Eleição do ano que vem também terá cláusula de barreira; fim de coligações proporcionais valerá em 2020
A Câmara aprovou ontem à noite a criação de um fundo público de R$ 2 bilhões para financiar campanhas já a partir das eleições do ano que vem. Anteontem, foram confirmados a cláusula de barreira e o fim das coligações proporcionais. Já o Supremo Tribunal Federal tornou mais rigorosa a Lei da Ficha Limpa. Por seis votos a cinco, os ministros decidiram que o veto a candidaturas de políticos condenados em segunda instância vale também para os que tiveram sentença antes da aprovação da lei, em 2010. A decisão será aplicada a outros processos que tramitam nos tribunais de todo o país. O julgamento que pode autorizar ou não candidaturas avulsas, de pessoas não filiadas a partidos, foi adiado para hoje.
Fundo financiará 2018
Após polêmica, Câmara aprova financiamento de campanha com recursos públicos
Cristiane Jungblut | O Globo
-BRASÍLIA- Depois de meses de polêmica e no limite do prazo, a Câmara aprovou ontem à noite, em votação simbólica, o texto principal do projeto que cria um fundo eleitoral para as eleições de 2018 com recursos públicos. Os deputados aprovaram o projeto de autoria do Senado que cria o Fundo Especial de Financiamento de Campanha. Já batizado de “fundão”, ele será abastecido por um percentual das emendas parlamentares de bancada previstas para 2018 e ainda dos recursos provenientes da compensação fiscal dada até agora às emissoras de rádio e televisão pela veiculação da propaganda partidária eleitoral. Mas, deputados de alguns partidos ficaram insatisfeitos com o encaminhamento da questão e com a forma de financiamento do fundo e exigiram votação nominal, com a intenção de derrubar o que foi aprovado. O destaque foi rejeitado por 223 votos a favor da manutenção do texto original do Senado, e 209 contra.
Pelos cálculos dos congressistas, o fundo teria cerca de R$ 2 bilhões para 2018. No fim da noite ainda estavam sendo votados pedidos de alteração ao texto. A insatisfação principal era contra o uso dos recursos de emendas parlamentares. A aprovação do fundo público teve como principais cabos eleitorais PMDB, PT e PCdoB, uma vez que o financiamento privado está proibido por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
O projeto do fundo foi aprovado dentro de um acordo político que leva em conta a promessa de que Temer vetará dois pontos que desagradam aos deputados: os critérios de distribuição dos recursos para os partidos, que beneficiam demais o PMDB, e ainda a previsão de que verbas do Fundo Partidário — que já existe — financiariam apenas campanhas majoritárias.
Câmara e Senado já aprovaram a parte da reforma política que define cláusulas de barreira para criação de partidos e acaba com as coligações proporcionais a partir da eleição de 2020.
Pela regra aprovada, a cláusula de barreira será gradativa: começa a ser adotada em 2018, com a exigência de que os partidos atinjam a votação mínima de 1,5% em pelo menos nove estados, e chega ao requisito de 3% dos votos em 2030. Com isso, as siglas que não alcançarem esse patamar não terão direito a recursos do fundo partidário, nem a tempo de rádio e TV. Com a vedação das doações empresariais nas eleições do ano passado, o fundo partidário foi a principal fonte de financiamento para muitos candidatos.
O escalonamento da cláusula de barreira funcionará da seguinte forma:
Em 2018, os partidos terão de obter, nas eleições para deputado federal, pelo menos 1,5% dos votos válidos, distribuídos em, no mínimo, um terço das unidades da federação, com ao menos 1% dos votos válidos em cada uma delas; ou ter eleito pelo menos 9 deputados, distribuídos em, no mínimo, um terço das unidades da federação.
Em 2022, terão de obter, nas eleições para a Câmara, pelo menos 2% dos votos válidos, distribuídos em, no mínimo, um terço das unidades da federação, com ao menos 1% dos votos válidos em cada uma delas; ou ter eleito pelo menos 11 deputados, distribuídos em, no mínimo, um terço das unidades da federação.
Em 2026, terão de obter, nas eleições para a Câmara, pelo menos 2,5% dos votos válidos, distribuídos em, no mínimo, um terço das unidades da federação, com ao menos 1,5% dos votos válidos em cada uma delas; ou ter eleito pelo menos 13 deputados, distribuídos em, no mínimo, um terço das unidades da federação.
E em 2030, terão de obter, nas eleições para a Câmara, pelo menos 3% dos votos válidos, distribuídos em, no mínimo, um terço das unidades da federação, com ao menos 2% dos votos válidos em cada uma delas; ou ter eleito pelo menos 15 deputados, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da federação.
GOLPE NOS PARTIDOS PEQUENOS
Além da cláusula de desempenho e o fim das coligações proporcionais a partir de 2020, a proposta acabou com a possibilidade de os partidos com afinidade ideológica formarem federações para disputar as eleições a partir de 2020.
