- Valor Econômico
Se houver desistência, anúncio fica para fim de agosto
O eleitor está distraído à espera da Copa, a situação é fluida. Não há movimento a se perceber no ranking eleitoral. Ninguém tem crescimento consolidado ou significativo nas pesquisas. Tudo pode ainda mudar, inclusive irromper na disputa um outsider arrebatador. Todos os candidatos já declarados estão estagnados. Ciro Gomes, o novo favorito se Lula for mesmo defenestrado, na perspectiva de aumentar seu eleitorado, há várias eleições estacionado entre 8 e 12%, pressiona pela renúncia do ex-presidente, já. Quer ver se seus índices se mexem com a herança lulista que as pesquisas lhe atribuem.
Já é consenso que até depois de conhecido o time campeão, o quadro político permanecerá inalterado, em compasso de espera. Até lá, não serão definidos apoios e alianças, a não ser que o candidato esteja muito fraco e o partido, sem perspectivas lá na frente, resolva garantir agora seu quinhão.
De que forma o PT poderia rifar um candidato que está em primeiro lugar, cuja situação só melhora à medida que o eleitor vai percebendo que não tem alternativa e que vence qualquer um no segundo turno?
A posição mais confortável no pano de fundo eleitoral é mesmo do PT. Lula se diz candidato, está em primeiro lugar nas pesquisas, ganha de qualquer um no segundo turno, e não precisa fazer nada para isso, basta dizer que mantém a candidatura apesar da condenação e da prisão. Portanto, as pressões de governadores petistas, que querem fazer alianças nos Estados, e dos candidatos a presidente, que querem logo saber quanto terão do espólio de Lula, não encontrarão correspondência no PT, que não vê vantagem na desistência agora.
Há realmente certo nervosismo dos candidatos e staff de campanha com a demora de Lula para renunciar à sua candidatura. Ao contrário dessa expectativa, o ex-presidente só reafirma que é candidato, escreve carta compromisso, manda recado e, mesmo dividido o partido, boa parte do PT segue o desejo do caudilho.
A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, avisou explicitamente, em entrevista recente, que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não pode, por iniciativa própria, vetar a candidatura do ex-presidente. É preciso uma provocação de fora.
Por outro lado, a interpretação do STF é que, pela lei, pessoas condenadas em segunda instância, como Lula, não podem disputar eleições.
A interpretação judicial, porém, tem mostrado que o tribunal permite, em alguns casos, que a pessoa, mesmo condenada em segundo grau, concorra. É essa a visão de alguns advogados que atuam junto à justiça eleitoral. Mas temendo a controvérsia, Cármen espera que o assunto Lula se esgote na Justiça Eleitoral tendo em vista que, a seu ver, a lei é clara.
A luta que se vislumbra parece longa. O desejo de Lula, executado pelo PT, é deixar o anúncio de desistência, caso a Justiça não reconheça sua candidatura, para o fim de agosto ou início de setembro.
O que sustenta essa estratégia, e a torna quase imperativa, é que uma renúncia, agora, não teria a metade da comoção que tem condições de provocar se ocorrer mais perto da eleição.
Se desistisse em momento mais propício do que agora, Lula teria condições, inclusive, de transferir o apoio a seu nome para quem apontar como candidato em seu lugar. Esse estaria no segundo turno, imagina-se. E dada a aversão da maioria do eleitorado pelos candidatos já lançados, teria grande chance de ganhar.
Deixando tudo, até as alianças, para o fim de agosto, o PT estaria na sua zona de conforto.
Também do ponto de vista jurídico a estratégia foi avaliada como correta. O fato de ter uma condenação, não significa, segundo interpretações jurídicas do partido, que ele esteja impedido de concorrer. Quem vai decidir é a Justiça Eleitoral.
Se provocada agora, a Justiça Eleitoral, não tendo ainda o fato concreto do pedido de registro, vai vetar em tese? A hipótese da decisão em tese é considerada impossível por advogados.
Há, também, outra solução embutida nessa estratégia, embora não consiga elevadas apostas. Trata-se dos precedentes que permitiriam a candidatura de Lula mesmo condenado. Nessa avaliação, são questões diferentes: uma coisa é o cumprimento da pena antecipadamente, outra é a decisão da Lei da Ficha Limpa, que diz que alguém na situação de Lula não pode se candidatar
Quem tem que decidir é a Justiça Eleitoral, com base nos fatos concretos. O PT está reunindo os precedentes de pessoas que estavam condenadas e concorreram.
Apresenta-se um recurso, consegue-se medida cautelar, efeito suspensivo e finalmente o registro. São dois processos distintos: um é criminal - condenado em segundo grau, começa a cumprir pena. Outro é definir a situação legal de um candidato condenado que pretenda concorrer.
Essa diferenciação anima o PT a não abandonar a hipótese de ser Lula mesmo o candidato, mais uma razão para manter a candidatura. Com o efeito suspensivo conseguido, o candidato se registra. Depois, tendo vencido, se for derrubado na Justiça cassa-se o mandato.
Mas aí a guerra já estará armada porque o candidato terá recebido mais de 50 milhões de votos. A manutenção da candidatura via Justiça leva em consideração que o que impede o registro não é a prisão. É a condenação em segundo grau. Mais uma vez, coisas distintas.
E os prazos legais favorecem o combinado. Há prazo para convenção, para registro, para recurso, para substituição, tudo depois da Copa, com muita concentração no fim de agosto. E por mais que a Justiça Eleitoral acelere sua decisão, ela ocorrerá a essa época, fim de agosto ou início de setembro. A pressão popular nas redes e a dos adversários deve apressar o TSE. Ontem mesmo o ministro Admar Gonzaga (TSE), a propósito da declaração de Cármen Lúcia, disse que um só ministro pode despachar o veto ao registro da candidatura, em decisão monocrática, se a transgressão às exigências legais estiver bem clara no processo.
Discute-se entre petistas que, se Lula finalmente não for candidato, o melhor para seus adversários e aliados seria deixar ele continuar candidato até agosto. Chegaria lá mantendo acesa a chama do apoio popular. Até para transferir votos ao substituto a renúncia em agosto é mais adequada. Dizer agora ao eleitor que sem Lula pode votar em Fernando Haddad, é um ativo que se dissolve no horizonte e terá menos força do que se o disser faltando 35 dias para a abertura das urnas.
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