- Valor Econômico
• Indicação de novo ministro repercute além da Lava-Jato
Temer vai esperar o Supremo escolher o relator do processo da Lava-Jato porque está impedido de indicar imediatamente o sucessor de Teori Zavascki, morto em acidente aéreo, na quinta-feira. Nada de astúcia ou esperteza política. Se escolhesse alguém com o mesmo perfil de Teori, louvado por sua isenção e conhecimento técnico, o presidente seria questionado. Afinal, ele está citado nas delações da Odebrecht. Desde interino, Temer se equilibra na corda bamba.
A batata quente agora está nas mãos do Supremo Tribunal Federal, que nos últimos tempos se acostumou a jogá-la nas mãos dos outros Poderes - Executivo e Legislativo. Pode ser um momento de inflexão no STF. Principalmente se a ministra Cármen Lúcia, presidente da suprema corte, conduzir com êxito as negociações internas para a designação de um novo relator. Ultimamente, os ministros do Supremo somente costumam entrar em acordo quando se trata de avançar sobre território dos outros dois Poderes.
A morte do ministro Teori serviu para o Supremo perceber que não é imune à crise, o tribunal também está no olho do furacão. Prova disso são as especulações que ficaram registradas sobre a amizade de Teori com um empresário que frequentava os arrebaldes da Operação Lava-Jato e estava enrolado em processos que poderiam cair nas mãos do próprio ministro. O infortúnio de Sérgio Cabral começou em 2011, quando a queda de um helicóptero na Bahia, além de uma grande tragédia familiar, expôs as relações do governador do Rio com Fernando Cavendish, da Delta.
Se Temer não vai fazer nada antes de o Supremo indicar um relator, cabe à Cármen Lúcia encaminhar uma saída capaz de unir o STF. Não é tarefa fácil, como pode perceber diante da reação a que ela mesma fizesse, rapidamente, a homologação das delações da Odebrecht. A ministra poderia ganhar o aplauso da opinião pública, mas provavelmente aprofundaria a instabilidade na qual se equilibra o governo e o racha na suprema corte. O STF, certamente, não quer ser responsável pelo recrudescimento de uma crise na economia. A proposta, pelo menos por enquanto, parece deixada de lado.
A escolha poderia se dar entre os quatro ministros remanescentes da 2ª Turma, a qual integrava Teori. Os ministros Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, por seus vínculos passados com o PT, partido no centro da Lava-Jato, estariam em princípio de fora. E nem reivindicam a função, assim como Gilmar Mendes, cujas ideias sobre procedimentos da Lava-Jato são bastante claras. Restaria o ministro Celso de Mello, que é o decano da Corte, nome que não deveria provocar maiores restrições. Também não quer, aparentemente, mas pode ser convencido. Além disso, já é o revisor de Turma do processo da Lava-Jato.
O ministro Luiz Fachin estaria disposto a trocar a 1ª pela 2ª Turma, habilitando-se, assim, a herdar os processos de Teori. Já o ministro Luís Barroso é o revisor de plenário do processo da Lava-Jato, mas não estaria disposto a deixar a 1ª Turma, onde brilha com intensidade. A ministra Rosa Weber, que teve Sergio Moro como juiz auxiliar no julgamento da ação do mensalão, também é citada nas conversas sobre troca de Turmas. É um nome que desagrada setores do governo e também não causa entusiasmo entre alguns colegas.
Na realidade, qualquer ministro integrante da 1ª Turma pode demandar a troca, mas nem todos são capazes de levar ao consenso. O ex-ministro do STF Ayres Brito, que esteve recentemente com Temer, sugere que a escolha seja feita por sorteio entre os nove ministros do Supremo. Em caso de acordo, tanto na Turma como entre os nove, o ministro sorteado sempre poderá recusar a função, até se chegar ao nome de consenso. No desacordo, alguém terá de engolir o resultado do sorteio, mas a escolha terá sido aleatória. Já vão longe as histórias da "bolinha gelada" no sorteio de nomes.
O outro lado da moeda é a escolha que Michel Temer fará para o lugar de Teori Zavascki. Ela vai além da Lava-Jato e deve colocar em perspectiva questões como o aborto e a prisão de pessoas condenadas em segunda instância, sentença que se formou no Supremo Tribunal Federal com o voto do ministro Teori.
Assentada num voto histórico do ministro Luís Roberto Barroso, a 1ª Turma do STF já decidiu descriminalizar o aborto até o terceiro mês de gestação. Agora, católicos e evangélicos, as bancadas cristãs no Congresso, se articulam nos bastidores para impedir a indicação de um ministro favorável à tese. Não é à toa que nomes ligados às alas mais conservadoras da Igreja Católica aparecem no topo das listas de candidatos bem cotados para a vaga no STF.
É no Congresso também que se articula a escolha de um nome contrário à prisão de condenados em segunda instância, o que sem dúvida levou muitos investigados pela Lava-Jato a fazer a delação premiada. O ex-senador Sergio Machado disse isso com todas as letras em sua delação. Em dez anos, a defesa do ex-senador Luiz Estevão (DF) entrou com 34 recursos para protelar sua prisão. Devido à decisão do Supremo, considerada um avanço na luta contra a impunidade, Estevão está na cadeia.
Se o Supremo se entender em relação à escolha do novo relator da Lava-Jato, é possível que o tribunal entre em uma nova fase, com menos intromissão em outros Poderes, mais voltada para a interpretação da Constituição em questões que hoje dividem o país, como o aborto.
Reforma ministerial
Prevista para fevereiro, depois das eleições para as presidências do Senado e da Câmara, a reforma ministerial pode ser limitada a um ou outro nome. A razão é simples: o atual arranjo político-partidário tem garantido a aprovação dos projetos de interesse do governo no Congresso por maiorias amplas. Mexer, portanto, poderia desarrumar a base de sustentação, que vem dando conta do recado. A reforma deve ser maior ou menor dependendo do estrago que for provocado pelas eleições para as Mesas.
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