Os gastos com a Previdência estão drenando os recursos necessários para bancar não apenas o dia a dia da administração, o que já seria, em si, grave, mas também a maioria dos programas sociais em vigor no País. Ou seja, o principal argumento dos opositores da reforma previdenciária – o de que as mudanças nos critérios de aposentadoria prejudicariam principalmente os mais pobres – é contrariado pelos fatos: mantendo-se tudo como está na Previdência, os brasileiros mais pobres fatalmente serão privados de programas que hoje lhes são fundamentais.
Esse quadro ficou claro em reportagem recente do jornal Valor, que compilou dados do governo e do Congresso para concluir que os mais importantes programas sociais estão sofrendo cortes de até 96% como consequência do aumento das despesas obrigatórias, em especial a Previdência. Ou seja, há programas que podem simplesmente desaparecer caso nada seja feito com brevidade.
O programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, por exemplo, recebeu apenas R$ 1,8 bilhão de janeiro a agosto deste ano, contra R$ 7,9 bilhões em 2016 e R$ 20,7 bilhões em 2015. Já o Programa de Aquisição de Alimentos, em que o governo compra produtos de agricultura familiar e os distribui à população mais pobre, teve sua verba reduzida de R$ 676,9 milhões em 2014 para R$ 40,2 milhões até junho deste ano.
O programa que mais perdeu recursos foi o Bolsa Atleta, que teve R$ 123 milhões em 2014, caiu para R$ 71,8 milhões em 2015, chegou a R$ 14,6 milhões no ano passado e, neste ano, até agora, recebeu apenas R$ 4,7 milhões. Outros programas afetados foram o Luz Para Todos, encolhido em 75% da verba desde 2014; o Bolsa Verde (transferência de renda para famílias em extrema pobreza que vivem em áreas de conservação), que teve recuo de 52% no período; o Bolsa Família, com diminuição de 29%; e o Fies, que financia matrículas no ensino superior privado, que recuou 22%.
Já é possível antever o discurso da oposição, especialmente a petista, diante desse cenário. A todo momento, o partido responsável pela tragédia econômica que se abateu sobre o País repete que o atual governo deu um “golpe” com o objetivo de reduzir as verbas para a área social e para acabar com os programas voltados para os mais pobres. Trata-se da costumeira desonestidade de um partido que se especializou em enganar incautos.
As verbas para os programas sociais já vinham sendo reduzidas no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, a capitã do time que levou o Brasil a dois anos de profunda recessão. E a razão disso é simples: flagrada cometendo pedaladas fiscais e contabilidade criativa, a presidente não podia mais recorrer à maquiagem das contas, situação que a obrigou a lidar com a realidade, depois de anos de irresponsabilidade.
Essa foi a herança recebida pelo atual governo, que ademais enfrenta o imenso custo do crescente déficit da Previdência. Sem a reforma do sistema previdenciário, sempre adiada por uma oposição irracional, corporativista ou simplesmente fisiológica, o governo não tem alternativa senão remanejar verbas de outras áreas para bancar as aposentadorias.
Segundo o Ministério do Planejamento, paradoxalmente não há uma redução dos recursos destinados à área social, pois a Previdência é considerada uma despesa dessa área. Como o governo é obrigado a cobrir o déficit da Previdência, e esse déficit não para de crescer, os gastos sociais estão, portanto, aumentando, e não diminuindo. Hoje, esse tipo de gasto corresponde a 68,7% da despesa pública total – da qual 57,1% destinam-se apenas a aposentadorias. Todos os demais setores – inclusive saúde e educação, que deveriam ser prioridade na área social – disputam o restante das verbas. Assim, os primeiros a perder recursos são os itens discricionários, categoria em que se enquadram os programas sociais que estão definhando e que terão necessariamente de ser repensados.
Para resumir, o cobertor é curto – e a Previdência, se não for reformada, vai deixar muita gente, especialmente os mais pobres, passando frio.
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