• As duas narrativas para a saída de Joaquim Levy
- Valor Econômico
Desde junho, quando o PT realizou um congresso em Salvador, seu presidente Rui Falcão defende mudanças na política econômica. Ainda assim o governo reagiu duramente a suas mais recentes críticas ao ministro Joaquim Levy (Fazenda) e à política de ajuste fiscal. Na realidade, Falcão tem servido de anteparo a ataques muito mais fortes e à esquerda em gestação nas profundezas do PT.
Em Estocolmo, na Suécia, Dilma traçou a risca de giz: "Eu acho que o presidente do PT pode ter a opinião que quiser, mas não é a opinião do governo", disse a presidente, em resposta a uma entrevista em que Falcão defende a saída de Levy, se o ministro não aceitar mudanças na política econômica. "A gente respeita a opinião do presidente do PT, mas isso não significa que seja a opinião do governo".
Segundo Dilma, como Falcão não reflete a opinião do governo, o fato é que Levy fica no cargo. E se o ministro fica "é porque concordamos com a política econômica dele".
Falcão avalia que o PT e sua base social ficaram satisfeitos com as críticas que desferiu ao ajuste fiscal, segundo afirmou a amigos. O presidente do PT tem evitado novas entrevistas, para não agravar mais um ambiente político já tumultuado. Mas quem fala com Rui entende que ele quer fazer gestos a fim de manter próximos os movimentos sociais. O PT tem de defender o governo, certo. Mas ele, Rui, não é governo, o que lhe dá certa liberdade de ação. O argumento é simples: o governo tem vários partidos, também, então às vezes ele precisa fazer distinções, não deve concordar com tudo.
No que tange à política econômica, a lógica que demarca os movimentos do presidente do PT pode ser resumida em uma pergunta: o ajuste fiscal acaba ou vai ficar por mais dois, três anos? Esse é o problema na visão petista. Há duas narrativas que podem ser construídas para a saída do ministro Joaquim Levy do governo. A primeira é que ele saiu porque foi incapaz de fazer ajuste. Na prática, isso significa que o ministro que entrar terá de dar continuidade ao arrocho. Não sinaliza nada para o futuro e não é bom para os planos eleitorais do PT.
A segunda narrativa é Levy concluiu o ajuste fiscal e o país vai entrar em uma outra etapa, portanto precisa ter um novo ministro. Mas para ser dito que o ajuste foi concluído Levy precisa apresentar algumas realizações, não podem ser apenas os cortes. É preciso aprovar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o projeto de Desvinculação das Receitas da União (DRU), o repatriamento de recursos e pelo menos iniciar a discussão para aprovar a CPMF no primeiro semestre. Esses seriam os tais pré-requisitos para o país ingressar em outra fase. Não é o "Fora Levy" pelo "Fora Levy". É Levy deve sair para dar para dar outra sinalização, não mais de ajuste, mas de retomada do crescimento.
Rui e a cúpula do PT se queixam de que a dinâmica interna do PT não tem sido bem compreendida. Da última vez que a Executiva Nacional do partido se reuniu, todas as suas tendências, à exceção da "Novo Rumo", "Movimento PT" e da "Construindo um Novo Brasil" (CNB), apresentaram uma proposta de resolução ultra-esquerdista contra o ajuste. Rui fez um texto de próprio punho que impôs por 11 a 4 na votação.
Quase todas essas mesmas tendências, tendo à frente a "Mensagem" e "O Trabalho" entregaram um documento agora propondo que o PT entrasse contra o deputado Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, mesmo já tramitando uma representação no Conselho de Ética. Também neste caso foi erguida uma barreira de proteção.
O argumento é que Eduardo Cunha, depois da revelação dos documentos sobre sua conta secreta em banco suíço, está numa situação cada dia mais insustentável. O PT deve deixar para se posicionar no Conselho de Ética, portanto. A expectativa de Rui é que neste caso, a exemplo do que aconteceu em relação a Joaquim Levy, "os caras não venham mais pra cima", como diz um amigo do presidente do partido. A direção do PT faz demarcação publica, pois não pretende agravar a situação e nem fazer resoluções esquerdizantes.
Com a presença confirmada de Lula, o PT fará uma reunião ampliada do Diretório Nacional, depois de amanhã, para dar a largada na campanha eleitoral de 2016. Falcão não gostaria de contaminar o encontro com a pauta negativa do governo, mas o partido não terá como evitar o debate econômico. Qual é o principal problema do ajuste às vésperas da eleição? O risco de elevar o desemprego para a faixa de dois dígitos. O PT espera que não chegue a isso, mas espera que sejam tomadas medidas para aliviar o arrocho. Pagar os atrasos do PAC, por exemplo.
Entende-se que isso ajuda a irrigar a economia no país inteiro. Uma coisa é a transposição do Rio São Francisco, PAC pesado, mas de efeito posterior e mais propagandístico. Já o Minha Casa Minha Vida ou um terminal rodoviário parado em uma capital por falta de recursos é discurso certo da oposição contra o prefeito, o governador ou a presidente. São essas coisas que o PT pretende pedir e "cutucar" o governo a ter como prioridade. "O governo tem que olhar para isso, o Nelson e o Levy têm que cuidar dessas coisas", disse Falcão numa roda de petistas.
O advogado Cristiano Zanin Martins, que assumiu a defesa de Luiz Claudio Lula da Silva na "Operação Zelotes", é genro do advogado Roberto Teixeira, amigo e compadre do ex-presidente Lula. Quando era sindicalista e nas suas primeiras tentativas de chegar à Presidência, o criminalista ao lado de Lula era o advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, defensor de presos políticos. Greenhalgh, que depois se elegeria deputado federal pelo PT, e Lula divergiram sobre o desfecho de uma causa, no final dos anos 1990, e o advogado Márcio Thomaz Bastos, que mais tarde viria a ser ministro da Justiça no governo do PT, passou a cuidar dos interesses do ex-presidente na esfera criminal. As boas bancas de Brasília sugerem que Lula deve reforçar urgente sua defesa.
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