- Valor Econômico
Incerteza política pressiona cotação da moeda americana
O Banco Central não está economizando munição para conter a forte alta da cotação do dólar. Já vendeu mais de US$ 42 bilhões em contratos de swaps cambiais, que fornecem proteção ao mercado contra a desvalorização cambial. Ontem, ampliou o seu leque de atuação, oferecendo US$ 3 bilhões em linhas de empréstimo em dólares, dos quais apenas US$ 500 milhões foram absorvidos pelo mercado. Apesar de todo o esforço, a moeda americana registra uma alta de cerca de 15% ante o real desde abril.
Com US$ 382 bilhões em reservas internacionais, o BC parece muito forte para segurar a alta do dólar, mas seu poder tem limites. As intervenções podem acalmar o mercado nos dias de pânico e quebrar movimentos especulativos contra a moeda nacional. Em um regime de câmbio flutuante, porém, no fim a taxa de câmbio será determinada pelos fundamentos econômicos.
Quando o dólar sobe puxado por fatores internacionais, como a perspectiva de alta de juros nos Estados Unidos, não há muito o que o BC possa fazer. Se a desvalorização é causada pela deterioração da percepção dos mercados sobre o Brasil, o BC pode dar um alívio com a venda de dólares, mas ele só será eficaz se for seguido de iniciativas do governo e do Congresso Nacional que fortaleçam os fundamentos da economia brasileira.
O economista Livio Ribeiro, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), fez alguns cálculos que procuraram identificar e separar as forças que estão mexendo com a cotação do dólar nos últimos meses, entre fatores domésticos, fatores internacionais e a diferença entre os juros internos do país e os juros externos.
De forma geral, fatores internacionais, ligados sobretudo à perspectiva de alta dos juros nos Estados Unidos, tiveram um grande peso para a alta do dólar. A decisão do Banco Central de manter os juros básicos em 6,5% ao ano em maio ajudou a conter esse movimento de desvalorização do real. As taxas de mercado subiram, ampliando a diferença a entre os juros internos e externos e, consequentemente, a remuneração aos capitais estrangeiros investidos no Brasil. Mas, em alguns períodos, foram fatores ligados à própria economia brasileira que explicaram a alta do dólar.
Ao contrário do que à primeira vista pode parecer, a paralisação dos caminhoneiros, em si, não foi uma força determinante na alta do dólar. No período em que o país parou, entre os dias 22 e 30 de maio, a cotação do dólar subiu 2,5%, mas o único motor dessa alta foi a piora nas condições internacionais. Na semana seguinte, porém, o real sofre uma desvalorização de quase 5%, e o dólar chega perto de R$ 4,00. Nesse período, o Brasil se descolou dos países emergentes semelhantes, e fatores domésticos explicam toda a desvalorização cambial.
Os estudos de Ribeiro não permitem identificar os fatores domésticos responsáveis pela alta do dólar entre os dias 30 de maio e 7 de junho, mas foi nesse período que o governo deu a sua resposta à crise dos caminhoneiros, incluindo os subsídios ao diesel e o tabelamento dos fretes. Um dos desdobramentos da crise foi a demissão do presidente da Petrobras, Pedro Parente.
Caiu a ficha do mercado financeiro de que, em uma economia que ainda que sofre os efeitos da recessão, poderá ser mais difícil aprovar medidas de austeridade fiscal, mesmo que seja eleito um governo que defenda uma agenda reformista. Também preocupa a travessia do governo Temer até o fim do ano, incluindo o seu apoio à equipe econômica.
Por enquanto, o mercado enxerga apenas um risco de o populismo sair dominante. A aposta central é de que qualquer presidente da República eleito neste ano terá que enfrentar assuntos como a reforma da Previdência, sob pena de não conseguir governar. A experiência das últimas décadas mostra que, quando o país se vê diante do abismo, faz o que é necessário. Os dois últimos ajustes fiscais expressivos foram feitos após crises econômicas, na segunda eleição de FHC e no primeiro mandato de Lula.
O lado trágico disso é que seria preciso as coisas piorarem para o país fazer o que é necessário. O mercado financeiro coloca esse e outros riscos na taxa de câmbio e nos juros, que tendem a continuar pressionados. Essa incerteza será superada apenas com as eleições, mas governo e Congresso poderiam atenuá-la com a implementação de alguma medida que sinalize que ao fim do processo eleitoral a racionalidade econômica poderá prevalecer sobre o populismo.
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Os bancos centrais estão deixando um pouco de lado o "forward guidance". Isso vale para os Estados Unidos e, aparentemente, também para o Brasil. Há alguns dias, o presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell, disse que a sinalização mais firme sobre os passos futuros de política monetária poderia dar aos mercados a falsa impressão de que os riscos são pequenos. No Brasil, o Banco Central abandonou, na semana passada, a indicação de manutenção dos juros em 6,5% ao ano por algumas reuniões. As razões, exatamente, serão conhecidas hoje, com a divulgação da ata do seu Comitê de Política Monetária (Copom). Muito provavelmente a autoridade monetária também quis fazer os mercados medirem de forma adequada os riscos no horizonte.
Mesmo sem uma indicação mais firme sobre a trajetória dos juros, os BCs não deixaram os mercados totalmente órfãos. No Fed, essa tarefa é desempenhada pelos chamados "dot plots", que incluem projeções dos membros do seu comitê sobre os juros. No Brasil, esse balizamento é feito pelas projeções de inflação.
A julgar pelos números apresentados no comunicado do BC da semana passada, são boas as perspectivas para os juros ficarem estacionados em 6,5% ao por um bom tempo - isto é, se os riscos destacados pelo Copom para o cenário econômico não virarem realidade. Chama a atenção a queda da projeção de inflação para 2019 no cenário de mercado, de 3,9% para 3,7%, entre maio e junho, abaixo da meta de 4,25%, considerando uma alta de juros a 8% ao ano no ano que vem. Sem a alta de juros, a inflação ficaria em 4,1%.
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