- Valor Econômico (26/3/2018)
Michael Hasenstab, da Templeton, alerta Brasil para corrupção
Quebrou a cara quem confiou que o julgamento dos recursos apresentados pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo TRF-4, a partir das 13h30 desta segunda-feira, seria o gatilho para o Brasil virar uma página envergonhada de sua história recente e dar início ao processo que elegerá, em outubro, o próximo presidente da República. A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de adiar a votação do habeas corpus de Lula para 4 de abril e impedir sua prisão até a retomada da sessão, interrompida na quinta, tornou real o risco de radicalização na disputa eleitoral.
Enquanto a direita se move contra Lula que é defendido pela esquerda para além das redes sociais, como se viu durante sua caravana pelo Sul do país, o presidente Michel Temer cai na estrada. Hoje participa, em São Paulo, da reunião da diretoria plena da Fecomercio-SP. Na sexta, em visita à Bahia e Pernambuco, proferiu três discursos que não deram margem a dúvida sobre sua intenção de tentar o segundo mandato presidencial. Temer é candidato e mantém ao alcance do verbo um concorrente ao cargo majoritário - o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, nem tão político ou tão hábil quanto seu chefe.
Nada garante que o primeiro trimestre será encerrado com Meirelles candidato a vice de Temer em chapa a ser formalizada pelo MDB - partido que tentará se manter no poder com unhas e dentes depois da oportunidade aberta pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016. Talvez, Temer não tenha pressa para fechar um acordo com Meirelles, inclusive, porque o presidente sabe como imobilizar um adversário que adulou nas cerimônias que encabeçaram no Nordeste na sexta passada e apontou como "cria extraordinária" quando inauguraram o projeto de irrigação Baixio de Irecê, em Xique-Xique, Bahia.
No início de abril, o presidente deve escalar novos ministros que ocuparão vagas abertas com a saída do governo de aspirantes à Presidência, governos estaduais, Câmara ou Senado. Contudo, como o futuro é incerto, providências importantes são colocadas em prática pelo atual gabinete, sobretudo na área financeira, enquanto é tempo.
O BNDES anunciou uma reorganização de atividades e novas diretorias foram criadas. Entre elas, uma cuidará de negócios por meios digitais e outra ampliará o escopo da BNDESPar que terá perfil de banco de investimento. Mais um a demonstrar interesse pelo Palácio do Planalto, o atual presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro deve trocar o cargo pela eleição. O ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, que chegou a ser cogitado para substituir Meirelles caso este decida disputar a Presidência em outubro, é forte candidato ao comando do banco de fomento. Eduardo Guardia, secretário executivo da Fazenda, poderá assumir a pasta, se existir uma sucessão de Meirelles.
O presidente da Caixa, Gilberto Occhi, deixou o posto na sexta supostamente para assumir o Ministério da Saúde. A saída de Occhi sugere o fortalecimento da Fazenda junto ao Planalto. O comando da Caixa queixa-se há tempos do que considerava intromissão da pasta em decisões administrativas. Ana Paula Vescovi, titular da Secretaria do Tesouro Nacional, subordinada à Fazenda, preside o conselho do banco estatal.
O presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn, encaminhou na sexta para avaliação do presidente Michel Temer as indicações de Carolina Assis Barros, servidora de carreira do BC, para ocupar a diretoria de Administração, e de Maurício Moura, atual titular da Diretoria de Administração, para comandar a Diretoria de Relacionamento Institucional e Cidadania. Também na semana passada o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), mais um postulante ao Planalto, fechou um acordo com técnicos do BC e da Fazenda sobre a redação final do projeto de lei que trata da autonomia da instituição. O texto substituirá um projeto de autoria do próprio deputado e não inclui a proposta de atribuir duplo mandato ao BC - manter a inflação sob controle e garantir pleno emprego.
A reforma da Previdência foi para cucuia, mas voltará para protagonizar discursos e outras etapas de negociações entre a "nova" gestão presidencial e o Congresso. É certo que o próximo presidente será forçado a realizar uma reforma abrangente da Previdência se estiver interessado em atrair os investimentos necessários para elevar a atual recuperação cíclica e efetivo crescimento. Quem faz o alerta é um seleto grupo de especialistas da Franklin Templeton Investments que responde pelo desenvolvimento do índice TGM-ESG (Templeton Global Macro Environmental, Social and Governance). O indicador quantifica fatores ambientais, sociais e de governança de um leque de países e é um pilar da análise macroeconômica e de estratégia de investimentos de longo prazo da Templeton que administra globalmente US$ 740 bilhões de terceiros.
O Brasil está na 32ª posição entre 44 nações classificadas por um sistema que atribui notas de 0 a 10 para o cálculo do índice TGM-ESG, construído com base em pesquisa proprietária com previsões para a evolução de condições ambientais, sociais e de governança no médio prazo - três anos - pelo critério da Templeton. Segundo o relatório Global Macro Shifts, as notas deste início de ano variam da máxima de 9,2 obtida por Dinamarca e Suíça, à mínima de 2,2, dada à Venezuela.
Em entrevista à coluna por e-mail, o ícone do mercado global de bônus Michael Hasenstab, vice-presidente executivo e gestor de portfólio da Templeton Global Macro, avaliou que o Brasil tem desempenho relativamente bom nas questões ambientais, mas apresenta resultado mais fraco quanto às condições sociais e de governança. "Corrupção, transparência e clima empresarial afetam a nota de governança do país que apresenta baixo desempenho quanto à interação sociedade e mercado de trabalho", afirma o australiano Hasenstab, PhD em Economia pela Asia Pacific School of Economics, em Administração pela Australian National University e bacharel em Relações Internacionais e Políticas Econômicas pelo Carleton College.
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