- O Globo
Projetos de Ciro na economia têm a marca clara do intervencionismo mas já foi abandonada a ideia polêmica de estabelecer um teto para a dívida
A campanha do candidato Ciro Gomes (PDT) tem propostas confusas para a Previdência e uma ideia criativa, mas não suficientemente explicada, para o endividamento das famílias. Seus projetos na economia em geral têm a marca clara do pensamento intervencionista, mas já foi abandonada a proposta mais polêmica que é a de estabelecer um teto para o pagamento da dívida. Isso foi citado várias vezes no meio de críticas ao custo da dívida pública. Poderia criar uma crise de confiança, mas não é mais defendido.
A segunda entrevista na Globonews com os assessores dos candidatos foi com o economista Mauro Benevides Filho, doutor em economia pela Universidade de Vanderbilt, com uma carreira mista de político —foi deputado estadual — e experiência em administração estadual como secretário.
O candidato Ciro Gomes tem prometido tirar todo mundo do SPC. Todo mundo é muita gente: são 63 milhões de pessoas com o cadastro negativo por inadimplência. Não são caloteiros, foram atingidos pelos erros das políticas dos governos. Houve um incentivo ao crédito excessivo nos governos do PT e em seguida a recessão que começou em 2014, produzindo a pior onda de desemprego. A campanha de Ciro propõe que se faça uma grande renegociação de dívida, intermediada pelo governo e usando os bancos públicos.
O risco nessa coordenação é o peso ficar com os bancos públicos, livrando os privados e empresas credoras do ônus de carregara inadimplência. Mauro Benevides Filho afirma que os credores deverão conceder um desconto na dívida, e ela será inteiramente paga com empréstimos tomados pelos devedores junto aos bancos públicos. Como financiar isso? Segundo ele, há um funding —ele não explicou exatamente qual e de onde vem — de R$ 60 bilhões nos bancos públicos —Banco do Brasil, Caixa, Basa, Banco do Nordeste, Banrisul — para sustentar essa operação. A ideia é usar as instituições públicas para emprestar aos devedores que pagariam com descontos, que seriam concedidos pelos credores, bancos e empresas. Quando os bancos públicos fazem isso na dívida rural, por exemplo, a União tem que cobrir prejuízos. Instituições financeiras estatais estão neste momento com dificuldade de cumprir regras de Basileia, portanto, com limites de crédito. Há vários problemas práticos nessa ideia que ainda precisa amadurecer, do contrário virará mais um mico jogado para os bancos públicos.
Na Previdência, são várias ideias, algumas confusas e com custos ainda não dimensionados. A proposta é separar seguridade de Previdência. Depois, reduzir o benefício-teto do INSS de R$ 5.600 para algo que Benevides disse entre R$ 3.900 e R$ 4.200. E criar um outro sistema previdenciário de capitalização, no qual as contas sejam individuais, e não como agora, no sistema de repartição, em que os trabalhadores da ativa contribuem para pagar as aposentadorias dos inativos. Como financiar a mudança? Eis a questão. Os trabalhadores deixariam de contribuir para a Previdência para depositar na conta própria. O déficit cresceria. Benevides disse que a equipe dele calculou quanto custaria essa mudança para funcionários públicos, baixando os dados de 840 mil servidores. Seria, segundo ele, 0,19% do PIB. “Uma greve dos caminhoneiros”, disse. Há outros cálculos. Só para a transição do INSS o custo pode ser de 10% do PIB.
Benevides tem falado em criar um imposto sobre grandes transações financeiras, mas não escreveu isso no programa. É uma nova CPMF. Disse que vai criar o imposto sobre lucros e dividendos e arrecadar R$ 51 bilhões e ao mesmo tempo reduzir as taxas sobre as empresas em R$ 9 bilhões. Ou seja, aumento da carga tributária. Ele explica que é para “o andar de cima”. Subiriam fortemente as alíquotas do imposto sobre herança.
A campanha tinha a ideia de estabelecer um teto para o pagamento dos juros da dívida, e isso foi entendido como ameaça de um calote. A proposta foi reformatada para um limite de endividamento, como tem os estados e municípios, e para daqui a 15 anos. Eliminou-se assim o ponto mais explosivo defendido nas entrevistas.
O intervencionismo está em vários pontos: dos preços da Petrobras à volta ao “velho BNDES”, ao rompimento de contratos na área de petróleo e gás. Sobre câmbio, não dá para entender exatamente o que ele pretende, mas quer “câmbio competitivo para a indústria nacional”, ou seja, dólar alto. Isso, a confusa campanha já está conseguindo.
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