A rejeição das federações atinge diretamente os pequenos partidos e legendas de esquerda, como PSOL e PCdoB. Com o fim das coligações e a adoção da cláusula de desempenho, essas siglas esperavam ter como alternativa a união em federações, como forma de "escapar" das novas limitações. As federações permitiriam que os partidos se unissem para concorrer, mas exigiria que eles ficassem unidos e funcionassem como um único partido até o final das legislaturas. Geralmente, os partidos se unem nas eleições e depois se separam.
Já em relação às coligações partidárias, para 2018, continuam valendo as regras atuais, em que os partidos podem se juntar em alianças para disputar a eleição e somar os tempos de rádio e televisão, e desfazê-las após o pleito.
As coligações também são levadas em conta na hora da divisão das cadeiras. Hoje, deputados federais e estaduais e vereadores são eleitos no modelo proporcional com lista aberta.
DIVISÃO DO BOLO
A votação do projeto do Fundo Eleitoral foi possível em função de uma manobra regimental feita na véspera. Ainda na noite de terça-feira, a urgência para a discussão e votação do projeto foi aprovada com base numa regra do Regimento da Câmara que não era usada há 18 anos e que previa a exigência de um quorum menor.
No caso do fundo público, os partidos aliados a Temer e de oposição se misturaram. Partido de Temer, o PMDB foi autor da ideia, ao lado de PT, PCdoB e DEM. Do outro lado, PR e PRB, por exemplo, ficaram contra o Fundo.
— Paira um grande acordo para que a gente crise esse fundo escorchante — reclamou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).
O líder da minoria, José Guimarães (PT-CE), disse que o Palácio do Planalto se comprometeu a sancionar o projeto do fundo até amanhã, vetando os pontos acordados. O PT foi o maior defensor do fundo, depois do presidente do PMDB, senador Romero Jucá (RR), que ajudou na elaboração do texto do Senado.
— Por que defendemos o financiamento público? Porque sempre fomos contra o financiamento privado — disse o líder do PT na Câmara, deputado Carlos Zarattini (SP).
O líder do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), garantiu que o acordo será honrado:
— Não é matéria de governo, mas os presidentes da Câmara e do Senado pediram o veto dos dois pontos. E vamos honrar o compromisso — disse.
O sinal político para a necessidade de se deixar o impasse de lado e chegar a um acordo foi dado pelo próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Antes do início da votação, Maia disse que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, avisou que era preciso votar a criação do fundo até o final desta semana, ou seja, um ano antes das eleições de 2018 como determina a legislação. A novidade é que Gilmar Mendes garantiu que o projeto que trata da regulamentação do fundo e das demais regras eleitorais poderia ficar para depois.
Na mesma sessão, a Câmara começou a votar o projeto da regulamentação, de autoria do deputado Vicente Cândido (PT-SP). Foi aprovado o texto principal e depois os deputados passaram a discutir o projeto do fundo.
Pela proposta de Vicente Cândido, a divisão dos recursos ocorreria da seguinte maneira: 2% serão divididos igualitariamente entre todos os partidos; 35% entre os partidos que tenham representante na Câmara, na proporção do número de votos obtidos na última eleição; 48% entre os partidos, conforme as bancadas; 15% para os partidos, conforme o número de representantes no Senado.
A proposta trata ainda de outras regras eleitorais, como distribuição de recursos, valor das campanhas e propaganda na internet. A proposta limita a R$ 70 milhões o valor da campanha para presidente da República de cada um dos candidatos, por exemplo. Outro ponto importante é o que proíbe o registro de candidatura avulsa, mesmo que a pessoa tenha filiação partidária.
A proposta ainda antecipa de agosto para 15 de maio o prazo para que os candidatos comecem a arrecadar dinheiro para as campanhas. Outro ponto importante é o que permite a propaganda eleitoral paga na internet, através do chamado “impulsionamento de conteúdo”.
Dentro de cada partido, o dinheiro do fundo seria desta maneira: 50% para campanha a presidente, governador e senador; 30% para candidatos a deputado federal; 20% para candidatos a deputado estadual. No caso de eleições municipais, se for o caso, 60% para prefeitos e 40% para vereadores.
PARTICIPAÇÃO EM DEBATES
Vicente Cândido ainda retomou na última versão a questão dos debates: fica assegurada a participação de candidatos dos partidos com representação no Congresso Nacional, de, no mínimo, cinco parlamentares.
O problema é que o projeto de Vicente Cândido ainda terá que passar pelo Senado. Nos bastidores, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), disse que não há disposição de aprovar nenhuma regra nova além da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que trata do fim das coligações proporcionais em 2020 e da criação da cláusula de barreira em 2018.
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