- Valor Econômico
• Na reconstrução, a militância quer saber de Lula
Primeiro a cair, o PT sai na frente também na tentativa de recuperar-se da tormenta que varreu a ética política na forma, conteúdo, critérios e senso tal como praticada até 2016. A reivenção partidária levará tempo, mas a agremiação que tem como presidente de honra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu numerosos primeiros passos. Tarefa inicial foi conter o desespero dos que sobraram da ação da Justiça e organizar um projeto de recuperação que começasse por retê-los no partido.
Entrou em hibernação a ideia, animada por um grande grupo ligado à corrente DS, liderada pelo ex-governador gaúcho Tarso Genro, de sair do partido que, inclusive, ele já presidiu. Bem como foram contidos os movimentos de mudança de nome do PT. Isso, já está provado, não funciona, a não ser para resgatar uma sigla histórica, e a saída para criar nova sigla pode esperar pelos resultados do trabalho que vem sendo desenvolvido. Etapa que poderia caracterizar-se como de início da reconstrução.
Por sinal, tem até nome: diálogo intinerante de ação petista (Diap). É um movimento que reune várias correntes e várias pessoas de cada uma delas, mas foi inspirado em ideia da corrente O Trabalho, à frente Marcos Sokol. Basicamente, nesta fase, alguns dos principais fundadores do partido saem pelo Brasil em palestras para militantes. Sob o título geral de "temas do PT", nesses encontros não há assunto vetado ou qualquer tipo de restrição para abordar os mais dolorosos, os que, mais do que envergonham, deixam mobilizados os militantes.
Esses encontros já foram feitos na capital de São Paulo, no interior do Estado, em Porto Alegre, Florianópolis, Recife. O advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, da corrente CNB, tem sido debatedor frequente a convite dos organizadores. Outros virão, pois já há convite para conduzirem a conversa com os petistas de Salvador, Teresina e Fortaleza.
Não há formalidade, o movimento é aberto e para dele participar basta ser petista. Há uma espécie de comissão de coordenação do Diap representada por Sokol.
O partido, que vinha do mensalão, da Lava-Jato e do impeachment, passou por uma eleição municipal catastrófica, perdeu mais de 50% de suas prefeituras, foi derrotado em São Paulo e a única cidade importante do Estado em que venceu foi Araraquara. Precisava fazer algo para não desaparecer, pois a DS, do ex-ministro José Eduardo Cardozo e de Tarso Genro, é uma das correntes prontas a debandar se nada for feito.
"O Diap não é um tribunal, um acerto de contas, uma procura de culpados", define Greenhalgh, que participou da maioria dos encontros realizados até agora. Todas as correntes do partido têm sua opinião sobre o quadro eleitoral que emergiu das urnas municipais e querem discutir, convencidas de que a DS não pode sair da legenda, é o PT que tem que mudar para a corrente ficar; o CNB não pode continuar na marcha em que vinha; a direção não deve renunciar, e uma porção de outras negativas. Iniciou-se a onda de discussão sobre a necessidade de fazer um congresso e, nele, eleger a nova direção,sem renúncias agora. E discutir, principalmente, a situação geral do partido, sem estar com a faca no pescoço ou pressionados por investigações ou eleições conjunturais.
A DS e outras correntes estão muito direcionadas pelo Rio Grande do Sul, com a atuação de Olívio Dutra, Raul Pont, Henrique Fontana, Tarso Genro, Pepe Vargas. Junto com o pessoal de São Paulo mais ligado a Arlindo Chinaglia, Paulo Teixeira, José Eduardo Cardozo, constituiu-se o Muda PT para medir forças com o CNB. Nesse embate, o ex-presidente Lula interveio para mostrar que a hora não é boa para brigas. Unidos, marcaram o Congresso para abril, os ânimos serenaram um pouco e foi possível até iniciar a preparação de teses para a reunião nacional.
Ora o Muda PT faz reuniões separadas, como uma, em Brasília, no início de dezembro, ora a CNB se isola, como a de São Paulo em meados de dezembro, mas o compromisso de todos é o Diap. Discute-se conjuntura: reforma política, governo Temer, Lava-jato.
Os temas não são muito diferentes daqueles que a sociedade petista quer debater nos encontros do Diap. Os militantes questionam o resultado eleitoral, a Lava-Jato, o que chamam de "criminalização" dos movimentos sociais, a transferência de decisões e legislação político-eleitoral para o Judiciário.
Segundo Luiz Eduardo Greenhalgh, bastante envolvido nesse início de reconstrução partidária, o debate é aberto e, só na reunião de Porto Alegre, havia três fundadores do PT, o presidente da CUT estadual e um vereador de Canoas. O de Florianópolis foi num sábado e o organizador, o sindicato dos servidores públicos, convidou 130 militantes. "Vimos absoluta desinformação, falta de comunicação entre as direções e a base", diz, apontando o estado de perplexidade da outrora segura militância.
Há um grupo de dirigentes, mais ligado ao Muda, que gosta da ideia de retomar a formação de uma frente política de esquerda, com PCdoB, Psol, PSTU, PSB, PDT, movimentos dos Sem Terra e Sem Teto, "para enfrentar o avanço da direita, do fascismo", assinala Greenhalgh. Talvez essa seja uma deliberação para o congresso.
"Há, no partido, a convicção de que estamos no regime de exceção, com o fortalecimento de teses fascistas e o cerco e aniquilamento do PT", diz o advogado e ex-deputado, um dos mais convidados a responder perguntas, entre outras razões, por sua atuação no partido e em defesa de presos políticos no período da ditadura militar. "O PT acreditou que a burguesia iria respeitar as regras da democracia liberal. Ingenuidade do PT", afirma.
Bem, ao fim, fica clara o que é a informação mais preciosa que todos buscam nesse início de reconstrução. Os militantes querem saber até onde vai a Lava-Jato e a situação de Lula, o presidente de honra do partido, ex-presidente de dois mandatos e sempre candidato do PT. A pergunta recorrente é se ele vai poder se candidatar ou não em 2018. "O candidato é o Lula, o PT não tem plano B", responde Greenhalgh.
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