sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Novas tentativas de aguar a reforma da previdência- Editorial: Valor Econômico

O ambiente no qual a reforma da previdência voltou a ser discutida vem se deteriorando. Ao bazar natural das negociações no Congresso para sua aprovação, soma-se agora a feira de oportunidades aberta pela iminência de uma reforma (que aos poucos se torna uma minirreforma) ministerial. A proposta aprovada em comissão pela Câmara dos Deputados corre o risco adicional de ser retalhada ao sabor das conveniências. A equipe econômica apostou em uma boa reforma, com alguma margem para reveses, mas ela pode ser desbordada se o "realismo" político do Planalto acabar prevalecendo, como parece que vai.

O ambiente racional para se discutir uma boa reforma, cujos contornos foram delineados no projeto aprovado em comissão, parece ter ficado para trás. Como em quase todo o resto, em se tratando do governo Temer, as expectativas estão sendo progressivamente rebaixadas. Nos mercados, prevalece a ideia de que qualquer coisa que for aprovada ajudará pelo menos um pouco na contenção do enorme rombo previdenciário, até que o próximo governo realize as mudanças que precisam ser feitas e não o foram agora.

A Fazenda traçou uma nova régua, fatalmente mais baixa, para mais uma tentativa de aprovação. Por seus cálculos, se sua proposta inicial passasse intacta, ela reduziria em R$ 800 bilhões em dez anos o déficit do setor. Com as mudanças pelo relator, preservou-se uma redução de R$ 600 bilhões. A equipe econômica aceita agora pelo menos 50%, ou seja, R$ 400 bilhões. A urgência é mais que justificada, porque o teto de gastos desabará em um par de anos se nada for feito.

Resta então não só definir o que ficará de fora e o que será mantido, sem dar espaço para desfigurações - e existe um perigo real de isso ocorrer. A ideia é manter a idade mínima de 65 anos para homens e 62 para mulheres, avanço que pode ser relativizado dependendo de como serão definidas as regras de transição. E já há péssimas ideias a respeito.

Uma delas vem do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que pretende emascular um dos alicerces da reforma, a das regras iguais para o funcionalismo público, que goza de vantagens inequívocas sobre o resto da população no caso das aposentadorias. O projeto original preservava vantagens dos servidores desde que eles agora passassem a cumprir a idade mínima para manter, no caso de quem ingressou no serviço público até 2003, a integralidade dos vencimentos e a paridade com os servidores ativos. Maia sugeriu que fosse criada uma "idade intermediária" para reduzir a resistência do funcionalismo à reforma (O Estado de S. Paulo, 15 de novembro).

O déficit do regime previdenciário dos servidores, que atende um milhão de pessoas, é quase semelhante ao do regime geral, que assiste 30 milhões e, somados, ultrapassaram R$ 300 bilhões. A aposentadoria média do funcionalismo é pelo menos o triplo da que recebe o cidadão comum. No caso dos membros do Judiciário, é de R$ 26,3 mil e no Ministério Público, de R$ 18 mil. As regras desiguais transferem renda de toda população para quem trabalha para o Estado e um dos pontos mais importantes da reforma é justamente buscar reduzir as diferenças.

A reforma ministerial pode piorar as coisas. O presidente Temer pretende amarrar as mudanças no primeiro escalão, mas apenas executá-la depois de feita a votação da reforma da previdência. A dança de ministros foi uma exigência do Centrão para obter as pastas que serão deixadas vagas pelos tucanos. A preocupação em não deixar no sereno, e sem foro privilegiado, possíveis candidatos que obteriam visibilidade mantendo-se nos cargos até abril fizeram o governo reduzir sua amplitude.

As concessões políticas dão a ideia de que os 308 votos só serão conseguidos se a reforma previdenciária for tão amena que consiga atrair a base recalcitrante a aprová-la. Não só isso. Uma boa parte dos governistas acredita que também não será possível aprovar o adiamento do aumento concedido em 2018 ao funcionalismo, uma das medidas para fechar as contas com novo e maiúsculo déficit de R$ 159 bilhões no ano que vem.

A equipe econômica defende que se mantenha 25 anos de contribuição para que os servidores se aposentem. É vital que sejam bem sucedidos em impedir a desfiguração em um ponto central da reforma. No Planalto, parece faltar convicção em levar a reforma adiante.

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