Em uma análise rigorosa, seria inapropriado o uso de medida provisória para legislar sobre relações trabalhistas. O instrumento, afinal, destina-se a providências emergenciais, não a temas de tamanha complexidade.
De todo modo, foi essa a saída política que viabilizou a aprovação célere, pelo Senado, da reforma da CLT que começou a vigorar neste mês. A MP, editada na terça (14), foi prometida pelo presidente Michel Temer (PMDB) para tratar de aspectos controversos não examinados pelos senadores.
O acerto, contudo, contrariou o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Um tanto por afirmação de poder, outro por preferências programáticas, o parlamentar não quer ver alterado o texto definido por seus pares.
Como se já não fosse missão árdua o bastante promover o maior redesenho da legislação trabalhistas desde os anos 1940, a tensão entre o Executivo e as duas Casas legislativas cria incertezas adicionais para o mundo real das empresas e de seus funcionários.
Nem mesmo há segurança quanto à extensão do impacto do que já foi aprovado pelo Congresso —que dirá acerca do futuro da MP e das inevitáveis disputas judiciais decorrentes dos novos regulamentos.
Num exemplo quase prosaico, o Planalto sancionou a reforma sem se dar conta de que esta revogava a Lei da Gorjeta, cuja vigência se iniciou apenas em maio deste ano. Restabelecida de modo provisório, a regulação dessas gratificações será novamente escrutinada por deputados e senadores.
O episódio envolve somente um dos mais de 900 artigos da septuagenária CLT (o 457º); cerca de cem acabaram de ser alterados, suprimidos ou introduzidos.
Outros casos —como os direitos dos funcionários intermitentes, que pela nova regra não incluem o seguro-desemprego certamente se tornarão alvo de questionamentos na Justiça especializada, boa parte dela hostil às mudanças.
Seria ingenuidade, claro, imaginar que a imprescindível atualização das leis trabalhistas pudesse ocorrer sem percalços e conflitos. O país demorou em demasia a enfrentar tais tabus, e só o fez na esteira de uma recessão brutal.
Governo e Congresso deveriam facilitar a tarefa de convencimento, porém, com clareza e transparência. Nesse sentido, é contraproducente publicar uma medida provisória, sem mais explicações, em edição extraordinária do "Diário Oficial", no início da noite da véspera de um feriado.
A reforma, já se disse aqui, será consolidada na prática diária, à medida que patrões e empregados se ajustem a novas relações. Às autoridades cabe demonstrar firmeza de propósitos e a disposição de dirimir dúvidas e desconfianças.
Nenhum comentário:
Postar um comentário