- Valor Econômico
• Mudança está na PEC aprovada pela Câmara na segunda
Uma mudança feita na proposta de emenda constitucional (PEC) que cria um teto para o gasto da União pode surpreender os parlamentares. O texto aprovado pela Câmara, na noite da segunda-feira passada, em primeiro turno, aumentou em um ano o prazo de congelamento, em termos reais, da despesa. Provavelmente, poucos deputados sabiam que estavam aprovando essa alteração, que alonga a restrição do novo regime fiscal.
A PEC 241 determina que, a partir de 2017, a despesa da União no exercício será aquela paga no ano anterior corrigida pela inflação medida pelo IPCA. Pela proposta original do governo, encaminhada ao Congresso no dia 15 de junho, o presidente da República poderia propor alteração nesse método de correção do limite do gasto para vigorar a partir do décimo exercício de vigência da emenda constitucional. Como a emenda do limite do gasto entrará em vigor no próximo ano, a mudança da regra valeria, portanto, a partir de 2027.
Na segunda-feira, no entanto, a Câmara votou outra coisa. O substitutivo apresentado pelo relator da PEC, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), alterou a redação desse dispositivo. Pelo substitutivo, o presidente da República poderá propor, a partir do décimo exercício da vigência do novo regime fiscal, uma alteração no método de correção do limite de gasto.
Assim, a mudança da regra só poderá entrar em vigor e servir de base para a elaboração do Orçamento da União, a partir do décimo-primeiro ano de vigência do novo regime fiscal. Ou seja, somente o Orçamento de 2028 poderá ser elaborado com as novas regras.
O prazo de congelamento da despesa, em termos reais, valerá, portanto, por pelo menos mais um ano. No texto original, a correção da despesa apenas pela inflação valeria por nove anos. Agora, de acordo com o substitutivo aprovado, valerá por, pelo menos, dez anos.
O mais surpreendente dessa alteração é que o relator enfrentou, por longo tempo, uma pressão bastante forte para reduzir o prazo de mudança do método de correção da despesa. Líderes políticos importantes da base aliada de Michel Temer na Câmara propuseram diminuir o prazo de nove para sete anos. A resistência do Ministério da Fazenda, contrário à medida, impediu que Perondi atendesse aos apelos dos seus colegas.
O relator tentou corrigir, no entanto, uma imprecisão da PEC original, pois na proposta enviada pelo governo não se definia um prazo para que o presidente da República propusesse a mudança na regra de correção do limite do gasto. Assim, o próximo presidente poderia propor uma nova regra, mesmo que ela só entrasse em vigor no décimo exercício de vigência da emenda. Nada impedia isso. Mas, ao corrigir esse defeito da PEC, o relator alongou o prazo de congelamento, em termos reais, da despesa da União.
Outra mudança feita por Perondi poderá aumentar o gasto real da União no próximo ano. Como vários economistas já explicaram, quando uma despesa é corrigida pela inflação passada, em período em que está ocorrendo uma queda acentuada do índice de preço, há aumento real do gasto. Isso ocorre porque o índice de correção utilizado para a despesa é maior do que a inflação projetada para o ano em curso.
No texto original da PEC, o governo estabeleceu que a despesa de 2017 seria a registrada em 2016 corrigida pelo IPCA de janeiro a dezembro deste ano. Mesmo com esse critério, já haveria um aumento real do gasto no próximo ano, pois a inflação projetada pelo mercado para 2017 é de 5,06%, de acordo com o boletim Focus, editado pelo Banco Central.
O substitutivo de Perondi alterou, no entanto, o critério de correção da despesa para 2017, ao propor que o gasto de 2016 seja corrigido por 7,2%, que era, há alguns meses, a inflação esperada para este ano. A última estimativa de inflação do mercado para 2016, no entanto, já está em 7,04%. Assim, o índice utilizado para corrigir a despesa de 2017 será, muito provavelmente, superior à inflação registrada neste ano.
Haverá, portanto, um aumento real ainda maior da despesa. Mesmo assim, a PEC poderá produzir um efeito positivo já no primeiro ano de sua vigência, pois o Produto Interno Bruto (PIB) poderá crescer acima da inflação.
Está ocorrendo um fenômeno que os economistas não sabem explicar: o deflator implícito do PIB está, há 20 anos, sendo maior do que o IPCA médio, com exceção de apenas três anos.
Nesse período, o deflator ficou 1,5 ponto percentual acima do IPCA médio. Nos últimos dez anos, ficou 2 pontos percentuais acima. Assim, se o IPCA médio ficar, como estima o governo, em 5,8% no próximo ano, o deflator do PIB vai variar entre 7,39% (se o deflator ficar 1,5 ponto percentual acima do IPCA) a 7,92% (se o deflator ficar em 2 pontos acima do IPCA). Além disso, é preciso considerar o crescimento real do PIB, estimado pelo governo em 1,6% no próximo ano.
Assim, a correção nominal do PIB poderá ficar entre 9,11% e 9,65%. Ou seja, mesmo com a correção da despesa em 7,2%, ela irá cair como proporção do PIB, pois o deflator será bem maior do que esse percentual. Isso significa que a PEC cumprirá a sua função, que é a de reduzir o gasto da União em relação ao PIB. Portanto, não está correta a afirmação de que a PEC, no curto prazo, será inócua ou de efeito insignificante. O que está correto é dizer que ela será muito rigorosa no médio e longo prazos. É claro que tudo isso depende de algo imponderável, que é a trajetória futura do deflator. Há, na área técnica, um gracejo que diz que "só o deflator salva".
Outra mudança promovida por Perondi no texto da PEC melhorou o controle sobre o gasto. Na proposta original, as sanções ao Poder que descumprisse o seu limite de despesa seriam aplicadas no exercício seguinte. Por entender que essa redação permitia que um determinado Poder descumprisse o seu limite, pois poderia ajustá-lo no exercício seguinte, o relator propôs que as sanções já sejam aplicadas de imediato e até o fim do exercício de retorno das despesas aos respectivos limites.
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