-Blog do Noblat
Li no jornal que um funcionário do Palácio do Planalto pendurou esta semana uma fotografia de Dilma Rousseff na galeria de ex-presidentes da República. Aconteceu logo depois que o plenário da Câmara dos Deputados aprovou por esmagadora maioria de 366 votos a 111 a proposta de emenda constitucional que estabelece um teto para os gastos públicos por 20 anos.
Foi uma vitória extraordinária do presidente Michel Temer, confirmando sua capacidade de liderança e a solidez da base governista. O feito foi muito bem recebido pelo mercado. Tão logo a PEC passe no Senado, a reação dos operadores econômicos deverá ser avalizar a política de redução da taxa de juros, providência que esfria a inflação e põe em funcionamento as engrenagens responsáveis pela retomada do crescimento.
As manchetes das mídias econômicas, incluídas as eletrônicas, imediatamente passaram a publicar declarações de empresários nacionais e estrangeiros afirmando que o Brasil voltara à mesa dos negócios. Isso significa que a cadeia que faz a economia trabalhar de forma sincronizada foi posta em marcha.
Claro que não se pode sair por aí usando indiscriminadamente o slogan das Organizações Tabajara – “seus problemas acabaram” –, do bom e velho Casseta & Planeta, mas é evidente que a estação mudou. Entramos na primavera, respira-se outro clima, há evidentes manifestações positivas pelo caminho.
Diante desse novo ambiente político e de negócios, é inevitável usar a imagem do retrato da ex-presidente fixado naquela galeria que registra o passado. Desde que ela se foi, há um mês e meio, sem deixar saudade sequer em seu partido, nunca mais se ouviu falar no nome Dilma. Nem bem, nem mal. Caiu no esquecimento. É como se jamais tivesse existido.
Poucas vezes na história recente, deste país ou de qualquer outro, um evento cortou o cotidiano de forma tão meteórica, e não se falou mais nisso. Ou, como disse certa vez Millôr Fernandes – acho que foi ele –, “sua ausência preencheu (de forma completa) uma grande lacuna”. Mas a vocação para o alto astral do país é tão grande que no lugar de lamentos rapidamente passaram-se a ouvir planos para o futuro, projetos de recomeço, saudações ao novo, encomendado e prometido pelos parceiros do Brasil.
Há quem pondere que o estrago feito é tão grande que a recuperação será lenta e sem garantia. São comuns as histórias de quem já viveu o mau tempo da economia no século passado argumentando que jamais houve uma crise como a de hoje – profunda, grave, demorada.
Em respeito aos mais velhos, contudo, tais depoimentos deveriam servir para prevenir o risco da recaída. Advertência de como é perigoso entregar o governo a quem quer aprender a governar no exercício do cargo. De como um erro no Executivo causa um dano que vai levar três anos para ser corrigido.
O gesto do funcionário palaciano que abriu este artigo me lembra o verso final do poema “Confidência do Itabirano”, de Carlos Drummond de Andrade, perfeito para ilustrar o Brasil traumatizado pelo PT: “Tive ouro, tive gado, tive fazendas. / Hoje sou funcionário público. / Itabira é apenas uma fotografia na parede. / Mas como doi!”
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Murillo de Aragão é cientista político
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