Estudos mostram que legislação de controle de armas poupou 133.987 vidas num período de dez anos
O estrago provocado pelas armas de fogo no Brasil não é segredo para ninguém. Está à vista de todos, a todo momento, em todas as regiões. Dados do Mapa da Violência 2016, minucioso estudo que analisa o impacto das armas de fogo na mortalidade do país, mostram que elas são responsáveis por mais de 70 por cento dos assassinatos. Ou seja, são, de longe, o instrumento preferido para quem quer matar. Em números absolutos, contabilizam-se 44.861 mortes por ano, ou 123 por dia, cinco por hora. Como afirma o documento, é mais do que um massacre do Carandiru a cada dia.
Diante desses números catastróficos, seria razoável pensar em reduzir a quantidade de armas em circulação, e não aumentá-la, como quer a bancada da bala. Imaginar que as pessoas ficariam mais seguras ampliando-se esse arsenal é grande equívoco. Ainda que elas sejam legalizadas e estejam nas mãos de cidadãos de bem. Fosse assim, o Rio de Janeiro não teria 107 policiais assassinados este ano. A maioria não estava em serviço e foi morta em assaltos, falsas blitzes, emboscadas ou por terem sido reconhecidas como policiais.
Além disso, há que se levar em conta que muitas dessas armas legalizadas vão parar nas mãos de criminosos. Um relatório preparado pelo diretor geral da Polícia Federal, Leandro Daiello, e enviado à CPI das Armas na Assembleia Legislativa do Rio, em 2015, revela que 17.662 armas foram roubadas ou desviadas de firmas de segurança num período de dez anos. Elas teriam sido levadas de escoltas durante assaltos ou extraviadas. O volume representa quase um terço do total disponível em todas as empresas do setor no Rio.
Nesse contexto, aumentar o número de armas significa potencializar suas consequências. Como fica comprovado diariamente. Na quarta-feira, três pessoas foram baleadas durante um tiroteio próximo à Cruzada São Sebastião e ao Shopping Leblon. Dias atrás, uma adolescente de 16 anos e um jovem de 23 foram atingidos por balas perdidas dentro de suas casas, na Rocinha, onde a guerra do tráfico aterroriza moradores há mais de três semanas. São vítimas numa estatística que parece infindável. Os tiroteios se tornaram tão frequentes que já existem sites especializados para informar onde há confrontos no Rio, como se isso fosse normal.
Os que criticam o Estatuto do Desarmamento costumam argumentar que, desde que entrou em vigor a legislação de controle de armas de fogo, em 2004, o número de homicídios no país aumentou. Mas não é bem assim. Como mostra o Mapa da Violência, se os assassinatos continuassem a subir no ritmo pré-estatuto, a situação seria ainda pior. Ou seja, não reduziu, mas conteve o crescimento, o que não é desprezível. Pesquisadores estimam que foram poupadas 133.987 vidas em dez anos.
Se o Brasil quer reduzir seus números vergonhosos de homicídios, precisa encarar a questão com seriedade e lucidez. Sabe-se que o combate à violência é árduo, longo e dispendioso. Mas ele não terá sucesso com mais armas em circulação. Isso só aumentaria o tamanho da tragédia.
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