- Folha de S. Paulo
Tempos nebulosos. O país mergulhado na maior crise de sua história recente. Os nervos à flor da pele. Desemprego batendo na porta de milhões de trabalhadores. Recessão profunda. Situação fiscal gravíssima. Juros estratosféricos. Investimentos, consumo e produção em queda. As vísceras da corrupção, sistêmica e institucionalizada, expostas a céu aberto.
Crises políticas recorrentes. As feridas do impeachment ainda não cicatrizadas. Tropeços e colisões marcam o relacionamento entre os Poderes da República. A temperatura na sociedade é crescente. A insatisfação popular é evidente. A intolerância e o sectarismo explodem nas ruas e nas redes sociais.
Enfim, a herança do sombrio ano de 2016 não é nada alvissareira.
A corrupção mina a confiança da população no sistema político, mas apenas ele pode produzir as decisões necessárias para tirar o país do atoleiro. Os espaços de diálogo e construção de consensos se estreitam. A Lava Jato configura-se como processo irreversível que está passando o país a limpo.
Ninguém deve tentar -nem conseguirá- controlá-lo, mas é fundamental que o sistema Judiciário esteja atento ao respeito aos princípios fundadores da democracia moderna e do Estado de Direito. Excessos e abusos devem ser banidos, sob pena de comprometerem a eficácia da operação.
Diante de tudo isso, resta a pergunta: o que fazer? Qual deve ser a ponte para o futuro?
A agenda que interessa à maioria da população é a retomada do desenvolvimento com a consequente geração de empregos, renda e bem-estar. Para isso, precisamos em 2017 promover os ajustes e as reformas necessárias.
O ajuste fiscal foi iniciado com a PEC que limita a expansão do gasto público, mas isso é pouco. São inadiáveis a inevitável reforma da Previdência, a modernização das relações de trabalho, a simplificação de nosso injusto e anacrônico sistema tributário e uma profunda reforma política que aproxime a sociedade de sua representação, diminua a influência do poder econômico e racionalize e modernize nosso sistema partidário.
Isso só será possível com um amplo diálogo nacional e a construção de um novo pacto político e social.
Não há outro caminho a não ser fortalecer o presidente Michel Temer e seu governo para que possam liderar a difícil travessia até as eleições de 2018, quando soberanamente a sociedade escolherá os novos rumos do país.
O governo Temer não se sustenta nas armas, no carisma populista de um líder ou nas urnas. Se legitimará e ganhará estabilidade pelo desempenho e resultados que produzir.
É preciso superar a instabilidade e a paralisia; de nada adianta pescar em águas turvas ou apagar o incêndio da crise com gasolina.
A ideia de antecipar as eleições presidenciais diretas, proposta na PEC de autoria do experiente deputado federal Miro Teixeira (Rede-RJ), é inadequada para o momento e não contribui para a solução dos desafios que temos pela frente.
O governo Temer é legítimo e ancorado nos princípios constitucionais. Apostar em seu fracasso é jogar contra o Brasil.
Se algum acidente de percurso ocorrer, no momento certo haverá a discussão de alternativas. Agora, no entanto, o interesse público e nacional demanda diálogo, responsabilidade, construção de consensos e ação transformadora.
A República corre riscos. Está em nossas mãos reinventar nossa democracia e recuperar a esperança perdida. Em tempos de turbulenta crise, é melhor seguir o conselho do sambista: "Faça como um velho marinheiro/ que durante o nevoeiro/ leva o barco devagar".
--------------
Marcus Pestana é deputado federal (PSDB-MG). Foi secretário de Estado de Saúde de Minas Gerais (governo Aécio Neves)
Nenhum comentário:
Postar um comentário