PMDB detecta coordenação política paralela no governo
Por Raymundo Costa - Valor Econômico
Brasília - Coadjuvante dos governos do PSDB e do PT há 25 anos, o PMDB prepara o bote para tentar voltar ao centro da cena, da qual se encontra afastado desde 1990, com o fim do governo José Sarney, um pemedebista acidental. Esse é o objetivo a ser atingido, seja pela via mais longa, na sucessão presidencial de 2018, ou pelo atalho do impeachment da presidente da República, assunto que já é tratado sem constrangimento por seus principais dirigentes, nas conversas de bastidor.
A relação entre as duas siglas piorou muito depois de o vice-presidente Michel Temer declarar que era preciso "alguém" para unir o país. No Palácio do Planalto, os ministros do PT - e até a própria Dilma, segundo algumas fontes - entenderam que Temer se habilitara ao cargo da presidente, praticamente dando a senha para o impeachment.
Temer conversou mais de uma vez com Dilma, com ministros e presidentes de partido, mas não convenceu nem encontrou quem quisesse ser convencido no Palácio do Planalto. A relação entre a titular e o vice está "degradada", segundo um assessor palaciano. E já vinha mal. Primeiro porque o vice não conseguia fazer cumprir os acordos acertados pelo ministro Eliseu Padilha, dublê de secretário da Aviação Civil e coordenador político do governo e um dos políticos mais próximos do vice. Segundo porque se descobriu uma coordenação paralela.
Os casos foram se empilhando sobre as mesas dos pemedebistas escalados para salvar a coordenação política do governo. Padilha, por exemplo, acertou com o PP a nomeação de um diretor do Banco do Nordeste indicado pelo ex-ministro Aguinaldo Silva (Cidades). No "Diário Oficial da União" apareceu um outro nome ligado a outro partido.
Temer acertou pessoalmente com o ministro Joaquim Levy (Fazenda) a liberação de R$ 10 milhões de emendas parlamentares ao Orçamento para os novos deputado eleitos em 2014. O Ministério do Planejamento se recusou a fornecer aos deputados a senha necessária para que eles pudessem inscrever as emendas no sistema orçamentário.
Com a decisão, o Erário deixou de pagar algo em torno de R$ 1 bilhão com o pagamento de emendas, segundo cálculos pemedebistas, mas deixou de arrecadar cerca de R$ 3 bilhões com o atraso da aprovação, na Câmara, da medida que onera a folha de pagamentos das empresas, numa rebelião acertada entre os deputados pelo WhatsApp.
Os ministros Patrus Ananias (Desenvolvimento Agrário) e Juca Ferreira (Cultura) ignoraram indicações políticas para o Incra e o Iphan, sem dar satisfações. Na última semana o caldo entornou quando Padilha acertou a liberação de R$ 500 milhões de restos a pagar de emendas parlamentares e a Fazenda mandou dizer que não havia dinheiro em caixa.
A situação ficou insustentável quando o PMDB foi informado de que havia uma verdadeira "coordenação política paralela" em curso. A presidente passara a receber parlamentares individualmente, em grupos e até comemorar aniversário de deputados, segundo informações chegadas à VPR, como é chamada a vice-presidência da República. Humilhação suprema: o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil) passara a dizer que havia críticas de deputados à coordenação política comandada por Temer e executada por Padilha.
Padilha decidiu que em setembro volta para a Aviação Civil. Temer quer fazer uma transição gradual, mas está sob pressão dos deputados e senadores do PMDB que já não veem salvação para o governo Dilma e querem se descolar do desgaste que causa aos candidatos a parceria com a presidente e o PT. Não fossem todos esses episódios, narrados na ótica pemedebista, o divórcio entre os dois partidos foi selado já no primeiro dia do segundo mandato do governo Dilma.
O motivo seria a suposta candidatura de Mercadante à Presidência da República, na sucessão de Dilma. Com esse objetivo, Mercadante tentou reduzir o papel do PMDB com a ajuda do ministro Gilberto Kassab (Cidades), presidente do PSD, e do ex-governador do Ceará Cid Gomes, hoje no PDT. Aos dois caberia cooptar deputados do PMDB. Simultaneamente, Mercadante tentou isolar a corrente majoritária do PT, a Construindo um Novo Brasil (CNB), a que pertence o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Foi um desastre que desorganizou inteiramente a base de sustentação do governo nas duas Casas do Congresso.
Na prática já existe uma separação programática do PMDB com o PT, que deve ser explicitada no programa de governo a ser lançado no dia 15 de novembro, feriado da Proclamação da República. Data escolhida a dedo para permitir que mais de 4 mil militantes pemedebistas estejam em Brasília para conhecer o programa e aprovar a proposta de uma candidatura própria em 2018 - vereadores, prefeitos, presidentes de diretórios municipais, estaduais, deputados estaduais e federais, senadores, governadores, todos com direito a voto.
À exceção da parte social, o programa do PMDB deve representar um verdadeiro desmonte do que foi a política econômica do governo do PT, pelo menos desde a crise de 2009. O congresso está sendo organizado pela Fundação Ulysses Guimarães, presidida pelo ex-governador do Rio Moreira Franco, outro nome, ao lado de Padilha, que integra o restrito grupo de conselheiros de Temer. Ele foi ministro de duas pastas do governo Dilma - Aviação Civil e a de Assuntos Estratégicos -, mas fala como um legítimo representante da oposição.
Segundo Moreira, o atual governo ameaça a estabilidade da moeda, conseguida após anos de inflação alta, praticamente destruiu a Lei de Responsabilidade Fiscal, impôs dificuldades à economia por motivos puramente ideológicos e escorregou feio na questão da ética. "O doutor Ulysses dizia: 'Não roubar, não deixar roubar e por na cadeia quem roubar'. O país quer e vai mudar. O PMDB vai implantar a Nova República com a qual sonhou Tancredo Neves, mas se frustrou com sua morte".
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