terça-feira, 10 de maio de 2016

Fora de ordem - Míriam Leitão

- O Globo

As instituições estão falhando. Isso é o mais preocupante na decisão fora do tempo e da ordem tomada pelo deputado Waldir Maranhão, ontem. Foi apenas mais um evento, mas mostrou a fragilidade institucional brasileira. Um presidente interino da Câmara acha que pode tomar uma decisão solitária, sem ouvir os técnicos da Casa e a mesa diretora. É esta presunção que assusta.

Waldir Maranhão praticamente sequestrou a Câmara ontem e deixou o país inteiro na dúvida. A Câmara já havia sido incapaz de resolver o problema de ter um réu conduzindo os seus trabalhos. Foi necessária a interferência do Supremo Tribunal Federal para suspender o mandato do deputado Eduardo Cunha depois de seis meses de abusos e interferência no Conselho.

A decisão de Maranhão de interromper o processo de impeachment se refletiu imediatamente no mercado financeiro num dia em que a tendência era mesmo de alta do dólar e bolsa em queda, segundo o economista-chefe do Home Broker Modalmais, Alvaro Bandeira, por causa da queda dos índices chineses e das cotações do petróleo e do minério de ferro. Quando veio a notícia da suspensão do impeachment, o dólar disparou 4,9%, atingindo R$ 3,677, na máxima, e o índice Ibovespa chegou a cair 3,49%. Depois que ficou claro que a decisão seria revertida, os índices voltaram aos níveis do começo da manhã. Na visão do economista, essa volatilidade tem pouco impacto na economia real, e o Banco Central não chegou a fazer nenhum leilão para intervir no câmbio.

Não é importante mais um sobe e desce no mercado financeiro, mesmo provocando perdas a quem estivesse na ponta errada no momento do salto da cotação. Mas mostra, de novo, que o Brasil é o país onde tudo pode acontecer, inclusive alguém achar intempestivamente que nada valeu no longo processo de impeachment até agora, tentando parar tudo com uma manobra radical.

Durante todo esse processo, o país tem visto falhas institucionais. Deveria ter havido algum tipo de mecanismo para impedir que a presidente Dilma chegasse ao ponto que chegou nas pedaladas. Ela comprometeu mais de R$ 40 bilhões de fundos e de bancos públicos no ano eleitoral de 2014. A punição agora tem produzido todo o tipo de conflito político. Deveria ter havido ação preventiva. A Lei de Responsabilidade Fiscal diz que o governo não pode se endividar junto a bancos públicos e que não pode se endividar junto a banco algum — mesmo não sendo público — em ano eleitoral. Por que nada impediu que Dilma desrespeitasse esses dois artigos da lei fiscal no meio da campanha?

Mesmo agora, quando ela está no que podem ser seus últimos dias no Planalto, a presidente tem usado o poder restante para tomar decisões como se não houvesse amanhã. Na sexta-feira, enviou para o Congresso aumento de impostos, ontem apresentou proposta de criar mais cinco universidades. Dilma devia, por respeito mínimo às instituições que alega defender, deixar de tomar decisões ou de criar despesas para um período em que provavelmente não governará o Brasil

Com a espetaculosa decisão de ontem, o deputado Waldir Maranhão teve seus 15 minutos de glória e agradou ao governo. Além disso, vai alegar, quando for chamado para responder pelas suspeitas de ter recebido dinheiro de Alberto Youssef, que está sendo perseguido por este ato. O problema não é o deputado Maranhão, mas sim em que país e em que condições uma casa legislativa federal fica exposta a esse tipo de atitude. Era óbvio que a medida não iria adiante, mas o que importa mesmo é como foi que chegamos nesse ponto de desordem institucional.

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