Gustavo Patu – Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - "Valeria a pena pensar no social, mesmo que voltasse minimamente a inflação."
Assim falava Michel Temer (PMDB-SP), então presidente da Câmara dos Deputados, em junho de 1998 –quando o Executivo defendia o controle de gastos públicos, mais na teoria que na prática, para consolidar o Plano Real.
A declaração sintetiza o instinto político que se confunde com pensamento econômico na maior parte dos partidos do país: ampliar o amparo do Estado será sempre mais urgente do que conter a alta dos preços e outros obstáculos ao crescimento da renda nacional.
Agora que está diante de Temer a possibilidade de assumir um governo devastado pelo colapso das contas públicas, o PMDB quer apresentar um ideário diferente daquele que pautou sua prática desde a redemocratização.
"Uma Ponte para o Futuro", documento lançado pelo partido, é, se levado a sério, um rompimento com o passado e o presente.
Ali estão reunidas propostas que poucos candidatos a cargos eletivos ousariam defender em público –desvinculação entre os benefícios sociais e o salário mínimo; fim da regra de gastos mínimos em saúde e educação, aumento da idade mínima exigida para concessão de aposentadoria.
Também há teses redigidas ao gosto do mercado credor da dívida pública, caso da condenação a tentativas de reduzir os juros sem ajustar as contas do governo e controlar a inflação.
A relação entre a alta dos preços e a política social é muito diferente da exposta em 1998 pelo hoje vice-presidente: "Se, para manter o poder de compra dos que recebem rendas do Estado, deixamos a inflação fora de controle ou muito alta, estaremos penalizando a grande maioria da população".
DNA peemedebista
O partido procura se contrapor a ideias e políticas do governo Dilma Rousseff que levaram à atual crise econômica –e às quais não falta o DNA peemedebista.
"A expansão do gasto público na área das políticas sociais clássicas constitui uma exigência mínima de uma sociedade democrática", dizia o histórico documento "Esperança e Mudança", publicado em 1982 pelo PMDB.
Daquele texto constavam diretrizes social-democratas, desenvolvimentistas, protecionistas e inflacionistas que inspirariam a Constituição de 1988, a conduta do partido nas décadas seguintes e preferências arraigadas na classe dirigente nacional.
Em resumo, despesas sociais crescentes e com recursos reservados; reajustes do salário mínimo acima da inflação; tarefas para o poder público em áreas tão diferentes quanto o fomento à cultura e a proteção da indústria nacional.
Ali estava, por exemplo, a fixação de uma parcela mínima da receita federal reservada à educação, que acabou chegando ao texto constitucional. Neste ano, o Congresso estendeu a regra aos gastos com a saúde.
Em defesa de direitos e garantias há sindicatos, entidades, congressistas e militantes organizados.
A favor de reformas, só há a falta de dinheiro –que, diga-se, nunca foi tão evidente como agora.
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