Por Ricardo Mendonça e Cristiane Agostine – Valor Econômico
SÃO PAULO - Um antigo colaborador do PT, conhecedor das entranhas do partido, recorre a uma expressão bélica e dramática para sintetizar o que entende ser o principal desafio da legenda para o próximo período: "O importante agora é fazer uma retirada organizada das tropas", afirma. "Não deixar que isso se transforme em debandada. O PT deve recuar, se reorganizar e, após um certo prazo, voltar a campo. Isso é retirada organizada. Os rivais querem debandada, com mil divisões, exposição pública de brigas internas e até cassação do registro do partido."
No PT, a lista de infortúnios graúdos e inéditos nunca foi tão opulenta. Além da provável confirmação do impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff, há a delicada situação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, há meses na mira da Lava-Jato, o que poderá torná-lo inelegível; a prisão de alguns de seus mais importantes ex-dirigentes, como José Dirceu e o ex-tesoureiro João Vaccari; a rejeição recorde nas ruas; a perda de influência no âmbito da esquerda; a expectativa de revés sem precedentes nas urnas.
Os primeiros sinais da diminuição da sigla apareceram na lista de candidatos para as eleições deste ano. O PT deverá ter até 992 postulantes a prefeito no país, cerca de metade do que lançou em 2012. Se o desempenho dos inscritos for o mesmo de quatro anos atrás, um cenário considerado otimista, a votação nacional no partido cai pela metade. A tendência do PT, poucos discordam, é deixar de ser um partido grande e voltar a ser médio.
Algumas divisões politicamente graves ficaram evidentes no período recente. Menos de dez dias após Dilma encaminhar sua carta aos senadores defendendo a ideia de um plebiscito para convocação de eleições, a Executiva Nacional do PT a contrariou e, por 14 votos a 2, rejeitou endossar a proposta de plebiscito.
Outra divisão que ficou exposta foi quando parte da bancada apoiou o deputado Rodrigo Maia (DEM) no segundo turno da disputa pela presidência da Câmara. Adversário antigo do petismo, Maia foi um dos principais defensores do impeachment.
Ex-líder do governo Dilma, o deputado Arlindo Chinaglia (SP) vê um cenário desolador no pós-impeachment. Um dos principais problemas, diz, é a possibilidade de não serem feitas mudanças profundas nos rumos da sigla.
Para Chinaglia, há um engessamento na cúpula do PT que poderá ser mantido após o afastamento de Dilma. O grupo majoritário da sigla articula para que o núcleo político do governo derrotado, com nomes como os ex-ministros Ricardo Berzoini e Jaques Wagner, assumam cargos de comando no partido, o que, na sua avaliação, poderá fazer com que a crítica sobre o fracasso do governo fique em segundo plano.
Em entrevista ao Valor na semana passada, o ex-governador e ex-ministro Tarso Genro afirmou que o PT só tem salvação se abrir espaço para novos dirigentes.
Essa e outras discussões internas seriam discutidas em novembro, durante o encontro nacional do partido convocado pelo presidente da sigla, Rui Falcão, um dos poucos com bom trânsito em diferentes alas. Em decisão tomada na semana passada, o encontro foi adiado para março de 2017.
O mero adiamento potencializa desconfianças. Quem o defendeu, alegou necessidade de dar mais tempo para que, após as eleições municipais, as alas tenham melhores condições para se preparar. Uma parte dos que foram contra avalia que a mudança só foi feita porque o grupo interno majoritário estaria tendo dificuldades em suas posições, o que poderia enfraquecê-los no debate com outras tendências.
Entre as raras avaliações positivas que se faz no interior do PT, hoje, está a de que o partido acertou ao optar pela narrativa do golpe para explicar o processo político que resultou na ascensão do pemedebista Michel Temer à Presidência da República. Com eco em parcela da sociedade e no exterior, essa narrativa uniu militantes e simpatizantes e incomodou o novo governo.
A vitória de Dilma no Senado é tratada quase como peça de ficção no partido. Dadas as circunstâncias, em que todos contam com uma quase certa derrota nacional nas urnas, um triunfo do prefeito Fernando Haddad em São Paulo já é tratado como um cenário mágico por alguns petistas.
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