Por Raphael Di Cunto, Marcelo Ribeiro, Andrea Jubé e Bruno Peres | Valor Econômico
BRASÍLIA - Situação e oposição concordam que o presidente Michel Temer tem os votos necessários para barrar a denúncia de corrupção que poderá ser votada amanhã contra ele na Câmara. A denúncia só seguirá para julgamento no STF se contar com 342 dos 513 deputados. A oposição tenta agora mostrar a "fragilidade do governo", o que deve ocorrer se os votos contra a acusação forem inferiores à metade da Câmara.
O placar é motivo de preocupação entre governistas. Temer confia ter os votos necessários, mas receia expor um encolhimento da base, hoje insuficiente para aprovar a reforma da Previdência. A oposição diverge sobre a melhor estratégia. A cúpula do PT quer votar amanhã e planejava ontem liberar o registro de presença para começar a sessão. Rede e PSB defendem votar amanhã, mas só marcar presença quando a base colocar pelo menos 257 deputados em plenário.
Oposição chega dividida à votação de denúncia contra Temer
Num jogo de empurra entre a base do governo e a oposição, a Câmara dos Deputados chega na véspera da sessão marcada para votar o pedido de autorização para que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue se o presidente Michel Temer cometeu o crime de corrupção passiva ainda sem a certeza de que a denúncia da Procuradoria-Geral da República será realmente analisada amanhã.
Ambos os lados concordam que Temer possui hoje os votos necessários para barrar a denúncia - que só seguirá para análise do STF se contar com 342 dos 513 votos a favor. O jogo da oposição, agora, é tentar mostrar a "fragilidade do governo", o que, no entendimento dos favoráveis ao afastamento do pemedebista, ocorrerá se os votos contra a acusação forem inferiores à metade da Câmara ou se não houver quórum para deliberação.
A oposição diverge sobre a melhor estratégia. A cúpula do PT quer votar amanhã e planejava ontem liberar o registro de presença para começar a sessão. Já Rede e PSB defendem votar amanhã, mas só dar presença quando a base colocar pelo menos 257 deputados em plenário, número exigido para encerrar a fase de discursos, mas insuficiente para a votação nominal. O Psol, por sua vez, é a favor de empurrar para outro dia com o objetivo de ampliar o desgaste de Temer.
O apoio de pelo menos 257 deputados é o mínimo para aprovar projetos mais substanciais. Um número superior sinalizaria que, apesar de uma base menor que os quase 400 deputados do início do mandato - ou 366 obtidos para aprovar o Teto de Gastos-, ainda há governabilidade suficiente para tocar os projetos do governo. Por outro lado, menos que 257 mostraria dificuldade de votar agenda econômica mínima no Legislativo e poderia esvaziar o apoio de empresários e do mercado ao presidente.
De qualquer forma, ainda estaria longe dos 308 necessários para aprovar a reforma da Previdência. Mas seria o bastante para reformas menos complexas e por isso placar é motivo de preocupação constante do Palácio do Planalto e é atualizado três vezes por dia em reuniões entre o deputado Beto Mansur (PRB-SP), vice-líder do governo na Câmara, e os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil), Moreira Franco (Secretaria Geral) e Antonio Imbassahy (Secretaria de Governo).
Segundo interlocutores, Temer confia que tem os votos necessários para barrar a denúncia, mas receia que o resultado exponha o encolhimento da base e por isso está dedicado dia e noite a reuniões e ligações para dezenas de deputados. Aliados divulgam 280 votos pelo arquivamento da denúncia ou ausências no dia da votação - o que acaba por contar a favor do pemedebista-, mas, reservadamente, relatam que pode chegar a poucos mais de 200 votos e, nesse contexto, ainda discutem se o melhor não seria o adiamento da votação.
Mansur nega qualquer discussão sobre não votar a denúncia amanhã. "Não tem nada disso, mas continuamos trabalhando para ampliar o número de votos", afirmou. Parte dos aliados de Temer pondera também que postergar a votação deixaria uma "faca no pescoço" do presidente e poderia impedir a discussão de outros projetos pelo Congresso, atrapalhando a tentativa de construir uma outra agenda para além da denúncia, e ainda deixaria a ameaça de que novas delações premiadas, como a do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) ou do lobista Lúcio Funaro, ampliem a crise.
Um dos dissidentes do PSB, o deputado federal Danilo Forte (CE) disse, após reunião com o presidente, que ele quer concluir esse processo esta semana para "virar a página". "Ele está bastante animado para derrotar essa denúncia e dar uma guinada no governo", disse. Temer, que remodelou seu gabinete nas últimas semanas, afirmou que já prepara a simplificação de tributos para mandar ao Congresso na semana seguinte à votação.
Na busca por votos, a bancada ruralista espera a participação do presidente hoje no tradicional almoço realizado pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) para discutir projetos de interesse do setor. Na última participação, 90 deputados compareceram. O presidente do grupo, deputado Nilson Leitão (PSDB-MT), já anunciou voto contrário ao recebimento da denúncia. O evento ainda não constava da agenda oficial. Segundo um deputado, Temer aceitou o convite, mas aguardava avaliação sobre se o evento teria um bom número de deputados ou se seria esvaziado pela volta do recesso.
Outra frente de atuação é conquistar indecisos nos partidos da base, como PSDB e o DEM do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Por outro lado, se perceber que não tem os votos suficientes para uma vitória com apoio expressivo, o governo pretende jogar para a oposição a culpa pela falta de quórum para iniciar a votação - os mesmos 342 votos exigidos para aprovar a denúncia - e dizer que o assunto não é mais prioridade.
Os oposicionistas discordam sobre dar ou não presença na sessão e tentarão bater o martelo sobre a melhor estratégia em almoço hoje. Maior partido do grupo, o PT defendeu ontem que é preciso votar a denúncia ainda esta semana e mostrar que a base do presidente está reduzida. "Não existe essa conversa de deixar o presidente sangrar porque a cada dia que passa ele prejudica mais a população brasileira", disse o líder da bancada petista, deputado Carlos Zarattini (SP).
Já os deputados Alessandro Molon (Rede-RJ) e Júlio Delgado (PSB-MG) defendem votar amanhã, mas só dar presença depois que a base tiver pelo menos 260 a 280 parlamentares em plenário sejam obrigados a mostrar seu apoio. "Isso é um erro, é entregar de mão beijada para o governo a derrota da denúncia. Quanto mais tempo levar para votar, maior o desgaste e a chance de afastamento", discordou o deputado Ivan Valente (Psol-SP). Para integrantes do grupo, o PT deseja votar rapidamente porque não tem interesse no afastamento de Temer - deixar o presidente "sangrar" até 2018 aumentaria as chances de eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Uma estimativa feita pela GO Associados, em parceria com a consultoria Numbers Care, prevê a vitória de Temer na votação. As consultorias estimam que a oposição tenha cerca de 255 votos a favor da denúncia, o que ainda está bem abaixo dos 342 votos necessários para que o Supremo Tribunal Federal (STF) analise a denúncia. "Após a votação, espera-se que finalmente a Câmara avance nas negociações sobre a reforma da Previdência, fundamental para o ajuste do grave quadro fiscal, dado que hoje os gastos previdenciários ocupam cerca de 57% do orçamento federal", diz a GO. (Colaboraram Cristiano Zaia, de Brasília, e Angela Bittencourt, de São Paulo)
Nenhum comentário:
Postar um comentário