Quando 8 homens conseguem fazer uma cidade como Paris refém do pânico e provocar 129 mortes e 350 feridos, sabe-se que os governos estão diante de um inimigo difícil de ser contido - fracamente coordenados, com células isoladas, tramando ações em guetos da periferia das grandes cidades e dispostos a tudo para atingir seus objetivos. Desde o assombroso ataque às Torres Gêmeas em setembro de 2001, o terrorismo conseguiu algum sucesso em causar destruição em massa. Após a sexta-feira 13 parisiense, autoridades francesas e inglesas disseram que a polícia tem feito progressos e conseguiu impedir 12 ações nos dois países. E, depois de 168 batidas policiais na capital e em cidades da França, foram capturados fuzis Kalachnikovs e até lança-foguetes, com três dezenas de suspeitos presos. São sintomas de uma corrente contínua de pessoas dedicadas à barbárie política e assassinatos em massa.
O Estado Islâmico é um herdeiro ainda mais radical da Al-Qaeda, matriz de grupos terroristas experimentados no laboratório de guerra do Afeganistão, contra a Rússia, muitos armados e treinados pelos EUA. O EI, ao contrário dos demais, que agem nas sombras e não têm endereço, hoje ocupa um território na Síria e Iraque, com duas cidades importantes como quartéis-generais, Raqqa e Mossul. Aproveitando-se de disputas sectárias insolúveis, como a perseguição do governo xiita iraquiano aos sunitas e a guerra cruel movida pelo tirano Bashar al-Assad contra os sunitas na Síria, o EI capturou áreas importantes dos dois países que lhe deu o que em geral falta a grupos terroristas, fontes relativamente estáveis de recursos financeiros.
Os fanáticos do EI coletam os destroços dos Estados do Oriente Médio desestabilizados pela invasão do Iraque, pela mudança da correlação de forças entre xiitas e sunitas com a derrubada de Saddam Hussein (e Muamar Kadhafi), e, em contraposição ao avanço dos grupos radicais xiitas apoiados pelo Irã, aliado precioso de Assad. Financiados e armados no início pela Arábia Saudita, a mais estável potência do Oriente Médio, os radicais do EI tem ódios óbvios. Na região, tendem a eliminar com crueldade seus rivais religiosos xiitas, como fizeram em atentado recente no Líbano, com 43 mortes. Fora dela, quer punir os imperialistas que invadiram Iraque e os atacam na Síria, como EUA, Reino Unido e França, entre outros.
Com as facilidades da tecnologia, o EI recruta soldados onde há indignação e revolta prontas para serem exploradas - nas periferias de cidades europeias, entre jovens muçulmanos não integrados, que perderam laços com seu país de origem sem criar outros nos países onde decidiram residir. É muito mais difícil para os órgãos de inteligência detectarem movimentos de inimigos "internos" do que radicais estrangeiros se movendo suspeitamente pelas fronteiras da Europa.
É esse grande potencial de recrutamento fora do Oriente Médio que torna a atual guerra ao terrorismo extraordinariamente complexa e impossível de ser ganha a curto prazo.
Ainda assim, reações estão sendo esboçadas, com possibilidades distintas de êxito. Potências ocidentais e Rússia apressaram a busca por uma saída política para a guerra civil síria, ao que tudo indica com a participação de Assad, forte o suficiente para permanecer no poder, fraco o suficiente para vencer o EI e oposição. Os ataques aéreos contra o EI e instalações petrolíferas em seu território já se intensificaram. A França ampliou o estado de emergência por três meses, enquanto que os serviços de inteligência do continente ganharam mais um estímulo para se coordenarem contra a ameaça comum. A guerra na Síria e conflitos no Norte da África provocaram uma migração sem precedentes para a Europa, o que facilita a entrada de terroristas assim como dificulta sua identificação.
É possível fazer mais para cortar a fonte de recursos financeiros a grupos terroristas, assim como restringir ao máximo a entrega de armas ao EI, já que EUA, Reino Unido e França são os maiores fabricantes e vendedores.
A força, porém, não substitui a política, que precisa ser decidida e inteligente para integrar minorias religiosas nas sociedades ocidentais. A exclusão é uma realidade na França e na Inglaterra, por exemplo, embora esses países sigam orientações diferentes, sem muito sucesso. Conter a escalada de violência no Oriente Médio parece ser impossível, mas impedir que ela se dissemine a partir dos subúrbios das metrópoles europeias é tarefa urgente e vital para as democracias sob ameaça.
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