- Folha de S. Paulo
Desde Bernard de Mandeville (1670-1733) é um "tópos" do liberalismo defender que, sob certas circunstâncias, vícios privados convertem-se em benefícios públicos. O exemplo clássico é o da cobiça que, submetida às dinâmicas do mercado, se transforma numa força que promove inovação e redução de preços via concorrência.
Não discordo de que esse mecanismo seja real e poderoso, mas lembro que o "sob certas circunstâncias" é um elemento que não pode ser ignorado, já que há um bom número de situações em que os vícios privados não trazem nenhum benefício público. Ao contrário, trazem prejuízos.
Penso que é esse o caso de João Doria. A vitória que ele obteve na eleição municipal de 2016 foi impressionante. Derrotou um candidato que disputava a própria reeleição, o que nunca é trivial, e o fez sem precisar passar por um segundo turno, fato inédito em São Paulo.
Ao que tudo indica, porém, o sucesso eleitoral subiu-lhe à cabeça, e fez com que Doria passasse a ver a si mesmo como um excelente postulante à Presidência. Mais, ele passou a trabalhar ativamente para consolidar sua candidatura. Para isso, privilegiou sua agenda de compromissos políticos fora da cidade —em detrimento dos cuidados com a administração.
Ele foi, por assim dizer, com muita sede ao pote, e a população percebeu isso. Pela pesquisa Datafolha, os paulistanos entenderam que as viagens servem mais aos interesses pessoais do prefeito do que aos da cidade e perceberam que Doria, a exemplo dos políticos ordinários (algo que o prefeito nega ser), tem o hábito de prometer muito mais do que entrega.
Com isso, a melhor esperança de Doria, que era aparecer rapidamente nas pesquisas como a mais viável das candidaturas de centro, não está se confirmando, o que poderá revelar-se fatal para as pretensões presidenciais do prefeito.
Decididamente, há vícios que são apenas vícios.
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