Janaína Figueiredo / O Globo
- BUENOS AIRES- Esta semana, o candidato à Presidência do Chile Alejandro Guillier, o mais bem posicionado para disputar um eventual segundo turno com o ex- presidente e também candidato Sebastián Piñera ( 20102014), participou da inauguração de um hospital ao lado da presidente Michelle Bachelet. A imagem surpreendeu, já que nesta campanha, pela primeira vez desde a redemocratização do Chile, em 1990, o Palácio de la Moneda não lançou candidato à sucessão, confirmando a maior crise vivida pela centro- esquerda chilena em quase três décadas.
Na reta final, a presidente não conseguiu esconder sua preferência por Guillier, e sua atitude foi criticada por Piñera, o grande favorito no domingo. O governo respondeu dizendo que o ex- chefe de Estado também foi convidado, e a realidade é que este pequeno gesto de Bachelet não alterará em nada um cenário eleitoral amplamente favorável ao candidato da coalizão de direita Chile Vamos.
‘ADVERSÁRIO É A ABSTENÇÃO’
A inédita fragmentação da centroesquerda — que nesta eleição terá quatro candidatos — somada à perspectiva de uma baixíssima participação eleitoral, colocou Piñera no melhor dos mundos. Nos últimos dias, o ex- socialista e fundador do Partido Progressista Marco Enríquez Ominami, que disputará a Presidência pela terceira vez, foi claro neste sentido:
— Nosso grande adversário não é Piñera, e sim a abstenção.
Para ele e a maioria dos analistas, “quantos menos chilenos votarem (o voto é voluntário), mais chances terá Piñera de vencer no primeiro turno”. De acordo com recentes pesquisas, Guillier obteria entre 20% e 25% dos votos, contra até 45% do ex- presidente (que precisa de 50% mais um dos votos para eleger- se no primeiro turno). Juntos, os outros três candidatos de centro-esquerda ficariam com cerca de 20%. Está claro que o racha da coalizão de governo, que obrigou Bachelet a ficar fora da campanha, foi catastrófica.
— O começo desta crise foi em 2009, quando Ominami saiu do Partido Socialista e lançou seu próprio partido. Em 2013, quando Bachelet decidiu incorporar os comunistas à sua aliança de governo, o racha se tornou inevitável — explicou ao GLOBO Marco Moreno, reitor da Faculdade de Governo da Universidade do Chile.
Para ele, “o que vemos hoje é consequência de lideranças fracas, que não foram capazes de gerar entendimento e um acordo que permitisse uma candidatura única”.
Uma candidatura do ex-presidente socialista Ricardo Lagos ( 2000- 2006), opinou Moreno, poderia ter evitado o desastre.
— Lagos, que teria sido melhor candidato para enfrentar Piñera, abandonou a corrida porque Guillier estava melhor nas pesquisas. Isso deu aos democratas-cristãos a desculpa perfeita para terem uma candidatura por fora da aliança.
PROPOSTA DE CONSTITUINTE
Essa candidatura é a da senadora Carolina Goic, que segundo recentes pesquisas não chega a 10% das intenções de voto. Acima dela está a jornalista Beatriz Sánchez, da grande novidade política no Chile: a esquerdista Frente Ampla, inspirada no partido espanhol Podemos e na Frente Ampla do Uruguai. Beatriz participou de primárias, venceu e assumiu uma candidatura que, no começo, despertou certo entusiasmo. Nos últimos meses, porém, esse impulso diminuiu, e tornou- se evidente que a nova esquerda chilena não irá muito longe em sua primeira eleição. No melhor dos casos, Beatriz ficará em terceiro lugar, e a Frente Ampla, integrada por 14 partidos e movimentos, conseguiria de cinco a seis cadeiras na Câmara (que passará a ter 155 integrantes).
— A Frente Ampla mostrou incapacidade para articular tantas posições num único espaço — disse Roberto Méndez, professor da Universidade Católica do Chile.
A esquerda radical chilena tem propostas como a convocação de uma Assembleia Constituinte para enterrar definitivamente a Constituição herdada da ditadura de Augusto Pinochet (1973- 1990).
— Depois desta eleição, a centro-esquerda chilena deverá, necessariamente, passar por uma reestruturação. Quem ficará e quem sairá não sabemos — apontou Moreno.
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