diferente da que atinge a presidente Dilma é que Sarney tinha uma sólida base parlamentar. "PMDB e PFL mantiveram a sustentação política no Congresso e davam a Sarney capacidade de resistência à opinião pública, à voz das ruas", argumenta o professor. Um presidente, diz, para se manter com uma popularidade tão baixa, precisa de um apoio político sólido. Não é o caso da presidente Dilma.
E há mais uma diferença importante, sobretudo hoje: a Internet, uma sociedade mais conectada, uma reação mais imediata, insatisfação popular que se manifesta, ações organizadas pelas redes sociais em minutos, uma pressão muito grande sobre os representantes políticos.
Para considerar apenas a história brasileira democrática recente, a situação de agora é dificílima. "Avaliação da presidente muito baixa, um partido que entra em curva descendente, a ausência de uma base parlamentar sólida", cita Lavareda. "É o PMDB daquele momento, junto com Sarney".
O PMDB já sofreu na pele estar divorciado da opinião publica, sendo acusado de estelionato eleitoral. Mas não havia, à época, um agravante de hoje: Sarney e o PMDB não eram alvo de uma operação como a Lava-Jato. "A Lava-Jato é uma coisa poderosamente diferente. Só potencializa a dificuldade da situação enfrentada por Dilma agora".
O único prognóstico razoável que dá para fazer é que a eleição de Lula em 2018 é difícil, assim como para o PMDB foi impossível sustentar o sucesso em 1994, pois a memória do que ocorreu com o partido no poder estava muito presente e era ruim. Como será com o PT, nesse vaticínio, com continuidade de Dilma ou sem continuidade de Dilma.
Uma autoridade da cúpula do PT não discorda completamente desse diagnóstico, mas faz uma importante ressalva: a análise sobre a situação do partido e do governo está correta, na perspectiva de a crise ficar como está ao longo dos próximos três anos e meio. PT e Dilma contam, porém, com a superação.
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