Em busca de dinheiro para tentar escapar de situação pré-falimentar, os Estados estão pressionando o governo federal por ajuda e, mais uma vez, recorrendo ao Supremo Tribunal Federal para conseguir mais recursos. O STF mandou a União depositar em juízo o dinheiro da multa referente à repatriação de recursos, cuja repartição os 23 Estados que foram à Justiça acreditam ter igualmente direito - pouco mais de R$ 4,4 bilhões. Os Estados já receberam igual quantia do IR dos recursos no exterior que foram declarados. Mas, como cavaram fundo o buraco das dívidas, ainda assim faltará dinheiro. O presidente Michel Temer parece disposto a ceder a algumas demandas estaduais, mas o espaço para isso é exíguo se a União quiser cumprir as metas fiscais.
Em uma decisão política, o presidente pediu à equipe econômica que encontre uma saída para que os Estados possam pagar o 13º salário do funcionalismo. Como o ministro da Fazenda não emite dinheiro e a União não deveria se sentir confortável com um déficit de R$ 170 bilhões no ano, só restaria aos Estados parcelar os salários ou enquadrar sua folha de pagamentos ao dinheiro disponível, demitindo funcionários. O tipo de mágica a ser encontrado para evitar protestos nos Estados definirá a força da intenção do governo em conduzir o aperto nas contas públicas prometido pela PEC 241, já aprovada na Câmara e em vias de ser votada no Senado.
A improvisação nessa questão é muito perigosa. Um dos motivos pelos quais o plano de estabilização brasileiro foi bem-sucedido e os vários planos da Argentina não, foi o controle dos gastos dos Estados. Os Estados fizeram uma grande renegociação de dívidas e foram proibidos de emitir títulos, após terem seus bancos privatizados. Sob a rédea da Lei de Responsabilidade Fiscal, o controle da União sobre a dívida dos Estados funcionou mais ou menos bem até o início do governo de Dilma Rousseff. O progressivo afrouxamento do rigor fiscal na União foi seguido pelos Estados e esse trabalho irresponsável mostrou agora sua real dimensão após três anos de recessão.
O Rio de Janeiro é um dos Estados em pior situação. Governadores do PMDB, o mesmo partido de Temer, não agiram para evitar a ruína financeira desencadeada em grande parte por suas políticas perdulárias. O rombo do Rio foi de R$ 2 bilhões em 2015 e agora chega a R$ 17,5 bilhões. É certo que as receitas diminuíram em todos os Estados e no Rio caiu de R$ 61,5 bilhões, antes da recessão (2013) para R$ 44 bilhões agora. Os royalties do petróleo, que serviram não de poupança para o futuro, mas para gastos correntes, sofreram um baque: de R$ 10 bilhões em 2014, para R$ 3,5 bilhões em 2016. E, mesmo com receitas já em queda, as renúncias fiscais foram de R$ 14,5 bilhões em 2014 e 2015.
O Rio sondou o Planalto sobre uma intervenção federal no Estado, via extrema para levar a União a um financiamento de emergência. Agora tenta as vias legais no STF e outras vias tortuosas. A ideia é obter crédito externo por meio da antecipação de receitas com os royalties. Mas o artigo 37 da LRF veda a "captação de recursos a título de antecipação de receita de tributo ou contribuição cujo fato gerador ainda não tenha ocorrido".
Para permitir ao Rio obter crédito externo, ademais em momento de grande volatilidade cambial, o Tesouro precisa dar seu aval e manda a boa prática que isso só ocorra quando há capacidade de pagamento do tomador. O Rio tem classificação de risco D pelo Tesouro, ou seja, grande chance de calote. Quando o ministro da Fazenda era Guido Mantega, operações de crédito externo foram aprovadas com ratings baixos. O ministro Henrique Meirelles, que vê no ajuste fiscal via PEC a âncora que fará ressurgir o crescimento e a credibilidade do país, e o presidente Temer, terão suas intenções de austeridade colocadas em xeque se abrirem este tipo de brechas para os Estados.
A União deveria exigir contrapartidas como as que está usando com a PEC 241 ou outras para conter gastos com a folha de pagamentos. Na concepção original, o dinheiro da repatriação seria usado para compensar alguns Estados pelas perdas que adviriam de um acordo para a reforma do ICMS. Não houve reforma, os Estados ganharam 20 anos para pagar dívidas, obtiveram um naco da repatriação, exigem mais e agora querem autorização para endividamento adicional. É preciso pôr limites ou o ajuste morre antes de existir.
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