Por Daniel Rittner, Andrea Jubé e Maíra Magro | Valor Econômico
BRASÍLIA - O roteiro de sobrevivência traçado pelo presidente Michel Temer envolve duas estratégias - uma jurídica e outra política - para se livrar das ameaças nos tribunais e defender sua continuidade no Palácio do Planalto.
No âmbito jurídico, ele pretende argumentar que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) só permitiria o uso de gravações presenciais de conversas, sem autorização judicial, com o objetivo de inocentar seus autores, mas nunca para punir o interlocutor gravado. Também prepara a argumentação de que o empresário Joesley Batista demonstrou, na conversa ocorrida em 7 de março no Palácio do Jaburu, fracasso em suas tentativas de influenciar o governo Temer.
Conforme lembram assessores presidenciais, o próprio Joesley diz no áudio que se trata do primeiro encontro com o pemedebista após sua posse. Ele ainda fez queixas explícitas sobre o Ministério da Fazenda, a Receita Federal e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) - entre essas reclamações estava a negativa de transferência da sede fiscal do grupo JBS para a Irlanda.
Além disso, partindo da premissa de que Temer foi gravado antes do acordo de colaboração premiada entre o empresário e o Ministério Público Federal (MPF), a defesa alegará que o áudio não pode ser usado como prova. Como a própria gravação estaria prejudicada e teria influenciado o fechamento da delação, a defesa deve alegar que essa prova contaminaria o restante do conteúdo do acordo - independentemente dos resultados de sua perícia.
No plano político, o Planalto está decidido a colocar em votação a reforma da Previdência entre o fim de junho e o início de julho, antes do recesso parlamentar. A ideia é votá-la logo após uma esperada vitória no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) - interlocutores de Temer ainda apostam em um placar favorável de 4 a 3 - ou enquanto um dos ministros estuda o processo depois de eventual pedido de vista. Com isso, pretende-se demonstrar que Temer ainda tem força no Congresso Nacional e é o mais habilitado para aprovar as reformas.
O núcleo político do governo, no entanto, reconhece que há mais dificuldades para aprovar as mudanças na Previdência e isso poderá acarretar novas concessões. Já se admite aprovar uma reforma mantendo o Benefício de Prestação Continuada (BPC) da forma como está hoje, alterar a idade para aposentadoria rural e incluir agentes penitenciários nos regimes especiais.
Auxiliares diretos de Temer estão convencidos hoje de que Rodrigo Rocha Loures não fará delação premiada. O presidente já descartou, a interlocutores próximos, nomear um deputado do PMDB paranaense como ministro apenas para manter o mandato de deputado federal do ex-assessor - e consequentemente o foro privilegiado. Temer resolver deixar o secretário-executivo do Ministério da Transparência, Wagner de Campos Rosário, como titular da pasta por tempo indeterminado.
Na avaliação do governo, Temer tem conseguido se afastar progressivamente do auge da crise política e começa a reaglutinar forças para votações importantes no Congresso Nacional.
É grande, por exemplo, a expectativa do Planalto para aprovar a reforma trabalhista no Senado, na próxima semana. Sua votação na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) estava prevista para anteontem, mas foi adiada em acordo com a oposição.
No campo jurídico, segundo especialistas, os argumentos do governo poderão gerar a discussão do chamado "fruto da árvore envenenada" - teoria, originada no Direito americano, segundo a qual todas as provas decorrentes de uma descoberta ocorrida por meio ilícito devem ser descartadas do processo penal, por serem consideradas "ilícitas por derivação".
Assim, se a gravação de Temer for considerada inválida, poderia-se alegar que as demais provas envolvendo o presidente deveriam ser descartadas, por terem sido obtidas em delação supostamente fechada com base na gravação.
A PGR defende, por sua vez, que a gravação é totalmente legítima e, além do mais, não seria a única prova contra Temer. Mas, devido aos questionamentos levantados pela defesa, procuradores devem elaborar a denúncia contra o presidente dando destaque a outras evidências além do conteúdo do aúdio apresentado por Joesley. A avaliação de procuradores é de que as evidências contra o presidente seriam vastas o suficiente para sustentar uma acusação mesmo sem o conteúdo do áudio.
Procurado pelo Valor, o advogado de Temer, Antonio Claudio Mariz de Oliveira, disse que a defesa está focada neste momento na contestação da legalidade e da legitimidade do áudio apresentado por Joesley, verificando se foi ou não objeto de edições. Ele afirmou que é preciso aguardar o resultado da perícia técnica solicitada pelo STF para comentar qualquer estratégia jurídica.
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