Por Andrea Jubé, Fabio Murakawa e Raphael Di Cunto - Valor Econômico
BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem, na reunião do diretório nacional do PT, que a "prioridade zero" do partido no Congresso Nacional deve ser concluir a votação do ajuste fiscal "para que o Brasil retome o crescimento". Crítico de Joaquim Levy, ele surpreendeu ao fazer uma defesa enfática do ministro da Fazenda. "Tem companheiro que fala 'fora Levy' com a mesma facilidade com que falávamos 'fora FMI'. Não é a mesma coisa", ressaltou.
Em discurso que se estendeu por mais de uma hora, Lula instou os petistas a barrarem o avanço do processo de impeachment na Câmara dos Deputados e ironizou a ação da Polícia Federal que atingiu um de seus filhos. "Tem denúncia contra o filho do Lula, contra o Lula, ainda tenho mais três filhos que não foram denunciados, sete netos e uma nora grávida", afirmou. Mas disse, em tom de desabafo: "não vai terminar nunca isso?"
Após a reunião, Lula confidenciou a interlocutores sua indignação com a intimação por agentes da PF de seu filho, Luís Cláudio Lula da Silva, investigado na Operação Zelotes, às 23 horas da noite de seu aniversário de 70 anos, na terça-feira.
A resolução do diretório afirma que Lula foi transformado em "alvo prioritário de armações" de núcleos da PF, do Ministério Público e do Judiciário e conclama a militância a defender o legado e o "papel histórico" do ex-presidente.
Num contraponto às críticas que tem feito em conversas reservadas à atuação do ministro Joaquim Levy na condução da política econômica, o ex-presidente fez uma defesa aberta do titular da Fazenda. Ele ponderou que o "programa de ajuste estava sendo feito antes do Levy [chegar ao governo]". O ex-presidente advertiu, contudo, que na atual crise política, a "prioridade zero do PT no Congresso é criar condições para aprovar as medidas da (presidente) Dilma de ajuste, para concluir isso" e permitir que o país retome o crescimento. "Não podemos passar mais seis meses discutindo ajuste e CPMF, temos que começar a votar amanhã", exortou.
Lula admitiu erros de avaliação do governo sobre a situação econômica do país, e também que Dilma venceu a eleição com um discurso, e depois o PT teve de fazer "o que dissemos que não íamos fazer". "Chegamos a uma situação [ruim na economia] em parte porque a tal da crise econômica internacional foi maior do que a gente calculava", disse Lula. "E em parte é porque demos em 2014 muito subsídio e desoneração, arrecadando menos do que a gente gasta. E temos que dar um jeito nisso."
Lula ponderou que há duas formas de levar o país de volta ao crescimento: elevando impostos - "mas é mais difícil" por causa da fragilidade política do governo -, ou por meio de uma política de crédito agressiva.
A resolução aprovada pelo diretório preserva Joaquim Levy e avaliza o esforço pela recriação do imposto sobre as movimentações financeiras, uma de suas bandeiras. "O Diretório Nacional considera extremamente positiva a proposta de reintrodução da CPMF, entre outras iniciativas governamentais que buscam reformar progressivamente o sistema de tributação e preservar os programas sociais estabelecidos desde 2003", diz o documento.
A resolução petista sobe o tom contra Cunha, mas o partido não se posiciona sobre o afastamento dele da presidência da Casa, alvo de denúncias de corrupção. "Depois de conquistada a presidência da Casa, o parlamentar rapidamente pactuou com o bloco PSDB-DEM-PPS e assumiu a liderança de uma agenda para contrarreformas, além de flertar com o impeachment presidencial.
No meio o dia, em almoço com representantes do PCdoB, no entanto, Lula criticou a postura petista em relação ao peemedebista. "O PT precisa decidir se quer governar o Brasil ou expulsar Eduardo Cunha", afirmou o ex-presidente, segundo o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), presente ao encontro.
Lula associa a instabilidade política na Câmara à liderança de Eduardo Cunha "sobre um grupo forte de deputados", mas atribuiu esse processo aos "insatisfeitos" com o PT. Ele alertou que o partido deve aprender a conviver com os aliados, mesmo com os de perfil conservador, porque precisa deles para formar maioria no Congresso e ganhar as eleições. "As divergências internas do PT não são menores que as que vemos do lado de fora, temos que ganhar as eleições com quem faz parte da nossa coalizão", aconselhou.
Lula disse ainda que é com os partidos aliados - "alguns até conservadores" -, que o PT tem de governar, construir maioria no Congresso e barrar a tentativa de golpe contra Dilma. "Não podemos permitir que discutam o impeachment sem base legal. Se a moda pega, qualquer um que perde a eleição entra com pedido de impeachment", alertou.
Lula advertiu que o PT pode surpreender os adversários nas eleições municipais e afirmou que o partido ainda tem chance de vencer o pleito em São Paulo, onde tentará reeleger o prefeito Fernando Haddad. Disse que o PT tem uma capacidade enorme de ressurgir das cinzas, "como uma Fênix", e que ele está acostumado a enfrentar adversidades. "Se o objetivo é truncar qualquer perspectiva de futuro, então, vão ser três anos de muita pancadaria, e pode ficar certo que eu vou sobreviver", avisou. Em entrevista coletiva, o presidente do PT, Rui Falcão, disse que Lula é o pré-candidato do partido à sucessão presidencial em 2018.
Mas o ex-presidente ressaltou que a prioridade no momento é recuperar a imagem do partido e de Dilma. "Acho que todos nós, ao invés de ficarmos tentando só ver defeito, temos que cada um de nós virar uma Dilma. E, se a gente ouvir alguém criticar, a gente tem que defender [a presidente]", pediu.
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