Laudo sobre conversa entre Temer e Joesley será entregue ao Supremo
Áudio tem interrupções causadas pelo gravador, mas não há sinais de manipulação; defesa de Temer, que contratara perito para contestar autenticidade, agora diz que laudo ‘não é verdade absoluta’
Laudo do Instituto Nacional de Criminalística, da PF, concluiu que não houve edição na gravação da conversa entre o presidente Temer e Joesley Batista, dono da JBS. Segundo os peritos da PF, há cerca de 200 interrupções no áudio, mas elas foram provocadas pelo gravador usado pelo empresário. A gravação é íntegra e sem adulteração, concluíram. A defesa de Temer argumentou que o laudo “não é uma verdade absoluta”. Antes, o perito Ricardo Molina, contratado pelo presidente, afirmara haver 50 ou 60 “pontos de obscuridade” na gravação. O laudo da PF será anexado ao inquérito em que Temer é investigado por obstrução de Justiça. A PF já entregou ao ministro Fachin relatório preliminar atribuindo ao presidente o crime de corrupção passiva. O procurador Rodrigo Janot deve apresentar denúncia contra ele na segunda-feira.
Áudio sem edição
Laudo da PF confirma que não houve adulteração do diálogo entre Temer e Joesley
Jailton de Carvalho, O Globo
-BRASÍLIA- Laudo do Instituto Nacional de Criminalística (INC), vinculado à Polícia Federal, informa que não houve edição do diálogo entre o presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista, da JBS, segundo disse ao GLOBO uma fonte que acompanha o caso de perto. A perícia derruba a principal estratégia da defesa de Temer que, até então, buscava dizer que foram feitos cortes e houve manipulação de trechos da conversa gravada por Joesley.
A gravação é um dos fundamentos da delação de Joesley contra Temer, o ex-assessor Rodrigo Rocha Loures e outras pessoas ligadas ao presidente. Temer e Loures são investigados por corrupção, organização criminosa e obstrução à Justiça. O laudo foi concluído ontem à tarde pelo INC. Na segunda-feira, o documento deverá ser anexado ao segundo relatório das investigações sobre Temer e enviado ao STF.
Ainda não está claro se haverá tempo suficiente para a inclusão do documento na denúncia que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, fará contra Temer. No laudo, os peritos apontam a existência de aproximadamente 200 interrupções na gravação, mas deixam claro que não houve edição para adulterar o diálogo, conforme insinuava a defesa do presidente. As “descontinuidades” seriam consequência das características técnicas do gravador usado na conversa.
Advogado de Temer, Antonio Claudio Mariz de Oliveira disse ao G1 que ainda precisa conhecer a perícia, mas argumentou que não é uma análise definitiva.
“Mas posso adiantar que laudo não é uma verdade absoluta. Se existe um laudo dizendo que não houve manipulação, existem outros três dizendo que houve. É uma questão de análise e de julgamento final da autoridade responsável. E essa prova está sendo contestada sob outros aspectos, principalmente sobre a licitude”, disse Mariz.
O gravador tem um microfone sensível ao som ambiente. O equipamento é acionado automaticamente pela emissão de sons, especialmente da voz humana. Da mesma forma, deixa de funcionar, ou funciona em um ritmo mais lento, na ausência de sons. Isso explicaria inclusive por que a íntegra da gravação teria aproximadamente cinco minutos a menos do que a programação da CBN, registrada por Joesley na chegada e na saída no Palácio do Jaburu, na noite da conversa.
EQUIPE TEVE 15 ESPECIALISTAS
Pelo menos 15 peritos teriam trabalhado na análise da gravação e do gravador durante os últimos 30 dias. Para cumprir o prazo estabelecido inicialmente e, ao mesmo tempo, fazer um laudo incisivo, os profissionais trabalharam até mesmo durantes os fins de semana. No início do caso, o perito Ricardo Molina, contratado pela defesa de Temer, disse que a gravação continha interrupções e seria “imprestável” como prova judicial.
Joesley gravou a conversa com Temer na noite de 7 de março, no porão do Palácio do Jaburu. Depois de entrar na residência oficial sem se identificar, uma manobra acertada previamente com Loures, o dono da JBS discorre longamente com Temer sobre a manipulação de dois juízes federais e o pagamento de propina ao ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e ao doleiro Lúcio Bolonha Funaro.
O suborno sistemático seria uma forma de impedir que os dois fizessem acordo de delação. Depois de ouvir o empresário, Temer diz: “Tem que manter isso. Viu?”. Na sequência do diálogo, Joesley diz ainda que, com o ex-ministro Geddel Vieira Lima fora de circulação, precisaria de um novo interlocutor. Temer indica o ex-assessor Rocha Loures que, naquele momento, ocupava uma vaga de deputado federal.
O empresário pergunta, então, se poderia tratar de “tudo” com Loures. “Tudo”, respondeu Temer. Munido da gravação e outros documentos, Joesley fez um acordo de delação premiada para delatar Temer e Loures, entre outros políticos. Depois da conversa de Temer com Joesley, Loures entrou em cena, tratou de decisões e cargos estratégicos do governo federal com o empresário e, não demorou muito, acabou sendo filmado correndo pelas ruas de São Paulo com uma mala com R$ 500 mil recebida de Ricardo Saud, operador da propina da JBS.
O repasse seria a primeira parcela de um suborno que, ao longo de 25 anos, ultrapassaria a casa dos R$ 600 milhões. No início deste mês, Loures foi preso pela Polícia Federal e, logo em seguida, devolveu o dinheiro. Em depoimento ao Ministério Público Federal, Saud disse que os recursos seriam para Temer. Interrogado pela Polícia Federal, Joesley reafirmou que o dinheiro seria para o grupo de Temer. A perícia é importante, mas não chega a ser considerada essencial pela Procuradoria-Geral da República.
RELATÓRIO DEVE CITAR OBSTRUÇÃO À JUSTIÇA
Para investigadores, outras provas já seriam suficientes para oferecer denúncia contra Temer e Loures. No primeiro relatório do caso, entregue ao STF no início desta semana, a PF informa que os indícios permitem enquadrar Temer e o ex-assessor no crime de corrupção. No segundo relatório, que deve apresentar na segunda-feira, a polícia deverá dizer se existem provas de que Temer também incorreu em obstrução à Justiça e organização criminosa.
A se confirmar as expectativas, esta será a primeira vez na História do país que um presidente da República será alvo de uma denúncia criminal em pleno exercício do cargo. Pela lei, a denúncia deve ser aprovada por pelo menos dois terços dos 513 deputados federais. Neste caso, o presidente seria afastado do cargo por 180 dias. Caso contrário, as investigações seriam suspensas e só poderiam ser retomadas depois de terminado o mandato do presidente.
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